Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Semeadura e colheita

Quarta, 15 de janeiro de 2014

Por Ivan de Carvalho
      Noticia-se que o PT acabou ficando mais murcho do que de início pareceu com os efeitos realizados e os eventuais efeitos futuros de seu ataque à dupla de opositores formada por Eduardo Campos e Marina Silva. O ataque foi no velho estilo da ofensa, da tentativa de desconstruir, desmoralizar e ridicularizar e foi feito mediante editorial no site oficial do PT na Internet.
      Como esse ataque já foi bastante divulgado, creio que vale lembrar apenas que Campos, ex-ministro do governo Lula, atual governador de Pernambuco, presidente nacional do PSB e aspirante à presidência da República em oposição à tentativa de reeleição da petista Dilma Rousseff foi chamado de “tolo” e de “playboy mimado”. Não faço a menor idéia dos fundamentos que levaram o PT ter dele tal juízo.
      Recorda-se, até, que o PT e o próprio Lula andavam tentando iludir Eduardo Campos – que começava a fazer discretos movimentos para tentar viabilizar sua candidatura a presidente em 2014 – com o aceno de que, após o eventual segundo mandato de Dilma Rousseff, o presidente do PSB seria o nome ideal para presidente da República. Isto significaria que nas eleições de 2018 ele deveria ser o melhor candidato para o PT apoiar, embora não fosse do PT.
      Foi aí exatamente que Campos mostrou que não é tolo. Não acreditou na conversa (seu avô, Miguel Arraes, era um político esperto e especialmente desconfiado), não se deixou enganar e então o editorial publicado no site do PT o rotulou precisamente daquilo que este partido desejava que ele fosse e ele provara que não é – tolo. Seria tolo se acreditasse que o PT, estando no comando do governo federal, abrisse mão de seu projeto de poder em 2018 para apoiar alguém de outro partido para presidente da República.
      Se a decepção do PT com a eficácia do desconfiômetro do neto de Arraes explica o qualificativo (ou desqualificativo) de tolo (uma espécie de vingança de menino malcriado), não existe até agora explicação para o xingamento de “playboy mimado”. Então Lula colocara em seu ministério um “playboy mimado”, além de um “tolo” e ainda acenara com um futuro apoio do PT a esse indivíduo para colocá-lo na Presidência da República. Uma coisa totalmente sem sentido.
      Quanto à ex-senadora Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente do governo Lula e ex-candidata a presidente da República pelo PV em 2010, quando surpreendeu ao obter estonteantes 20 milhões de votos, ficando em terceiro lugar e forçando a realização de segundo turno entre Dilma Rousseff e José Serra, foi chamado no tal editorial de “ovo da serpente”.
      Agora estão aí arrependidos com a péssima repercussão do editorial e os “desqualificativos” constantes do editorial e aqui citados desapareceram do site do PT. Em um primeiro momento da reação desfavorável nas redes sociais e na opinião pública, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, tentou levar o problema com uma conversa de “cerca lourenço”, mas depois se viu que não dava. O ataque atabalhoado – um tanto no estilo Irmãos Petralha – a Campos e Marina virou-se contra o próprio PT, pois as vítimas resolveram dar trela, comentar nas redes, chamar a atenção para os termos do editorial, expondo-os no absurdo vazio que representam.
      E o comando petista parece ter se preocupado ainda com os humores do “ovo da serpente”, pois temem que Marina Silva seja impulsionada por esse ataque (e eventualmente outros desse tipo, em outros espaços e ocasiões) a alterar a linha que vem seguindo de trabalhar pela manutenção de certa distância entre o PSB/Rede e o PSDB, o que poderia refletir-se já no primeiro turno das eleições, nas eleições estaduais e na de presidente da República, e também no segundo turno. Pode ser que ela nem faça isso, essa revisão, mas o comando petista está preocupado e, como chegou-se a noticiar ontem, pensa até em pedir desculpas, não a Campos, mas a Marina. A natureza e a física ensinam que toda causa gera um efeito – ou mais de um. A Bíblia ensina que “tudo que semeares, certamente colherás”. O PT plantou seu editorial, agora faz a colheita.

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A colheita para descascar
Imagem da internet
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.