Quarta, 7 de dezembro de
2011
Por Ivan de Carvalho
Embora o ex-presidente Lula haja proclamado,
referindo-se ao SUS, que o Brasil tem “um sistema quase perfeito” de saúde
pública, ele e nós todos devemos ficar felizes por ele poder tratar seu grave
problema de saúde em um dos melhores hospitais do sistema privado de saúde do
país, graças – segundo explicou à imprensa um amigo – aos fatos de ele ter um
plano de saúde e de ter dinheiro.
Graças a esses dois fatores e a Deus, são muito
grandes as chances – conforme nos asseguram os prognósticos médicos – de termos
em breve um ex-presidente sadio e estimado pela grande maioria da população
fazendo campanha eleitoral para seu partido, o PT.
Mas se ele não fosse ex-presidente, não tivesse
plano de saúde e nem dinheiro, seria obrigado a tratar-se pelo quase perfeito
SUS e, neste caso, perderia um tempo precioso para marcar a primeira consulta,
ficaria na fila por não menos de um mês – mas talvez por três ou quatro meses –
esperando para começar a quimioterapia ou talvez lhe passassem logo o bisturi
pela laringe, ao que seria acrescentada a quimioterapia e a radioterapia,
prejudicando-lhe drasticamente a voz.
Mas se mencionei Lula foi só para ressaltar seu
conceito sobre a quase perfeição do Sistema Único de Saúde, conceito que deve
estar unicamente na cabeça dele. Sobre o setor de saúde, só de passagem,
aproveito para lembrar a informação oficial de que 48 municípios brasileiros,
habitados por 5 milhões de pessoas, estão plenamente aptos a sofrer uma
epidemia de dengue no verão que está para começar. Três são capitais – Rio
Branco, Porto Velho e Cuiabá. Isso não quer dizer que em Salvador o aedes aegypti vai dar moleza. Ele, não.
E no Rio de Janeiro há certo pânico entre as autoridades estaduais e
municipais, pois acham que o bicho pode pegar pra valer.
Mas o SUS está uma beleza. O Ministério da Saúde
deve anunciar até o fim do mês a inclusão de trombolíticos (usados na rápida
dissolução de coágulos sanguíneos) nos tratamentos do SUS. O medicamento
envolve riscos sérios, como o de causar ou agravar arritmias ou provocar
hemorragias cerebrais. De qualquer forma, pode ser essencial. Usado, quando
indicado, nas primeiras horas (preferência nas três primeiras, no máximo nas
seis) de um infarto agudo do miocárdio, por exemplo (há outras aplicações,
sobretudo embolia pulmonar com repercussão hemodinâmica), a expectativa é de
que o índice de mortalidade seja reduzido dos 12 por cento hoje registrados no
sistema público para cinco por cento, média dos melhores serviços particulares.
Explicando melhor: o SUS estava (ainda está)
deixando sete por cento dos pacientes infartados morrerem (podendo evitar isso)
para fazer economia de recursos, com tanto dinheiro público entrando pelos
ralos das ONGs e das obras públicas superfaturadas e com festas caríssimas como
a Copa do Mundo e as Olimpíadas.
Mas é só isso? Nem pensar. Há, ainda na área
cardiológica, a vergonhosa questão do stent,uma
prótese de aço inoxidável colocada dentro de alguma artéria cardíaca para
impedir obstrução. Existe o stent
nacional, único que o SUS paga e é chamado também de “convencional”. E há o
farmacológico, que desprende gradualmente uma substância que reduz o risco de
reestenose, isto é, de entupimento no local em que foi posto o stent para eliminar entupimento
anterior.
Não sei os preços atuais, mas em 2009 o stent
convencional (e nacional) custava R$ 2 mil a R$ 3 mil. O farmacológico,
importado, custava R$ 15 mil a R$ 18 mil. Para o governo, essa diferença pode
muito bem ser o preço de uma vida. Com o stent
farmacológico, o risco de reentupir cai de 15 para cinco por cento. Cai para um
terço. O governo deve achar isso irrelevante. O governo não se trata no SUS.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.