Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

MPF move ação para que estudantes e Universidade de Mogi das Cruzes (SP) paguem indenização por trote violento

Quarta, 30 de janeiro de 2013
Liminar pede que UMC seja obrigada a impedir trote no início do próximo ano letivo; em 2010, veteranos esfregaram fígado de boi podre no rosto de calouros, que também apanharam
 
O Ministério Público Federal em Guarulhos pediu à Justiça Federal que determine, inicialmente em caráter liminar, que a Universidade de Mogi das Cruzes impeça a realização de trotes violentos no início deste ano letivo. A mesma ação também pede que três estudantes, um deles já formado, e a própria UMC sejam condenados ao pagamento de R$ 400 mil por danos morais coletivos pelo trote violento ocorrido em 2010, quando diversos estudantes de medicina foram submetidos a agressões físicas e morais.

Preocupado com o histórico de violência envolvendo trotes na UMC, o MPF defende a adoção de medidas preventivas, inclusive a contratação de segurança privada e a solicitação de apoio à Polícia Militar, para impedir qualquer tipo de trote violento num raio de 200 metros do prédio da universidade. Caso a liminar seja desrespeitada, a ação defende a aplicação de multa diária no valor de R$ 100 mil.

Além da Universidade de Mogi, são réus na ação os estudantes de medicina Giuseppe Fernandes Pastore e Cláudia Pastorelli Mosca e o médico Ricardo Vicente de Miranda Faria, que participaram do trote violento e são acusados de agir de “modo agressivo e desumano”. Cada um deles pode ser condenado a pagar R$ 100 mil de indenização por danos morais coletivos.

Segundo a ação, no dia 22 de fevereiro de 2010, calouros do curso de medicina foram recrutados dentro das salas de aula e levados para um sítio, no bairro Parque das Varinhas, em Mogi das Cruzes, onde foram submetidos a diversos tipos de violência e constrangimento. A Universidade de Mogi é acusada de omissão, já que permitiu que os alunos fossem retirados das salas de aula.

“Já na sala de aula, rumo ao centro acadêmico, os calouros foram compelidos a ajoelharem-se para realizar ato de reverência aos alunos veteranos e, após, em fila e abaixados, foram arrastados durante todo o percurso enquanto eram humilhados e insultados com palavras de baixo calão”, revela a ação, assinada pelo procurador da República Matheus Baraldi Magnani.

Levados para um sítio em três ônibus fretados, os calouros foram obrigados a “passar por um circuito de lama, uma piscina de frutas estragadas e, após, eram conduzidos para uma cruz de madeira onde eram compelidos a ficar com braços abertos, sendo agredidos com ovos, farinha, ketchup, mostarda, cerveja e peixe podre”.

Durante o inquérito, muitos estudantes contaram que foram agredidos física e moralmente. Um dos veteranos chegou a esfregar um fígado de boi podre no rosto dos calouros. Muitos contaram ter recebido tapas na cara, além de serem agredidos com palavras de baixo calão. Após o episódio, uma das estudantes agredidas desistiu de cursar medicina na Universidade de Mogi.

O trote violento aconteceu menos de cinco meses após a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo expedir uma recomendação a todas as instituições públicas e privadas de ensino, para que fossem adotadas medidas destinadas a coibir a “realização do trote estudantil com caráter violento, humilhante, vexatório ou constrangedor aos alunos, não apenas nas dependências da instituição de ensino mas, também, fora dela”.

“Num país no qual o acesso à educação já tem seus obstáculos sociais naturais, não é concebível que estudantes imaturos e despidos de civilidade criem um ritual de humilhação pelo qual deverá passar aquele que pretende frequentar um curso de medicina”, afirma o procurador Matheus Baraldi. Para ele, as condutas dos estudantes denunciados são repulsivas e ilícitas. “Enquanto não forem devidamente punidos, as chances de tudo se repetir são grandes, já que o indivíduo, sobremodo no que se refere ao denominado 'trote estudantil', tende a reproduzir, futuramente, os males dos quais foi vítima”.  O procurador afirma ainda que “a adoção de medidas como as  previstas nesta ação civil pública pode ajudar a eliminar o trote violento de nossa cultura acadêmica”.

A ação responsabiliza a Universidade de Mogi por atitudes omissas, já que deveria proibir qualquer atitude violenta nas suas dependências. Ao invés disso, aponta Baraldi, “a universidade permite que todos os anos sejam afixados em suas dependências cartazes anunciando eventos nos quais serão aplicados trotes violentos”.

Este não foi o primeiro registro de trote violento envolvendo a UMC. Em março de 1980, um calouro de medicina da UMC morreu após um trote. Segundo notícia publicada na época, “ele resistiu ao corte de cabelo e foi agredido com socos e pontapés”.