Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 22 de dezembro de 2013

Racismo desvaloriza festas baianas, diz antropólogo

Domingo, 22 de dezembro de 2013
Deu no jornal A Tarde (Bahia)

Ordep Serra é autor do livro "Rumores de Festa", sobre manifestações festivas, incluindo o Carnaval
Doutor em antropologia e professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Ordep Serra é autor de Rumores de Festa, um estudo sobre manifestações festivas, incluindo o Carnaval.

Para ele, a Bahia está perdendo, a cada ano, um capital cultural significativo ao não dar a atenção devida a esses eventos e mais: alimentando o que considera um descaso com suas raízes também na desigualdade racial. "Esse descaso chega a ser criminoso", diz Serra.

O seu livro Rumores de Festa é um dos poucos trabalhos sobre o conjunto das festas populares baianas. Por que a antropologia ainda fala pouco das festas?
Realmente, a gente ainda precisa dar mais atenção a essas manifestações, que são extremamente ricas. Esse é um campo aberto para os antropólogos.

As festas têm um papel importante no cotidiano da capital baiana. Até o Carnaval, são pelo menos dez.
Sim. O que me impressiona é como esse capital cultural, que é extremamente valioso, não é aproveitado de forma correta. Aliás, é ainda pior: ele consegue ser maltratado pelos gestores públicos numa demonstração de burrice impressionante. Imagine o que poderia render para a cidade a atenção, por exemplo, a uma economia que é muito própria dessas festas. Imagine o que se poderia lucrar com o incentivo a atividades como venda de produtos e de comida, para dar um exemplo.

Em relação ao aspecto da economia dessas festas, em seu livro o senhor critica a padronização das barracas.
Pois é. É uma das amostras do abandono destas manifestações. As barracas tinham um papel fundamental, inclusive do ponto de vista estético, pois mostravam o exercício da criatividade do povo. Elas tinham nomes de orixás, de caboclos e funcionavam também como ponto de encontro para vários grupos. Ocupavam um lugar muito especial no contexto das festas, como reforçar laços de fidelidade com a clientela. Mas, em nome de questões que poderiam ser tratadas de outra forma, como saúde pública, acabaram com tudo, fizeram monstros horrendos por meio da padronização. Pregam questões de saúde, mas, por outro lado, recebem patrocínio em massa da indústria de bebida para fazer eventos. É essa a educação para a saúde?