Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Ó paí, ó!

Segunda, 23 de novembro de 2009 
Por Ivan de Carvalho 

A semana começou mal. Ontem o PT fez o seu Processo de Eleições Diretas. Mas, ao meu ver, as eleições não foram o fato mais importante do PED e sim uma declaração da ministra Dilma Rousseff, candidata do PT à sucessão de Lula.

Inspirada não sei por qual espírito de porco, a candidata, ao votar, defendeu a volta à política dos petistas envolvidos no Mensalão, em assuntos de corrupção o maior escândalo da história do Brasil, pois, não pelo resultado, mas pelo conteúdo, superou em muito o caso Collor. Ao votar no PED, Dilma Rousseff afirmou que a volta de petistas envolvidos na compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional “faz parte do processo democrático”.

Na opinião dela, expressa numa linguagem arrevesada, ao trazer de volta seus mensaleiros, “o PT está procedendo de forma correta. Você não pode adotar uma prática que ocorreu muito no Brasil ao longo dos últimos anos que era, ao contrário da conquista democrática do Ocidente, que havia que provar que uma pessoa era culpada e não a pessoa provar que era inocente”. E completou que, como não houve nenhuma condenação em definitivo (ainda) é “natural” que essas pessoas “exerçam seus direitos políticos”, pois “ninguém pode ser cassado a priori”. 
Ora, se ela fosse candidata a presidente do Supremo Tribunal Federal, o discurso dela estaria juridicamente correto. Mas Dilma é candidata a presidente da República. Sua defesa dos envolvidos com o Mensalão é politicamente incorreta. Aliás, inaceitável. 
A semana iniciada ontem começou mal e piora hoje. Chega ao Brasil, em visita oficial de um dia, mas com direito a todos os rapapés oficiais, o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que nega o Holocausto – a matança de seis milhões de judeus pelo nazismo –, afirma que foi apenas uma propaganda mentirosa para “justificar a criação do Estado de Israel” e proclama que o Irã quer “varrer Israel do mapa”. Escrevi aqui no sábado que nunca mais me ufanarei do meu país se ele não sair do Brasil “com uma quente e duas fervendo”. 
Estou pessimista. Ahmadinejad terá um encontro com Lula, no qual haverá muito amor. Rimando o amor dos dois com a dor dos seis milhões que morreram no Holocausto e a dos milhões de sobreviventes, fugitivos e parentes dos mortos. Irá ao Congresso, mas ali visitará apenas os presidentes da Câmara e Senado. Não enfrentará o plenário. Vai fazer uma palestra para platéia de universitários selecionados. Ontem, durante duas horas, 2 mil pessoas, incluindo as comunidades judaica e árabe, grupos afro-religiosos, grupos gays – cruelmente perseguidos no Irã – e civis desengajados, com bandeiras, cartazes, apitos, panfletos, camisas e balões com inscrições, protestaram contra a visita. Também foram convocadas manifestações em frente ao Itamaraty e em outras cidades. 
Bem, aí está a quente. Faltam as duas fervendo – manifestações de instituições importantes e da oposição, pelo menos. E não foram anunciadas. Completando com a defesa dos mensaleiros por Dilma Rousseff, creio mesmo que nunca mais me ufanarei do meu país.

Este artigo foi postado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda-feira.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano