Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O maior de todos


Sexta, 3 de agosto de 2012 
Por Ivan de Carvalho
Tornou-se lugar comum afirmar que o Mensalão é o maior escândalo da história do Brasil. Convém, assim, considerar se isto é verdade. Ser o maior escândalo de corrupção de corrupção não significa, necessariamente, que seja aquele em que foi posto mais dinheiro ou que se desviou mais dinheiro público.

O Mensalão, cujo julgamento, após longa preparação, de vários anos, começou ontem no Supremo Tribunal Federal é considerado por muitos o maior escândalo de corrupção da história do Brasil (outros, mais discretos, falam em “história recente”, o que, a meu ver, é uma cautela desnecessária e injustificada) não pelos valores monetários envolvidos, mas por sua natureza.

Entre outras coisas, foi, segundo denúncia da Procuradoria Geral da República acolhida pelo Supremo Tribunal Federal, um sofisticado esquema de compra de partidos e suas bancadas partidárias no Congresso Nacional (mais especificamente, na Câmara dos Deputados), implicando na compra de votos de parlamentares mediante pagamento regular para aprovarem propostas legislativas de interesse do governo – o governo de Lula no seu primeiro mandato.

Esta acusação resultante de fatos que a nação acompanhou estarrecida na época e que arrastaram lideranças importantes do partido do governo, o PT e de alguns outros partidos aliados dá uma extraordinária magnitude ao escândalo. O Mensalão é o maior não só por ter sido o mais amplamente divulgado, pois neste caso rivaliza – com muita dificuldade para saber qual dos dois levou a melhor – com o escândalo que obrigou o presidente Fernando Collor a renunciar ao cargo para escapar ao impeachment, o que conseguiu, e à suspensão dos direitos políticos, o que não conseguiu, pois o Senado Federal passou por cima da Constituição e aplicou essa pena acessória, quando, juridicamente, não o podia fazer.

Em assuntos de divulgação – mas guardadas as proporções, devido ao estagio de desenvolvimento dos meios de comunicação em 1954 –, o Mensalão rivaliza também com o escândalo que levou o governo de Getúlio Vargas ao colapso e o próprio Vargas ao suicídio – um misto de corrupção no governo e violência desajuizada traduzida na tentativa do chefe de segurança do presidente de promover, por burra iniciativa própria, o assassinato do jornalista Carlos Lacerda, que foi baleado em um dos pés – mas no atentado morreu o major Rubens Vaz, da Aeronáutica.

O Mensalão é um escândalo maior do que os dois citados – até então os dois maiores escândalos de corrupção do país – porque envolveu, segundo a denúncia sob julgamento no STF, a montagem de um sistema de compra do Congresso Nacional, mediante pagamento a parlamentares que o integravam e a serviço de um governo e seu partido.

O que está aí posto a julgamento pelo STF, que tem a última palavra – como teve no caso Collor de Mello, inocentado por insuficiência de provas –, é um atentado à democracia, uma tentativa de golpe político e institucional, passando por cima do resultado das eleições de 2002 que determinaram a composição do Congresso Nacional, com a arma pecuniária.

E ainda aparece quem diga que foi uma tentativa de golpe da oposição e da zelite, quando sabe que na hora crucial – quando Duda Mendonça foi ao Congresso depor – a oposição, orientada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi que mais agiu de modo ao então presidente Lula não cair – “atendendo a pedidos” e equivocadamente julgando que venceria o então desmoralizado PT nas urnas, em 2006.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.