Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Rodando a baiana

Quinta, 11 de janeiro de 2012
Por Ivan de Carvalho

Nos próximos oito meses há uma grande possibilidade de lances emocionantes na luta entre as duas partes da magistratura, a que quer um Conselho Nacional de Justiça exercendo uma fiscalização eficaz do aparelho judiciário do país e a que quer tornar essa fiscalização esquálida, frágil, quase imprestável.

    O prazo de oito meses diz respeito ao tempo que resta de mandato à atual corregedora nacional de Justiça, a ministra baiana Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça. Terminará no início de setembro seu movimentado mandato no cargo que ocupa no CNJ, quando os até previsíveis (por corporativos) ataques judiciais e extrajudiciais de setores da magistratura às suas ações e procedimentos levou-a a confrontar esses setores. E, para usar expressão bem popular, botou a boca no mundo. Entre outras coisas, disse que há “um gravíssimo problema” de “bandidos escondidos atrás da toga”.

     O caso ganhou imediata e intensa visibilidade nacional, por intermédio de toda a mídia. E não ficou nisso. Eliana Calmon ganhou o apoio declarado de alguns setores dentro da magistratura, como de juízes federais e da entidade que congrega os magistrados da Justiça do Trabalho, e fora da magistratura – a exemplo da Ordem dos Advogados do Brasil, que já se pronunciou a respeito. E está disposta a insistir mais na luta: o Conselho Federal da OAB, segundo anunciou esta semana seu presidente, Ophir Cavalcante, promoverá ato público em sua sede, em Brasília, no dia 31, em defesa das atribuições do CNJ, ameaçadas por ação, no STF, da Associação dos Magistrados Brasileiros. A ação obteve polêmica liminar do ministro Marco Aurélio Mello. O ato da OAB contará com a participação de juristas, parlamentares, artistas, jornalistas e diversas entidades da sociedade civil.

    Mais relevante do que os importantes apoios declarados – por setores da magistratura (certamente que é relevante também o apoio não declarado, pois se declarado fosse desagradaria profundamente a maioria dos tribunais estaduais de justiça e até mais acima), pela OAB, por juristas como o ex-presidente do STF, Nelson Jobim, por entidades da sociedade civil – muito provavelmente é a atenção e o evidente apoio popular à ministra Eliana Calmon e à sua luta pela transparência no Poder Judiciário, pela apuração e correção dos malfeitos.

    Nesta semana está fazendo calor. Na segunda-feira, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, que deu a liminar, foi entrevistado no programa Roda Viva e fez críticas à corregedora Eliana Calmon. Na terça-feira, Eliana respondeu de bate-pronto. Deu ao jornal O Estado de S. Paulo uma entrevista memorável. Pelo momento e pelo conteúdo. Respondeu a Marco Aurélio Mello e foi adiante.

   “Eles não vão conseguir me desmoralizar, isso não vão conseguir”, rodou a baiana, avisando que não vai recuar: “Eu estou vendo a serpente nascer, não posso me calar”. Reproduzindo melhor: “Perceba que eles atacam e depois fazem ressalvas. Eu preciso fazer alguma coisa porque estou vendo a serpente nascer e eu não posso me calar. É a última coisa que estou fazendo pela carreira, pelo Judiciário. Vou continuar”.

    A ministra-corregedora disse que seus críticos querem ocultar mazelas do Judiciário. E, entre outras coisas, disparou, referindo-se às informações que lhe foram pedidas sobre iniciativas judiciais contra ela: Estou muito calada porque acho que essas informações precisam ser feitas primeiro”.

     E depois, hein?
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.