Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Um passo à frente

Quarta, 2 de maio de 2012
Por Ivan de Carvalho                
Acostumado a frequentar os bastidores mais sombrios da política, Carlinhos Cachoeira pretendeu ingressar menos informalmente na política partidária e, criativo como tem demonstrado ser, com uma inovação.
          
  Todo mundo sabe que, desde o fim do bipartidarismo forçado pelo regime militar, foram multiplicando-se legendas, várias delas, micropartidos que, por seu comportamento e finalidade, tornaram-se conhecidos como “legendas de aluguel”. Ressalve-se, no entanto, que há também micropartidos que não são “legendas de aluguel”.

Esse tem sido um grande escândalo político que não tem merecido investigação policial, denúncias do Ministério Público nem dos partidos que não são de aluguel, assim, também não têm sido objeto de apreciação, sequer de preocupação, da Justiça Eleitoral brasileira. A coisa acontece mansa e pacificamente.

Para que não se incorra em omissão, houve um caso atípico, a mostrar que nem tudo está perdido. Tomadas de certo espírito evangélico, de dar sem esperar nada em troca, alguns micropartidos deram a Fernando Collor de Mello tempo de televisão destinado por lei à propaganda partidária deles. E assim pôde surgir o mito do “caçador de marajás”, primeiro presidente eleito por voto universal e secreto depois de Jânio Quadros. Ambos, Jânio e Collor, renunciaram ao cargo de presidente da República.

O grande passo seguinte é e tudo indica continuará sendo ainda por muito tempo o maior escândalo político de corrupção da história da República – o Mensalão. Acredito até que no período do Império e mesmo no Brasil colonial não encontrará o historiador algo tão colossal. E isto independente até do que decida o Supremo Tribunal Federal no processo que julgará. O Mensalão tem a didática virtude de ser safadeza pública, notória e evidente por si mesma.

Mas aí, no Mensalão, não eram partidos ou políticos que alugavam partidos para usufruir do tempo de propaganda eleitoral no rádio e TV. Era um sistema que reunia operadores privados e recursos financeiros públicos que se travestiam de privados para comprar, na Câmara dos Deputados, votos que assegurassem maioria ao governo Lula. Não era o caso de “legendas de aluguel”, mas sim de deputados e bancadas de aluguel, sob orientação de comandos partidários. Até gente que já votaria mesmo com o governo, por ser do partido do presidente da República, beneficiou-se da propina. Foi uma festa, mil vezes mais animada que as que fizeram em Paris, entre outros, o governador Sérgio Cabral e o dono da Delta Construções LTDA, Fernando Cavendish.

Mas agora vem Cachoeira com sua inovação. Não pretendeu alugar legendas para usar-lhe o tempo de TV e rádio, não recebeu – ao contrário de Collor – graciosamente tempo de rádio e TV de legendas que, supõe-se, não sabiam o que fazer com ele, nem pagou mensalão por apoio de deputados na Câmara. Cachoeira apenas quis comprar a seção de Goiás do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) ao presidente nacional da legenda, Levy Fidelix, cuja principal proposta é o “aerotrem”, sério concorrente do Trem Bala. Cachoeira propôs pagar R$ 200 mil, mas, mesmo sendo bicheiro, não apostaria na sorte – queria “garantia”, não se arriscaria a pagar em vão.

Agora, no Brasil, passa-se do aluguel à compra de partidos. Um passo à frente em nossa evolução política.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.