Quarta, 8 de agosto de 2012
Por Ivan de
Carvalho
Começou
como Primavera Árabe, mas passaram o tempo e muitos fatos e já agora não dá
mais para usar essa esperançosa denominação primaveril. O fenômeno atingiu a
estação do verão, muito quente, como sempre na região. Os riscos parecem
aumentar gradualmente, mas sem cessar.
Primeiro,
um dado não árabe que se insere no conjunto. O contencioso Israel – Irã. Este
último país, dominado por uma teocracia radical de linha xiita, corrente
minoritária no islã, mas forte, ousada e geralmente agressiva, desenvolve um
programa nuclear, parte ostensivo, parte secreto.
Nove em cada dez
especialistas no assunto (inclusive os cientistas e técnicos da ONU) acreditam
que a intenção é construir armas nucleares. Embora abarrotado de petróleo, o
Irã insiste que seu programa nuclear tem fins pacíficos, de produção de
energia. Mas não abre mão do processo de enriquecimento do urânio nem deixa
ninguém ver a tal parte secreta das instalações nucleares.
Ora, a teocracia
iraniana tem como primeiro objetivo manter-se no poder e, como segundo,
extinguir o Estado de Israel. Enquanto isso, Israel estuda uma eventual e
difícil ação bélica contra as instalações nucleares iranianas. Não dá para
saber de onde vem esse ódio todo do Irã por Israel, até porque historicamente o
Irã, antiga Pérsia, se deu muito bem com o povo de Israel. Na Antiguidade,
Ciro, rei da Pérsia, citado na Bíblia como ungido pelo Senhor, venceu Babilônia
e libertou os israelitas que eram escravos lá. No século passado, antes da
teocracia fundada por Khomeini assumir o poder, o Irã, governado pelo Xá Reza
Pahlevi, mantinha relações diplomáticas e de amizade com o Estado de Israel.
Hoje, no
entanto, o Irã patrocina atentados terroristas contra Israel em qualquer parte
do mundo em que haja oportunidade para isso, financia e arma o Hezbollah,
movimento terrorista anti-israelense “sediado” no sul do Líbano e dá a
cobertura possível ao Hamas.
No mundo árabe,
as coisas mudam. Parece que começam a mudar no Egito, sutilmente. O tratado de
paz deste país com Israel é fundamental à relativa (nunca é plena) estabilidade
política e militar na região. Os militares egípcios são favoráveis ao tratado e
ainda têm muita influência em seu país, que, no entanto, elegeu um presidente,
Mohamed Morsi, líder da Irmandade Muçulmana, movimento clandestino antes da
queda do regime anterior, liderado por Hosni Mubarack.
Na semana
passada houve um conflito dentro do Egito, perto da fronteira com a Faixa de
Gaza, dominada pelo movimento palestino terrorista Hamas, que, como o Irã, quer
a extinção do Estado de Israel. Terroristas saíram de Gaza usando uma rede
clandestina de túneis, alcançaram um grupamento militar egípcio, mataram
soldados egípcios, apreenderam armas e carros de guerra. Com esse material,
tentaram atravessar a fronteira com Israel para atacar israelenses. Foram
repelidos.
Agora, enquanto
o governo egípcio de Mohamed Morsi determina uma operação de fechamento dos
túneis, a Irmandade Muçulmana que ele comandava antes de ser eleito presidente
declara que é preciso fazer uma revisão importante no tratado de paz Egito –
Israel. É um gritante sinal de perigo.
Se tudo isso
acontece no Egito, na Síria acontece muito mais. Uma revolta começou em março
do ano passado, poucos acreditaram que iria adiante, mas ela cresceu e
tornou-se um grave conflito interno que já superou o recorde de matança de 20
mil pessoas estabelecido em 1982 pelo ex-ditador vitalício Hafez Assad, pai do
atual ditador vitalício Bashar al-Assad. Ninguém sabe ainda o que a Síria,
implacável inimiga de Israel, com o qual tem litigiosa fronteira, será ao fim
desse conflito.
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Este artigo foi publicado
originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista
baiano.