Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Dadá deu o serviço

Quinta, 12 de abril de 2012 
Por Ivan de Carvalho
Dadá deu o serviço. Não Dadá, Sérgia Ribeiro da Silva, a mulher do cangaceiro Cristino Gomes da Silva Cleto, o famoso Corisco. Trata-se de diferente Dadá, um personagem que vai e vem nas gravações feitas pela Polícia Federal no âmbito da Operação Monte Carlos, que prazeirosamente apanhou o empresário do jogo Carlinhos Cachoeira e o senador Demóstenes Torres, mas acaba miseravelmente de envolver e enrolar muito bem enroladinho o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, do PT.

            Para estupefação geral do país, no entanto, querem por a culpa no papa. Isso mesmo, e como no mundo inteiro só existe um papa, Bento XVI, chefe do Estado do Vaticano e Sumo Pontífice da Santa Madre Igreja Católica Apostólica Roma, é sobre ele que o governador Agnelo Queiroz procura transferir a sua cruz.

            “Se alguém quiser me seguir, pegue a sua cruz e siga-me”, disse Jesus, algum tempo antes de pegar a dele próprio. Outro é o caso do baiano de Itapetinga Agnelo Queiroz, um ex-ateu assumido com passagem no PC do B, pelo qual foi deputado distrital e federal e ocupou o Ministério do Esporte e a direção geral da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Até que em 2009 ingressou no PT, elegeu-se governador em 2010 e atacou o papa Bento XVI em 11 de abril de 2012. Quer transferir a ele sua cruz.

            Voltando a Dadá, o de Brasília. Em conversa gravada, Dadá diz ao bicheiro Cachoeira que foi procurado por João Carlos Feitosa, o Zunga, ex-subsecretário de Esportes e funcionário do governo do Distrito Federal, que disse que o “Zero Um”, o Magrão, estava querendo falar com ele.

            Na sua análise, a PF identifica o “Zero Um” com o governador Agnelo Queiroz. E qualquer pessoa sem grave deficiência visual pode verificar que o governador do Distrito Federal é um homem com altura bem acima da média no Brasil e muito magro, embora seja bochechudo, o que pode enganar nas fotografias de paletó mostrando apenas do peito para cima. Enquadra-se, facilmente, na tipificação de “magrão” – grande e magrelo.

            Apanhado de surpresa por perguntas dos repórteres, ele replicou, incontinenti: “Será que ‘Zero Um’ não era ao Papa que ele estava se referindo? Ou outra autoridade?”. Qual outra? Obama? Ou Dilma Rousseff? Ou o Dalai Lama?

            Ou seria José Dirceu – figura de proa do PT (mas não a ponto de ser Zero Um) –, de quem não surgiu envolvimento algum com as investigações da Operação Monte Carlo, mas está na mídia cobrando da mídia que espinafre o DEM porque o senador Demóstenes Torres, envolvido com o empresário do jogo ilegal, era do DEM.

            Ora, quando o governador do DF era do DEM e foi apanhado em corrupção, foi forçado a deixar rapidamente o partido. Que foi muito criticado, e com razão, pois nem devia ter deixado José Roberto Arruda entrar nele, ante o seu histórico político conhecido. Mas de Demóstenes, o DEM não sabia de nada, o senador enganou seu partido e os colegas de Senado de todas as legendas. Até do gabinete da presidente Dilma, nos primeiros meses de governo, lhe foram feitos reiterados acenos para passar à base do governo.

            Bem, o que fará José Dirceu se ficar evidente acima de contestações o envolvimento do governador petista Agnelo Queiroz com o bicheiro Carlinhos Cachoeira e malfeitos consequentes? Dirceu vai exigir da mídia que ataque severamente o PT, como acaba de fazer em relação ao DEM?

            É esperar para conferir. Se alguém achar que vale a pena esperar pelo que não vem.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 
Clique aqui e veja o vídeo da reportagem da TV Globo.