Quinta, 26 de setembro de 2013
Artigo publicado originariamente no Jornal do Brasil
Nenhum botequim ou negócio,
por mais modesto, seria capaz de se manter por muito tempo caso fosse
submetido às condições contratuais atualmente praticadas pela União com
relação à dívida dos estados da federação. Tomo o exemplo do meu
estado, o Rio Grande do Sul, mas os demais vivem situação semelhante.
Essa circunstância impõe a urgência da deflagração de um movimento
nacional por uma revisão dos números dessa dívida. Em 1997, o Rio Grande
devia R$ 11 bilhões à União, pagou R$ 18,7 bilhões até 2010 e, em 2012,
ainda devia R$ 40 bilhões. Aproximadamente 13% da arrecadação são
consumidos pelo serviço de uma dívida que não para de crescer.
Com
referência à totalidade dos estados, contabilizando as dívidas e
pagamentos de 1999 até 2011, a situação era a seguinte: com uma dívida
de R$ 121 bilhões,
os estados pagaram R$ 165 bilhões, enquanto o montante devido chegou à
impressionante cifra de R$ 369 bilhões. A atualização dos contratos
elevou em 589% a dívida, em contraste com uma inflação oficial de 133%
no período. Um trabalho pesado e sem trégua capaz de humilhar Atlas,
condenado por Zeus a sustentar os céus por toda a eternidade.
São números expressivos e, por trás deles, existe a realidade social, econômica
e financeira dos estados e as reivindicações e necessidades de milhões
de brasileiros. São programas sociais, despesas com saúde, educação e
segurança, obras de infraestrutura e investimentos diversos paralisados
ou em marcha lenta. Em virtude de um endividamento brutal alimentado por
condições abusivas, incluindo as garantias draconianas vinculadas às
transferências constitucionais.
Como surgiu essa dívida? Em 1998, o governo federal empreendeu um esforço de recuperação
e ajuste fiscal que exigiu um refinanciamento das dívidas dos estados,
que até então promoviam a rolagem dos encargos no mercado financeiro
mediante pagamento de juros exorbitantes. A administração de cunho
liberal introduziu no pacote de refinanciamento a exigência de
privatização de empresas e bancos estatais, além da federalização de
títulos públicos. Porém, a situação era tão complicada que os
governadores e parlamentos estaduais aceitaram as condições impostas
pela União que, afinal, ainda eram mais generosas que as da banca
privada.
Se no início os estados respiraram aliviados, a
evolução da dívida superou extraordinariamente a inflação e o torniquete
apertou novamente. Chegamos então a situação atual. A União exige dos
estados, contraditoriamente, taxas de juros superiores às que o BNDES
cobra de conglomerados privados, através da elevação da dívida pública.
Uma distorção de prioridades de natureza perversa e prejudicial ao
desenvolvimento equilibrado do país. Está mais do que na hora de uma
reação nacional organizada para levar o governo a revisar sua política. A
administração não pode ser mais amiga do mercado do que dos estados.
*Pedro Simon é senador da República.