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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Restos mortais de Miguel Nuet, morto pela ditadura, serão entregues dia 12 à família, em SP

Sexta, 9 de dezembro de 2011
Do MPF

Restos mortais de Nuet foram exumados e identificados a pedido do MPF/SP 

Os restos mortais do cidadão hispano-venezuelano Miguel Sabat Nuet, morto pela ditadura civil-militar brasileira, em 30 de outubro de 1973, serão entregues a seus três filhos, que vivem na Venezuela. Eles receberão as cinzas do pai em uma solenidade em memória de Nuet, que será realizada no próximo dia 12 de dezembro, às 16h, no Auditório XI de Agosto da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo São Francisco, nº 95, em São Paulo. A cerimônia é organizada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.

Os restos mortais de Nuet foram exumados a pedido da procuradora da República Eugênia Augusta Gonzaga, do Ministério Público Federal em São Paulo, em abril de 2008. Eles estavam enterrados no terreno 485, quadra 7, do cemitério Dom Bosco, em Perus, zona norte de São Paulo.
 
Os restos mortais estavam no Instituto Médico Legal de São Paulo até a última quarta-feira, 7 de dezembro, data em que foram cremados a pedido da família. A cremação foi supervisionada pelo MPF e as cinzas já estão numa urna, sob a custódia da Polícia Federal, pronta para a entrega aos familiares de Nuet.
 
Em julho de 2008, um fêmur e dentes foram extraídos da ossada para exame por um laboratório de engenharia molecular, de São Paulo. Em agosto do mesmo ano, o resultado do exame comprovou que a ossada encontrada no cemitério clandestino de Perus, em São Paulo, é de Nuet.
 
A amostra forense foi a extraída a partir do fêmur e a identificação positiva aconteceu a partir da comparação do DNA do osso com o resultado dos exames de DNA do sangue de um irmão, de uma filha e de um filho de Nuet, coletados em Barcelona e Caracas, respectivamente, para o Banco de DNA da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR).
 
Nuet foi preso por uma equipe do Departamento de Operações Internas (DOI) em 9 de outubro de 1973 e apareceu morto três semanas depois em sua cela. Segundo a polícia informou na época, Nuet teria se suicidado.
 
O cidadão hispano-venezuelano (ele tinha dupla nacionalidade) morreu aos 50 anos. Nuet era um vendedor de veículos que morava na Venezuela e não teria nenhuma ligação com a militância política contra a ditadura. Segundo apurado, ele deve ter sido preso por engano no Brasil, como suspeito de atividades "terroristas”, pois na sua ficha constava um “T” vermelho, que significa “terrorista”, mas, apesar de ter morrido nos porões da ditadura, nunca foi provado seu envolvimento com nenhuma organização da luta armada.
 
Após a identificação de Nuet, o procedimento administrativo sobre sua morte foi então reaberto perante a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos da Secretaria de Direitos Humanos, sendo que o espanhol foi reconhecido como mais uma vítima da ditadura brasileira.
 
Com relação a sua morte, foi apurado que uma testemunha, que esteve presa no Dops à época, afirma que se recorda de ter ouvido gritos de “ajuda” e “socorro” em espanhol vindos de uma cela no Dops, em 1973. O lugar de onde vinham tais gritos era a cela no Dops conhecida como “fundão” ou “forninho”. Ela informa que esses gritos “duravam o dia todo”, em altos brados e invocações do tipo “Maria, socorro”, “Maria del Socorro”, “Santa Maria”...
 
Documentos obtidos junto ao Arquivo Público do Estado de São Paulo permitem a conclusão de que ele foi detido ilegalmente pelos aparatos oficiais, os quais reconheceram inclusive que ele “nada tinha de subversivo”. Os responsáveis por seu sequestro e, talvez, por sua morte, foram autoridades públicas agindo sob ordens diretas de representantes do Exército brasileiro. Tais dados, na avaliação da procuradora Eugênia e da Comissão de Mortos e Desaparecidos, permitem concluir que ele foi vítima de sequestro, tortura e homicídio.
 
No convite encaminhado às autoridades e familiares de mortos e desaparecidos, a ministra Maria do Rosário afirma que “a cerimônia de entrega dos restos mortais de Sabat Nuet aos seus descendentes não apenas constitui mais um passo do Estado brasileiro no sentido de resgatar o direito dessa família de conhecer a verdade sobre o caso e de sepultar um ente querido, mas também reafirma o inarredável compromisso de oferecer uma narrativa do processo histórico no período de exceção sob um olhar democrático, especialmente no quadro da recente sanção das leis que criam e regulam, respectivamente, a Comissão Nacional da Verdade e o Direito ao Acesso a Informações, em 18 de novembro passado”.