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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Toffoli não vota

Quarta, 22 de agosto de 2012
Por Ivan de Carvalho
Por má fé, ignorância, déficit de atenção ou de perspicácia, muita gente está censurando o ministro José Antonio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, na injusta e descabida presunção de que ele vai votar pela absolvição ou condenação dos réus do mensalão, hoje reduzidos, na corte suprema, a 37.

            Ora, alegam os maldizentes por má fé, ignorância, déficit de atenção ou de perspicácia que o ministro teria de se declarar impedido de votar por alguns motivos, anteriores à sua posse no STF:

            1. Dias Toffoli foi advogado do PT – o principal dos vários partidos envolvidos na denúncia feita pelo procurador geral da República e acolhida pelo STF – em três eleições e campanhas eleitorais – as campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva em 1998, 2002 e 2006.

            2. Dias Toffoli foi chefe da Advocacia Geral da União – um cargo de alta confiança – nomeado pelo então presidente Lula, em cujo governo aconteceram os fatos, praticados por autoridades e aliados do governo, políticos e empresários, e outros, que teriam gerado os crimes sob julgamento atualmente no STF. Foi, assim, advogado geral da União de um governo que teria sido o grande beneficiário político do chamado Mensalão (em julgamento agora no STF), enquanto este não veio ao conhecimento público através da denúncia do então deputado e presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, hoje um dos réus no processo.

            3. Dias Toffoli foi, de 1995 até 2000, assessor da liderança do PT na Câmara dos Deputados, acumulando essa função com a de advogado do PT nas campanhas de Lula em 1998 e 2002, como já assinalado.

            4. Dias Toffoli exerceu o cargo de subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil de 2003 a 2005, durante o período em que o ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República era José Dirceu, o principal dos acusados na ação penal 470, já que qualificado na denúncia do Ministério Público como “chefe da quadrilha” da “sofisticada organização criminosa” responsável pelo escandaloso Mensalão. Foi exonerado daquele cargo, a pedido, pela ministra Dilma Rousseff, que assumira a chefia da Casa Civil em substituição a José Dirceu.

            5. Dias Toffoli naturalmente tem em mente que sua mulher defendeu (já deixou as causas) três dos réus do Mensalão.

            Bem, o que se pode concluir de tudo isso? Exatamente o contrário do que os maledicentes, ignorantes, desatentos ou pouco perspicazes estão estabanadamente insinuando ou mesmo dizendo sem parar – que o ministro não se declarou impedido e vai votar.

            Ledo engano. Ele realmente não se declarou impedido – ainda. Mas vai se declarar. Pessoa cônscia dos princípios éticos, bem como de seus deveres e capacidades, terá percebido – isto é bem fácil de imaginar – que sua presença no início do julgamento seria benéfica, ao ajudar a dirimir algumas das complexas questões que se apresentaram sobre a formatação do próprio julgamento e sobre o modo de votar.

            Agora, é obvio, votar mesmo não é com ele. O ministro-relator Joaquim Barbosa proferiu a primeira fatia do seu voto, o ministro-revisor faz o mesmo, proferindo a fatia correspondente de seu voto, depois, seguindo a tradição, vota o ministro mais novo no tribunal, Luiz Fux e, em seguida, quando seria a vez de Dias Toffoli – tchan, tchan, tchan, tchan!

            Ele se declara impedido de votar, invocando aquelas razões já citadas aqui e em milhares de outros escritos e falados e pergunta, com a dignidade que o caracteriza, se alguém por acaso, em algum momento, imaginou mesmo que ele iria votar ou se acaso ignoram o que é um ministro do Supremo Tribunal Federal.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.