Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O Brasil e o caso Assange

Sexta, 17 de agosto de 2012 
Por Ivan de Carvalho
Eu já estava todo animado para a guerra. Imaginava que o Brasil mandaria, no comando de uma frota, o porta-aviões São Paulo para o rio Tâmisa.

            Infelizmente, parece que o experiente Estado inglês é como o boi, que sabe onde arromba a cerca. Arrombou quando veio retomar as Falklands (Malvinas) do governo argentino.

Mas o ex-império onde o Sol nunca se punha fugiu à luta, escafedeu-se, quando percebeu que poderia enfrentar um furioso Equador de Rafael Correa apoiado pelo Brasil de Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência da República para Assuntos Internacionais, com a cobertura infalível dos revolucionários bolivarianos da Venezuela sob o comando do coronel Hugo Chávez. Na verdade, a invasão da embaixada seria um ato de violência injustificada e de extrema visibilidade, daí, talvez, o recuo.

As notícias de quarta-feira e ontem vinham se revelando inquietantes. Na madrugada de quarta, policiais ingleses posicionaram-se em frente à embaixada do Equador, em Londres, enquanto em Quito o governo do Equador tomava a decisão que anunciaria ontem – a concessão do asilo político a Julian Assange, o australiano fundador do site WikiLeaks, fonte de uma enorme dor de cabeça para o governo americano e dores menores para vários outros.

Assange e seu site têm uma importância marcante, em nível mundial, na luta pela preservação das liberdades de imprensa e de expressão. Mas é jovem e, caçado pelo governo americano, foi irresponsável ao meter-se com duas mulheres suecas de uma vez. Resultado: uma denúncia e um processo por violência sexual (ele garante que foi tudo consensual), que pode ser uma conspiração para depois entregá-lo aos Estados Unidos, onde processos contra a segurança do Estado buscariam alcançá-lo e silenciá-lo.

Nem a Inglaterra, cuja corte suprema determinou a extradição para a Suécia, nem a Suécia, quiseram comprometer-se com o Equador em, depois do processo, não entregar Assange às autoridades americanas. E estas negaram-se a informar o governo equatoriano sobre possíveis processo contra Assange no país, alegando que não iriam imiscuir-se em um assunto que estava sendo tratado entre o Reino Unido e a Suécia.

A tensão subiu muito ontem, quando o chanceler do Equador afirmou que seu país recebeu do governo britânico uma carta, na qual advertia que tinha os meios legais para prender Assange dentro da embaixada do Equador – a decisão da corte suprema, apesar de anterior à concessão do asilo, determinando a extradição. O governo britânico disse na carta, segundo o governo equatoriano, que pretende cumprir a ordem da corte e tem base legal para isto, uma lei inglesa de 1987, que permite revogar o status da representação estrangeira, autorizando a entrada da polícia no prédio da embaixada, no caso, a embaixada do Equador. Parece que o Brasil, o Equador e muitos outros países não têm uma lei sequer parecida.

Mas, para alívio geral e fim da guerra antes que começasse, ontem mesmo o Foreign Office, declarando-se decepcionado com a decisão do Equador e o “discurso” de seu chanceler Ricardo Patiño – que denunciou a ameaça britânica – garantiu que não invadirá a embaixada, mas não dará o salvo-conduto para Julian Assange ir da embaixada ao aeroporto e deixar o Londres com destino ao Equador. O Brasil foi convocado para uma reunião da Unasul no domingo, pedida pelo Equador. O governo brasileiro deve ir à luta, pelo aliado Equador (não vamos abandonar o companheiro Correa) e pelo direito de asilo, no caso, para Assange.

Assange vai ter que ficar na embaixada, sabe Deus por quanto tempo.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.