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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O vício da regulamentação

Segunda, 26 de outubro de 2009
 Por Ivan de Carvalho
Tramitam atualmente no Congresso mais de 200 projetos criando regras para o exercício de profissões ou atividades com as de DJ, modelo, astrólogo, repentista, vaqueiro, acupunturista, musicoterapeuta, teólogo e outras. A informação foi divulgada ontem no site Política Livre. Embora isso não seja uma novidade absoluta – no Brasil, há sempre uma porção de gente querendo regulamentar uma porção de coisas e de pessoas também –, fiquei curioso.
       A curiosidade esteve mais por conta de que a notícia dá conta ainda de que “o Congresso iniciou uma ofensiva” para efetuar essa regulamentação, que pode, na opinião do governo e do Judiciário, “excluir ainda mais do mercado quem não tem formação”, assinalando que “a discussão sobre o assunto virou febre e tem tomado grande parte do debate no Congresso. Tanto que já existe “projeto no sentido contrário, com o objetivo de evitar novas regulamentações”.
       Das várias profissões ou atividades-alvo de regulamentações em potencial, algumas até já reconhecidas pelo Ministério do Trabalho, admito, entre as já citadas acima, que a de acupunturista tenha uma regulamentação, mas rezo para que não inclua, por exemplo, a exigência de graduação numa faculdade de Medicina do tipo tradicional.
O conhecimento que um acupunturista precisa não é o de um médico alopata ou mesmo homeopata. Ele não tem esse conhecimento. E o médico alopata não entende coisa nenhuma dos sete chakras (centros de energia) principais do ser humano, dos chakras médios e dos mini-chakras, dos meridianos de energia e de suas conexões com os pontos de intervenção usados pela acupuntura, dos desequilíbrios e reequilíbrios do corpo energético – matriz do corpo carnal – e de sua influência na gênese e no tratamento das doenças, bem como no alívio de seus sintomas. Para a medicina acadêmica ocidental, isso é grego.
Um médico convencional ocidental, alopata, pode fazer acupuntura se fizer o estudo e o treinamento específicos, mas o acupunturista pode ser um técnico na acupuntura sem cursar uma faculdade de medicina. Assim como um fitoterapeuta não precisa obrigatoriamente ser médico graduado, ainda que, se o for, nada terá a perder, mas a ganhar com isto, exceto, talvez, no item da sensibilidade para o diagnóstico e o tratamento, pois tenderá a substituir a sensibilidade pela parafernália de exames da medicina alopata, cada vez mais sofisticados e, reconheçamos, eficientes.
Mas como regulamentar as profissões ou atividades, por exemplo, de astrólogo, repentista (e poeta?), vaqueiro, pastor, pescador de almas, como Simão Pedro, de alquimista (quando estaria ele autorizado a produzir a Pedra Filosofal?) e, meu Deus, de teólogo? Como um Estado laico e no qual o pensar é livre vai regulamentar a profissão ou atividade de teólogo? Vai estabelecer do que o teólogo precisa e como deve explicar, se puder, o que é Deus? Doideira, cara, doideira.

Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda-feira.
Ivan de Carvalho
é jornalista baiano