Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 4 de agosto de 2012

O primeiro debate


Sábado, 4 de agosto de 2012 
Por Ivan de Carvalho
O modelo engessado e já tradicional do debate de sexta-feira à noite na TV Bandeirantes entre os seis candidatos a prefeito de Salvador não chegou a apresentar novidades importantes em termos de planos e propostas para a cidade, apenas algumas coisas pontuais.

            Um rápido apelo à memória do repórter traz apenas uma proposta objetiva de relevância maior. Foi feita pelo candidato democrata ACM Neto – a implantação de quatro “centralidades” na cidade, cada uma com sua “prefeitura”, vale dizer, sub-prefeitura, de modo a vivificar essas áreas, que ele discriminou. Cajazeiras, o subúrbio (ferroviário), o centro antigo da cidade e a orla atlântica.

            No mais, como bem assinalou, com alguma insistência – por se tratar de algo relevante, verdadeiro e que vem ao encontro de sua estratégia eleitoral – o candidato do PMDB, Mário Kertész, a cidade chegou a um estágio que não permite muita diferenciação em relação ao que cada candidato pode dizer que fará se chegar ao cargo de prefeito.

            Todos dizem, todos vão dizer mais ou menos as mesmas coisas, quanto às propostas e planos. “O que vai diferenciar é a capacidade administrativa, a experiência e a capacidade de liderança”, insistiu o peemedebista.

            Ora, capacidade de liderança social e de uma equipe no nível adequado para governar uma cidade como Salvador não são muitos, entre os seis, que demonstraram, até o momento. Somente dois ou três. Dois, mais provavelmente. Mas quando fala de capacidade administrativa, Kertész aponta mais para ele, pois ACM Neto e Pelegrino ainda não tiveram oportunidade para uma demonstração. E afina mais ainda a peneira quando fala em experiência.

            Não se pode confundir falta da experiência que Kertész notoriamente tem com incapacidade, replicariam, com razão, os outros, se não se preocupassem em não focar o debate sobre quanto vale a experiência. Mas deixaram passar batido, porque debate focado nesse item beneficiaria o duas vezes ex-prefeito, ex-secretário de Planejamento do Estado, executor da implantação do Centro Administrativo da Bahia, entre outras coisas.

            Registre-se, para não passar em branco, que Hamilton Assis, candidato do Psol (Partido Socialismo e Liberdade), apresentou como proposta-mãe para sua gestão a “desprivatização da prefeitura”, partindo ele da premissa de que a prefeitura está servindo a setores e interesses privados e isto a impede de servir ao interesse público. Ele quebrou o paradigma do debate com essa tese e, como não vai ser eleito prefeito, está pondo em discussão uma questão que, se ele não o fizesse, outros não fariam. Aliás, no próprio debate da Bandeirantes nenhum de seus concorrentes discutiu esta sua proposta de “desprivatização”.

            Entretanto, o debate teve uma parte que poderíamos chamar de deseducação democrática, portanto contrária à democracia, quando se quis vender aos eleitores a idéia de que o alinhamento com os governos federal e estadual (ou pelo menos com um deles) é fator essencial para a realização de uma boa gestão na prefeitura da capital, uma metrópole de três milhões de habitantes que merecem e têm direito ao respeito de suas lideranças políticas e dos governos estadual e federal, não importa quem esteja à frente desses governos.

            Essa idéia, que um dos candidatos, ACM Neto, caracterizou como sugestiva de chantagem sobre o eleitorado, não é nova. É antiga, vem sendo usada há décadas em muitas eleições, mas ou a democracia brasileira está paralisada no tempo ou avança. E, neste último caso, já passa da hora de aposentar idéia tão infeliz e politicamente autoritária e brutalizante.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.