Sábado, 27 de julho de 2013
Paulo Metri*
Em seguida a este trecho, Castro Alves, no seu poema “Navio negreiro”, diz “que o pavilhão se lave no teu pranto!”
Este poema vem à minha lembrança sempre que sou acometido de tristeza
por identificar profunda injustiça. Nunca soube o quanto ele influenciou
mentes a favor da causa abolicionista, mas certamente as influenciou.
O pavilhão está no “tombadilho que das luzernas avermelha o brilho. Em sangue a se banhar”.
Apropriando-me da magistral obra, diria que ela se enquadra também ao
petroleiro estrangeiro que leva nosso ouro negro, última esperança de um
povo bom, enganado com miçangas. Qual um escravo, o sangue do
brasileiro se esvai nos tombadilhos onde o capital internacional o suga.
Na África, negros que desonravam a raça caçavam outros negros, seus
irmãos, para vendê-los a mercadores do tráfico negreiro. No Brasil
atual, temos desgraçados caçando a vida digna de seus iguais. Entregam o
ouro negro, que poderia recuperar os carentes, criar oportunidades onde
elas não existem. Dentro do petroleiro, trancados nos porões, estão a
educação, a saúde, a habitação, o saneamento, o transporte e tudo mais,
com qualidade, pertencentes a gerações futuras de brasileiros, enfim, a
esperança de uma vida melhor que a dos seus pais.
Tudo isto para o regozijo das corporações internacionais, alimentando
não só a acumulação capitalista, mas também a divisão do mundo entre
países centrais e periféricos. Dói muito saber que os maiores
responsáveis por este crime são brasileiros vendidos, que participam do
grande teatro apresentado no palco midiático, dominado por este mesmo
capital alienígena. São os carrascos dos próprios irmãos.
Se o puro Francisco, por infinita bondade e inocente credulidade com
relação aos arrependimentos declarados pelos algozes do nosso povo, lhes
der absolvição, peço a Deus que a casse, considerando a magnitude e a
repercussão em gerações à frente dos atos destes assassinos da
esperança. Nossos irmãos conscientes têm a obrigação de divulgar estes
fatos, não os deixando cair na lixeira das informações, à medida que o
teatro encenado diariamente por ordem do capital busca substituir o
crucial pelo supérfluo. Snowden e Wikileaks nos forneceram notícias não
pasteurizadas, nem maquiadas, nuas e cruas, reveladoras do mundo real e
que derruba pilares da construção ficcional de um mundo criado para
sermos explorados. Eles fornecem informações que deveriam servir como
alicerces para a construção de um futuro melhor.
Cerca de 900 blocos para exploração e produção de petróleo já foram
entregues pelo governo brasileiro a concessionárias, que, se descobrirem
petróleo, serão donas exclusivas dele. Neste total, estão também os
blocos arrematados pela Petrobras e por pequenos empresários
genuinamente nacionais, que tendem a reinvestir seus lucros no país.
Quantos blocos estão com as petrolíferas estrangeiras, como operadoras
ou como membros de consórcios, é difícil saber, até porque as empresas
repassam a outras a sua condição de concessionárias. A ANP não fornece
estas transferências de propriedade.
Em outubro, o governo brasileiro irá entregar, através de um leilão,
de 8 a 12 bilhões de barris de petróleo, localizados no campo que se
convencionou chamar de Libra. Junto com o campo, irá embora também um
futuro melhor, principalmente para nossos filhos e netos. Todo
brasileiro, não vendilhão de seus irmãos, não pode medir esforços para
que este roubo seja tolhido. Castro Alves, por amor aos brasileiros,
empreste a sua verve para outro jovem como você, para ajudar a barrar o
novo tráfico negreiro do século XXI.
Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia.