Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 30 de abril de 2013

Cid Benjamin, fundador do PT, lamenta que Brizola não tenha chegado à Presidência

Terça, 30 de abril de 2013
Da Tribuna da Imprensa
Um dos líderes da guerrilha urbana e fundador do PT, o jornalista Cid Benjamin está prestes a lançar o livro ‘Gracias a la Vida’. Ele diz que se pudesse voltar no tempo faria tudo de novo, mas de outra forma
 
Veja trechos da entrevista a Caio Barbosa, de O Dia.
Da maioria dos ex-companheiros, pelo menos os mais conhecidos, como o Fernando Gabeira e o (ex-ministro) Franklin Martins, você é um dos poucos que se mantêm em defesa do socialismo.

Mudei algumas concepções, mas no essencial eu continuo no mesmo lado onde estava. Hoje, dou um peso maior à democracia, até porque acho que ela não enfraquece o socialismo. Muito pelo contrário. Ela valoriza e enriquece a proposta socialista.

Na volta ao Brasil, você fundou o PT com outros ex-companheiros. Mas hoje o partido é bem diferente.

O PT deixou de ser um partido de transformação social, o que não quer dizer que seus integrantes, pelo menos a maioria, não têm mais essa perspectiva. Mas a direção do PT… o rumo que tomou não é transformador. E nem falo de transição para o socialismo, mas da dificuldade que o PT tem para tomar medidas republicanas mais radicais. Embora eu reconheça melhorias em relação aos governos anteriores, é muito pouco para o que eu queria do PT.

Você é daqueles que consideram que o grande legado do PT, além do Bolsa Família, será a despolitização da sociedade após os escândalos de corrupção?
 
É um exagero afirmar isso. Contribuiu bastante para a desilusão. Despolitização? Penso que sim. Mas o Bolsa Família melhorou a situação de milhões de pessoas. Só que representa apenas 1/5 do lucro dos bancos. E se você quer pensar em transformação social, é preciso pensar em emprego digno e estável. A assistência social tem que ser feita muitas vezes porque há miséria, mas é preciso ter a porta de saída para não ficar vivendo eternamente da caridade do Estado.

Apesar de ter sido fundador do PT e um dos coordenadores da campanha do Lula na histórica eleição de 1989, você diz no livro que o melhor para o país teria sido a eleição de Leonel Brizola. Por quê?

Pela educação. Acho que ela tem de ser prioridade em qualquer governo, de esquerda ou direita. Isso não tem a ver com o socialismo e não necessariamente vai ameaçar as classes dominantes. Se o PT tivesse revolucionado a educação fundamental nestes 11 anos, já teria sido um legado enorme. Mas nunca fizeram isso. Aliás, não há quem cite neste governo uma única medida que tenha contrariado o interesse das classes dominantes, dos bancos, dos empreiteiros, das multinacionais e do agronegócio.

E qual a sua avaliação do governo Dilma, outra ex-guerrilheira. Vocês se conheceram na ditadura?

Não. Ela era da base. O ex-marido, Carlos Araújo, é que era dirigente. Eu acho um governo frustrante porque não é de transformação social. Se você me perguntar se não é melhor que os do Lula, Fernando Henrique e Collor, certamente direi que é, mas não me satisfaz. Não mexe com os interesses dos ricos, não faz as reformas necessárias e constrói a governabilidade montando uma geleia de partidos que o imobiliza. São tantas concessões que não permitem as transformações, apenas permitem que o governo não seja incomodado.

O que chama a atenção em você é que, apesar de ter sido derrotado na luta contra a ditadura, de ter criado um partido que te causa frustração, você tem uma alegria de viver incrível.

Fiz o que achei que deveria ter feito e o fato de ter perdido batalhas não me deixou amargurado. Se eu ficar preocupado com tudo o que passei, vou ser torturado continuamente. Buda dizia que guardar rancor é como pegar um carvão em brasa com a intenção de atirá-lo em alguém. Quem segura o carvão é que se queima.

E o Darcy (Ribeiro) também tinha uma ótima. Ele dizia: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras e não consegui; tentei salvar os índios, não consegui; tentei fazer uma universidade séria e fracassei; tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Detestaria estar no lugar de quem me venceu”. Penso exatamente assim.