Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Ser bom vassalo, o que é? É voltar as costas ao Snowden.

Sexta, 20 de dezembro de 2013
Por Celso Lungaretti
Deu na imprensa: Thomas Shannon, assessor especial do secretário de Estado John Kerry, qualificou de "positiva" a decisão do governo brasileiro, de desconsiderar o pedido de asilo de Edward Snowden e a sua disposição de ajudar-nos a combater a arapongagem estadunidense, expressos na Carta ao povo do Brasil.
"Há vários sinais positivos emitidos pelo governo brasileiro, (...) chegamos a um bom ponto", acrescentou Shannon.

Realmente, o governo brasileiro agiu com sabedoria. Aquela sabedoria sobre a qual discorreu o grande Brecht:

"Nos livros antigos está escrito o que é a sabedoria: 
manter-se afastado dos problemas do mundo e sem medo passar o tempo que se tem para viver na terra; 
seguir seu caminho sem violência,
pagar o mal com o bem,
não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.
Sabedoria é isso!"
Só faltou o verso seguinte: "Mas, eu não consigo agir assim!".
E,  por falar em Brecht e brechtianos, ocorreu-me também que a situação presente tem tudo a ver com o trecho abaixo da magistral peça Arena conta Tiradentes, que é de 1968 mas continua atualíssima:

CORINGA
Ser bom vassalo o que é?
Me responda quem souber.
CORO
Ser bom vassalo é esquecer
aquilo que a gente quer.
Ser bom vassalo é morrer.
Ser bom vassalo, quem quer?
Me responda quem quiser.
CORINGA
Só quer ser um bom vassalo,
quem vive seu bom viver,
quem explora e não é explorado,
quem tem tudo pra perder!
Em tempos idos, os bons vassalos defendiam apenas seus privilégios. Agora a coisa piorou: até os que deveriam ser contra os privilégios acabam se tornando bons vassalos, pois temem que a governabilidade seja prejudicada se entrarem em atrito com o suserano. 
Uma característica, contudo, permanece imutável: ser bom vassalo é esquecer aquilo que a gente quer. Aquilo pelo que um dia lutamos. Aquilo em nome do qual companheiros estimados morreram e sofreram.
Por último, a boa notícia (uma, pelo menos!): o texto integral de Arena conta Tiradentes acaba de ser disponibilizado neste endereço. Recomendo enfaticamente.

Para quem quiser saber mais sobre a peça, eis alguns links: primeiro, segundo, terceiro e quarto.