Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O horário do debate

Sexta, 6 de agosto de 2010 
Por Ivan de Carvalho

    O assunto político de hoje é naturalmente o debate de ontem, na Rede Bandeirantes, entre os candidatos a presidente José Serra, do PSDB, Dilma Rousseff, do PT, Marina Silva, do PV e Plínio de Arruda Sampaio, do PSOL.
    Infelizmente, o horário de início do debate, 22 horas de ontem, impede que neste artigo seja feita qualquer avaliação do que aconteceu, de vez que estas linhas têm de estar editadas e paginadas antes do debate começar, por exigência da produção industrial do jornal. Assim, se algum candidato citado sentiu-se mal e não compareceu, perdoem-me, mas ignorar o fato nestas linhas não terá sido culpa minha.
    Isto puxa uma questão que se apresenta em todos os debates pela televisão, sejam eles entre candidatos a presidente, sejam entre candidatos a governador, sejam entre candidatos a prefeito de capitais – pois candidatos a outros mandatos eletivos, mesmo candidatos ao Senado, cujas eleições são também de caráter majoritário, não são contemplados com essa atenção por emissoras de TV, muito menos pelas redes nacionais de televisão.
    A eleição de um presidente da República é assunto tão importante e um debate em rede nacional de televisão é instrumento tão relevante para orientar a escolha do eleitor que não existe qualquer justificativa válida para que os debates sejam marcados para as 22 horas, às vezes até para mais tarde, tipo 22:30 horas, quando deveriam realizar-se no horário mais nobre.
    Mas é possível que candidatos (ou candidatas) aos quais a perspectiva de debater com os concorrentes não agrada pressionem para que o horário seja tardio, de modo a reduzir o número de telespectadores (muito gente tem que acordar cedo no dia seguinte para trabalhar e por isto não vê o debate, ou vê apenas parte dele).
    Claro que ao marcar o debate para as 22 horas, a Band, que se esforçou para abrir espaço a um confronto real, não teve que considerar apenas o cipoal de regras imposto pelos representantes de alguns candidatos para reduzirem ao mínimo possível os riscos que os seus representados correriam com um debate mais aberto, menos engessado, seja no horário, seja no formato, seja no conteúdo e no tempo dedicado a cada tema.
Esses representantes, geralmente marqueteiros, preferem mostrar o produto a ser vendido ao eleitorado nos programas de propaganda eleitoral gratuita, nos quais não há confronto nem debate diretos e cada um diz o que quiser, sem risco nenhum de ser imediatamente questionado, tornando-se assim muito mais fácil a propaganda eleitoral enganosa, alvo do criativo, mas improvável projeto apresentado na Câmara pelo deputado baiano, candidato a senador e vice-presidente nacional do Democratas, José Carlos Aleluia.
    Voltando ao horário dos debates na TV. Há considerações além do interesse de candidatos que preferem se esconder nos debates e se mostrar nos monólogos para a fixação do horário. A Band deve ter se preocupado, por exemplo, em por no ar o debate em horário em que o eleitor já esteja liberto da escravidão das novelas e algumas outras coisas lamentáveis tão apreciadas por um público-eleitorado massificado, já que mantido como alvo fácil à massificação, a absorver mensagens ao invés de pensar, por um sistema educacional público de péssima qualidade e uma mídia eletrônica que se compraz, quase sempre, em oferecer abobrinhas ao público. O problema é que quando se liberta dessas coisas e ficaria disponível para ver os debates, o eleitor já é prisioneiro do sono.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.