Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

O primeiro dia

Quinta, 2 de agosto de 2012 
Por Ivan de Carvalho
O maior escândalo de corrupção da história do país – e não apenas do governo Lula – começa hoje a ser julgado. E a previsão é de que o julgamento continuará pelo menos até os primeiros dias de setembro, isto é, começa e terminará em pleno período eleitoral, se cumprido o cronograma preparado pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, há que reconhecer o inevitável impacto que o julgamento, seja qual for o seu desfecho, terá na campanha eleitoral para prefeitos, vice-prefeitos e vereadores em todo o país. As eleições municipais se realizarão em outubro e exercerão influência nas eleições gerais de 2014 – Câmara federal, um terço do Senado, presidente e vice-presidente da República, governadores, vice-governadores e deputados estaduais. Além disso, o julgamento do Mensalão, por si mesmo, também deverá ter alguma influência direta nas eleições de 2014.

Claro que o resultado do julgamento vai determinar como essa influência em outubro próximo e nas eleições de 2014 vai se manifestar. O que ninguém pode negar é a importância política e eleitoral do fato – aliás, reconhecida por advogados de réus ligados ao PT e por políticos do PT que pediam um adiamento do julgamento sob a alegação de que sua realização em ano eleitoral influenciará as eleições.

Ora, se influencia, paciência. Quem pariu Mateus que o balance. No Brasil há eleições de dois em dois anos. Em cada dois anos, um é ano eleitoral. Aceitar a tese de que julgamentos de substrato político não devem ocorrer em ano eleitoral só prejudicaria ainda mais, quanto à celeridade, o desempenho do Judiciário, que já é geralmente lento, além de introduzir uma esquisitíssima quarentena para julgamentos que possam ter impacto político-eleitoral: poderiam ocorrer apenas um ano sim, no outro, não.

De resto, em verdade é uma contrafação pretender que o fato de ser este um ano eleitoral venha a impedir um julgamento que pode esclarecer aos eleitores se determinadas pessoas – que eventualmente poderão disputar as eleições – e até, indiretamente, certas legendas, se envolveram (ou não) em malfeitorias das mais brabas, como as que constam da denúncia feita por um procurador geral da República, reafirmada por seu sucessor e recebida pelo Supremo Tribunal Federal, com a consequente instauração do processo que a partir de hoje está em julgamento.

O cidadão-eleitor tem o direito às informações necessárias à tomada das decisões que ele levará às urnas. Assim, a lógica e o bom senso recomendam o julgamento antes das eleições e não o adiamento para depois. O STF acertou quanto à sua decisão de julgar antes, mesmo que não haja levado esse direito do eleitor em consideração.

O julgamento será agitado, disso não há dúvida. Dois breves exemplos, somente em relação à sessão de hoje, a primeira de julgamento:

1. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou ontem que ainda não descartou a possibilidade de questionar a participação do ministro José Antonio Dias Toffoli. Disse que irá decidir o que fazer até o início da análise do caso, no começo da tarde de hoje. Há várias razões que podem instruir a arguição de suspeição de Toffoli.

2. Os partidos de oposição estão preparando uma espécie de cineminha para o primeiro dia de julgamento do mensalão, marcado para amanhã. “Estamos reunindo as bancadas partidárias de oposição em uma sala da Câmara para vermos, juntos, o julgamento”, afirmou o líder do PSDB, Bruno Araújo. É evidente que se cuida aí de criar um fato político visando à introdução “solene” do Mensalão como tema da campanha eleitoral.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Wilsinho Saravá canta "Pegra Ladrão"