Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 26 de março de 2013

Brocotó

Terça, 26 de março de 2013
Por Ivan de Carvalho
Não existe a menrs dúvida de que, entre os 513 deputados, há, aparentemente, dezenas deles melhor preparados para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara do que o pastor Marco Feliciano, cuja presença e continuação no cargo foram ontem consideradas inaceitáveis em nota divulgada pela Anistia Internacional.

Mas também não existe a menor dúvida de que há dezenas e dezenas de deputados pior preparados do que ele para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias e, nessas dezenas e dezenas, destaco todos aqueles adeptos de ideologias ou desengonçados ideários autoritários, bem como os adeptos do poder autoritário por si mesmo, sem preocupação com utopias, do tipo Idi Amin Dada, Somoza e chega, pois se persisto gasto todo o espaço.

Não estou atacando nem defendendo o pastor Marco Feliciano, até porque existem pessoas e organizações com muito mais influência que este jornalista para fazer as duas coisas. Para atacar e pedir seu afastamento do cargo de presidente da comissão está aí a Anistia Internacional, uma organização reconhecidamente séria e influente, à qual se somam organizações LGBT e vários parlamentares, sob a voz de comando de Jean Willis, que recebeu a adesão até do presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves.

Para defender o deputado-pastor do PSC e sua permanência no cargo, tomo a liberdade de fazer duas sugestões. A primeira, a presidente Dilma Rousseff, para quem em 2010 Marco Feliciano fez entusiasmada campanha junto às ovelhas que pastoreia. Em nenhum momento seu apoio foi considerado inconveniente pela candidata a presidente ou por seu partido. A segunda sugestão é a de que o PT cerre fileiras em defesa do representante do PSC (partido aliado) na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

Não tanto porque o PSC seja um partido aliado. Mas em gratidão ao apoio dado à candidata Dilma Rousseff por Feliciano. A ingratidão é um sentimento muito mau. Além disso, o pastor só está presidindo a comissão porque o PT abriu mão de indicar o presidente dela em favor do PSC, em um acordo. E o PSC, pimba: indicou o pastor Marco Feliciano, que a maioria dos membros da comissão, apesar dos protestos de alguns membros e de protestos de outras origens, elegeu.

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, do PMDB, deu “prazo” até hoje para o PSC, partido que indicou o deputado-pastor para o cargo, resolver o problema, o que, a rigor, só poderia ser feito por três modos: mediante convencimento de Marco Feliciano a renunciar à presidência da comissão; mediante a anulação da eleição (11 votos no total de 18) pelo Supremo Tribunal Federal (ninguém, jurista, oponente ou antipatizante até agora sugeriu uma fundamentação constitucional ou jurídica viável); e mediante morte.

As duas primeiras hipóteses, o deputado-pastor Marco Feliciano já excluiu, em entrevista concedida ao programa Pânico, da Band, gravada no meio da semana e transmitida ontem. Ser convencido a renunciar? Mas como? Seria como confessar, argumenta ele, que é culpado da acusação de racista (a única que parece incomodá-lo ou indigná-lo) e depois ter que explicar aos filhos a razão de terem um pai que na escola deles é chamado de racista.

A anulação da eleição? Ao nem considerá-la, o deputado-pastor já deixou implícito, mas claro, que não é uma hipótese.

O deputado Marco Feliciano admitiu apenas uma hipótese de deixar a presidência da comissão: “Só se eu morresse...”.

Em desespero de causa perante Constituição e Regimento Interno, que é como parecem estar, seus oponentes poderiam estimular os mais furibundos a ressuscitarem e contratarem, com alto salário (ou propina, hoje, a gente nunca sabe) aquele tétrico personagem de Chico Anísio, Urubulino, que conseguia, numa conversa de poucos segundos, levar alguém saudável à morte súbita ou doença terminal.

Aí, como dizia Urubulino, brocotó para o pastor. Mas, se os oponentes não conseguirem a ajuda do personagem, brocotó prá eles.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
Urubulino, personagem de Chico Anysio.