Segunda, 13 de janeiro de 2014
Do STJ
A criança não pode ser penalizada pelas
condutas, mesmo que irregulares, dos pais. Com esse entendimento, o
ministro Luis Felipe Salomão determinou a adoção da criança registrada
como filha pelo pai que teria “alugado a barriga” da mãe biológica.
A
criança havia sido registrada como filha do “pai de aluguel” e da mãe
biológica, uma prostituta. Desde os sete meses de idade, ela convivia
com o pai registral e sua esposa, que não tinha condições de engravidar.
O Ministério Público paranaense (MPPR) apontou ter havido
negociação da gravidez aos sete meses de gestação e moveu ação para
decretar a perda do poder familiar da mãe biológica e anular o registro
de paternidade. A justiça do Paraná deu provimento à ação e determinou a
busca e apreensão da criança menor de cinco anos, que deveria ser
levada a abrigo e submetida à adoção regular.
Interesse da criança
Para
o ministro Salomão, a determinação da Justiça paranaense passa longe da
principal questão em debate: o melhor interesse da criança. “De fato,
se a criança vem sendo criada com amor e se cabe ao Estado, ao mesmo
tempo, assegurar seus direitos, o deferimento da adoção é medida que se
impõe”, afirmou.
Conforme o ministro, a adoção de crianças
envolve interesses de diversos envolvidos: dos adotantes, da sociedade
em geral, do Ministério Público, dos menores. Mas como o tema envolve o
próprio direito de filiação, com consequências para toda a vida do
indivíduo, deve prevalecer sempre o interesse do menor.
Vínculo afetivo
Ele
destacou que a criança vive pacificamente com o pai registral desde os
sete meses de vida. Contando agora com quase cinco anos, impedir a
adoção iria retirar dela o direito à proteção integral e à convivência
familiar.
O ministro Salomão afirmou que, caso fosse seguida a
decisão paranaense, a criança seria retirada do lar onde recebe cuidados
do pai registral e esposa e transferida a um abrigo, sem nenhuma
garantia de conseguir recolocação em uma família substituta. Além disso,
passaria por traumas emocionais decorrentes da ruptura abrupta do
vínculo afetivo já existente.
Ainda conforme o ministro, o
tribunal paranaense afastou o vínculo afetivo apenas porque o tempo de
convivência seria pequeno, de pouco mais de dois anos à época da
decisão.
Conduta irregular
“Ainda que
toda a conduta do recorrente tenha sido inapropriada, somado ao fato de
que caberia a ele se inscrever regularmente nos cadastros de adoção,
nota-se, ainda assim, que tal atitude inadequada do recorrente não pode
ter o condão de prejudicar o interesse do menor de maneira tão drástica,
e nem de longe pode ser comparada com subtração de crianças, como
apontado pela sentença”, ponderou o ministro.
“Na verdade, a
questão foi resolvida praticamente com enfoque na conduta dos pais (a
mãe biológica e o pai registral), enquanto o interesse do menor foi
visivelmente colocado em segundo plano”, completou.
Má-fé
De
acordo com os depoimentos dos envolvidos, a má-fé vislumbrada pela
Justiça do Paraná consistiu apenas no pagamento de medicamentos e
alugueis pelo pai registral à mãe biológica, que não estava em condições
de trabalhar. Não houve reconhecimento de ajuda financeira direta.
Ele
destacou ainda que não se trata de aceitar a “adoção à brasileira”,
informal, mas de analisar a questão do ponto de vista do interesse real
da criança.
A decisão do ministro ocorreu em recurso especial do
pai, é individual e foi tomada na última quinta-feira (9), durante o
plantão judicial.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.