Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A TV estatal e seu uso

Terça, 20 de setembro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Com base em reportagem publicada ontem no jornal Folha de S. Paulo, o PSDB decidiu pedir que o Ministério Público Eleitoral investigue o uso de funcionários públicos e equipamentos da TV oficial do governo para filmar comícios da candidata Dilma Rousseff (PT) que tenham a participação de Luiz Inácio Lula da Silva. Advogados desse parido de oposição devem entregar hoje à Procuradoria Geral da República representação com o pedido de investigações.
    O advogado Eduardo Alckmin, que trabalha para o PSDB, evitou assumir integralmente a denúncia do jornal. “Aparentemente, há indícios de que isso [uso da máquina pública] esteja acontecendo. Mas é preciso apresentar provas, por isso o Ministério Público Eleitoral tem melhores meios para investigar que os partidos”, disse ele.
    Segundo denuncia o jornal, há no governo ordem para que cinegrafistas e auxiliares da TV NBR – canal da Empresa Brasil de Comunicação, EBC, que noticia atos e políticas do governo – gravem todos os discursos do presidente Lula nos eventos da campanha eleitoral.
Isto, perante a legislação eleitoral brasileira, caracteriza uso ilegal da máquina pública na campanha eleitoral, mesmo tratando-se da gravação de discursos do presidente da República. É que Lula não está comparecendo a esses eventos eleitorais como presidente da República, mas como um político partidário da candidatura de Dilma Rousseff à sua sucessão. Ou então como cabo eleitoral de outros candidatos a governador e senador, nas unidades federadas.
Segundo o jornal – e aí estará um aspecto grave, se confirmado, pois significará tentativa de dissimulação do crime eleitoral, algo assim como a ocultação do cadáver da vítima de homicídio. A direção da TV estatal determinou que esses servidores, antes de iniciarem as filmagens, tenham o cuidado de retirar os sinais de identificação da emissora estatal – a camiseta ou colete, a canopla (peça que tem a logomarca) do microfone e o adesivo colado na câmera. Tudo isto, claro, porque a lei proíbe o uso eleitoral da máquina pública.
A determinação da emissora, ressalta o jornal, fere também o estatuto da NBR. “Cabe à emissora divulgar somente os atos institucionais do Executivo, o que inclui os ministérios, com prioridade para a Presidência da República”, explica a Folha.
    Bem, a propósito de que fiz até aqui a reprodução de duas notícias, uma, a denúncia do jornal, a outra, a decisão do PSDB de pedir investigação do Ministério Público, notícias que já foram objeto de divulgação? Apenas para situar melhor uma reflexão.
    Quando o governo Lula decidiu criar a TV estatal NBR, houve uma polêmica, com uns afirmando que o governo pretendia criar um instrumento de propaganda, principalmente política, a seu serviço. A TV estatal seria desnecessária, pois a mídia eletrônica já divulga normalmente o noticiário do Executivo quando é do interesse do público a informação.
    Tal argumentação foi contestada pelo governismo, que criou a estatal EBC e a TV NBR, garantindo que não seria usada politicamente. Agora, surge a denúncia detalhada de que não só está sendo usada politicamente, como eleitoralmente. E de modo ilegal, constituindo crime eleitoral. Se comprovada a denúncia, qual o crédito que ainda se poderá dar a garantias do governo? Aliás, de um governo que tão mal tem falado da mídia...
- - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.