Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Eu não compactuo com a satanização de Joaquim Barbosa

Segunda, 30 de setembro de 2013
Por Celso Lungaretti
Blog Náufrago da Utopia

Detesto a satanização e os linchamentos morais orquestrados, que tinham ido para a lixeira da História juntamente com o cadáver fedorento do stalinismo, mas a pior parte da esquerda exumou na era da internet. Quem disse que Goebbels não influenciou também o nosso lado?

O caso de Joaquim Barbosa é emblemático. Ministro do Supremo Tribunal Federal que, em quase todos os temas, tem sempre assumido posições próximas às nossas (é sensível à justiça social e contrário aos abusos e privilégios dos poderosos), foi erigido em grande vilão pela rede virtual petista e seus satélites, em função da forma como relatou o processo do  mensalão.

Isto seria aceitável se o criticassem apenas e tão somente pelo que lhes faz doer os calos. Mas não, transformam-no num espantalho, atribuindo-lhe um reacionarismo que nunca teve e até projetos políticos que jamais professou.

O grande truque do diabo é fingir que não existem homens de esquerda indignados com tudo aquilo que o  mensalão  representa: o recurso às mesmas maracutaias dos políticos tradicionais, para garantir a governabilidade exatamente da mesma maneira: subornando parlamentares. 

Ademais, tais práticas desmoralizantes foram adotadas para o governo ganhar votações que não fizeram verdadeiramente avançar a revolução brasileira. O PT, há mais de uma década, vem apenas gerenciando o capitalismo para os capitalistas. Valeu a pena pagar um preço tão alto por tão pouco? E quem se indigna com isto, como Barbosa, é necessariamente um direitista?  

Na semana passada, quando a correspondente de O Estado de S. Paulo em Washington foi detida na Universidade de Yale, houve até quem acusasse triunfalmente Barbosa de haver sido responsável pela ação policial, baseado unicamente em conjeturas. 

Não faz tanto tempo que Barbosa era louvado pela esquerda
Nota da universidade, contudo, esclareceu que Claudia Trevisan, mesmo sabendo que estava proibida a presença de repórteres no seminário do qual Barbosa iria participar, tentou driblar os seguranças. Mas foi pilhada e, quando perguntaram o que fazia naquela ala, mentiu: disse que estava procurando um amigo com o qual marcara encontro.

Ora, sendo os estadunidenses tão paranóicos em relação a atentados terroristas, é de estranhar-se que a tenham prendido e algemado? 

Mesmo cá na  patriamada, infinitamente mais tolerante, em minha atuação jornalística eu sempre evitei recorrer a falsidades para furar tais bloqueios. Nunca os aceitei passivamente, mas utilizava estratagemas como o de buscar atalhos que não passassem por portarias ou o de empinar o nariz e entrar com ares de poucos amigos, como se fosse uma autoridade com todo direito de estar lá. 

Às vezes os porteiros e seguranças se deixavam intimidar e não questionavam a minha presença; quando, contudo, algum o fazia, eu revelava honestamente o meu propósito e acatava numa boa o convite para me retirar. 

Enfim, foi chato o constrangimento imposto à Trevisan, mas Barbosa não teve absolutamente nada a ver com isso. E, claro, a suspeição injusta repercutiu muito mais na internet do que a verdade do fato.

De Barbosa, sempre me lembrarei primeiramente de ele haver resistido com unhas e dentes aos inquisidores no Caso Battisti, posicionando-se contra a extradição em todas as votações.

Este sim era um caso que opunha, nitidamente, a direita e a esquerda --e Barbosa não teve dúvidas em colocar-se ao nosso lado.

No processo do  mensalão, nem de longe existe tal nitidez. E é uma covardia a desqualificação de Barbosa, extrapolando todos os limites do razoável e do verossímil. 

Eu não me omito: tenho a coragem de confrontar todos e quaisquer rolos compressores, sempre que eles estiverem destruindo reputações levianamente.