Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 17 de maio de 2011

Bancarrota ou democracia?

Terça, 17 de maio de 2011
Do site resistir.info

Grécia, Irlanda e Portugal

Bancarrota ou democracia?


por Nick Dearden [*]
Mesa da confer�ncia de Atenas. Não chega a ser surpresa que as centenas de pessoas reunidas na conferência de que acabo de retornar concordassem em que o pacote de "salvamento" da Grécia aprovado há 12 meses fracassou em proporcionar uma solução para o problema de dívida do país.

Organizado por um espectro da sociedade civil grega de amplitude sem precedentes, o evento internacional lançou o apelo para que a Grécia (e agora a Irlanda) abra as suas dívidas aos povos daqueles países para uma discussão pública de quão justas e legítimas realmente são elas. Veteranos do Brasil, Peru, Filipinas, Marrocos e Argentina disseram aos activistas gregos para "permanecerem firmes" e não se submeterem a 30 anos de recessão devastadora por imposição de instituições como o Fundo Monetário Internacional.

O florescente movimento europeu de oposição a reembolsos de dívida e à austeridade está a fazer ligações concretas com grupos do Sul global e apresenta uma confiança e uma racionalidade que está a um milhão de quilómetros dos governos da Grécia e da Irlanda, os quais têm seguido políticas punitivas das pessoas comuns a fim de reembolsar banqueiros imprudentes.

Simplesmente não é possível que as políticas infligidas à Grécia, Irlanda e agora Portugal reduzam o fardo da dívida daqueles países – acontecerá exactamente o oposto, como se viu desde a Zâmbia na década de 1980 até a Argentina no princípio da última década. Políticas semelhantes àquelas que estão a ser infligidas sobre a Europa viram o rácio dívida-PIB da Zâmbia duplicar na década de 80 quando a economia se contraiu. A Argentina incumpriu as suas dívidas maciças em 2011, após uma recessão de três provocada pelas políticas do FMI. Tal como à Irlanda hoje, disseram à Argentina que ela havia ido longe demais, apesar de a dívida ter sido incorrida por um desastroso conjunto de privatizações e de um atrelamento da divisa impingido ao país pelo mesmo FMI. Trata-se de uma economia que começou a recuperar-se um mês após o incumprimento.

Então, por que é que estas políticas ainda estão a ser prosseguidas? Quase todo comentador soube desde o primeiro dia que os pacotes de "salvamento" não tornariam sustentáveis as dívidas da Grécia ou da Irlanda. Mas delegados na conferência deste fim-de-semana foram claros – que isto não é o problema em causa. O problema em causa é recuperar tanto dinheiro dos investidores quanto possível, por mais responsáveis que aqueles investidores fossem pela crise, e transferir o passivo para a sociedade.

Mesmo que a Grécia e a Irlanda precisem salvamento adicional em dinheiro ou reestruturação através de alguma espécie de títulos – as mesmas medidas impostas à América Latina na década de 1980, as quais criaram montanhas de dívidas tão grandes que aqueles países ainda estão a sofrer as consequências – os investidores privados terão de ser pagos. O argumento entre as populações da Alemanha e da Grécia torna-se quem pagará a maior parte da conta, criando um perigoso nacionalismo já muito evidente.