Companheiros e Companheiras,
O ano de 2014
começou marcado por importantes lutas sindicais, populares e juvenis. O PSOL é
um protagonista importante nestes embates e este processo também deve se
refletir nas eleições de outubro. Nosso desafio é imenso pois as jornadas de
junho mostraram, por um lado, o espaço existente para uma candidatura que seja
a negação da velha política, e, ao mesmo tempo, a carência de referências que
encarnem esta proposta nova.
Eu e o Senador Randolfe Rodrigues disputamos a indicação para encabeçar a
disputa presidencial nestas eleições. Todos sabem que temos diferenças
políticas. Neste momento, acredito, é preciso fortalecer a unidade do PSOL, o
que não significa escamotear as diferenças, mas sim buscar o que nos une e
aprofundar o debate político.
Nossa unidade está ancorada no enfrentamento ao governo Dilma e à velha
direita, e na afirmação da necessidade de construir uma alternativa pela
esquerda. Esta luta vem sendo travada pela bancada o PSOL na Câmara e no
Senado, com Randolfe, Chico, Jean Wyllys e Ivan. No Rio de Janeiro o deputado Marcelo
Freixo é uma referência que orgulha a todo o partido, assim como Giannazi em
São Paulo, Estado onde tivemos ainda uma grande conquista, a filiação e
possível candidatura do companheiro Vladimir Safatle, e nossos vereadores
espalhados pelo Brasil. Esta luta foi e está sendo travada por todos os
militantes do partido que estiverem nas jornadas de junho e que seguem agora
nas mobilizações, como na já histórica greve dos rodoviários de Porto Alegre.
Na disputa presidencial vamos dar continuidade a este enfrentamento que fazemos
todos os dias, com a autoridade política de um partido que está presente em
todas as lutas e que, no parlamento, está sempre apresentando propostas e
denunciando os ataques aos interesses populares. É com este espírito que estou
disposta a ser candidata a vice- presidente na chapa com o companheiro
Randolfe.
Considero que a minha missão nesta chapa será ajudar a defender idéias que
possam credenciar o PSOL diante do novo momento político que se abriu após as
jornadas de junho. Vamos construir a unidade na diversidade para fortalecer o
PSOL e uni-lo no enfrentamento às demais candidaturas que representam a
continuidade deste modelo político e econômico cada vez mais questionado pelo
povo.
Agora precisamos intensificar o debate partidário sobre o programa que
defenderemos nas eleições. Eu e a companheira Maninha, do DF, estaremos
coordenando o processo de elaboração do nosso programa de governo, construindo
os seminários que debaterão os temas essenciais. Apresento a todos, no texto anexo,
alguns temas que considero fundamentais para que o PSOL demarque sua posição
anticapitalista e contrária a este regime político elitizado e apodrecido.
Vamos ao debate político, pois só assim o PSOL vai avançar, e é isso que todos
nós queremos.
Um abraço!
Luciana Genro.
PROPOSTAS PARA
O DEBATE DE PROGRAMA DO PSOL
Primeiro tema:
Economia
O PSOL não é um partido socialista só no nome.
Um governo do PSOL promoverá mudanças estruturais na economia do país, mudanças
imprescindíveis que funcionarão como uma ponte de transição para uma economia
que não seja regida pela mercadoria, pelo lucro e assentada na extração de mais
valia da classe trabalhadora. O Brasil (e o mundo) vive uma crise
sócio-ambiental que está vinculada ao modo de produção capitalista. A destruição
da natureza e a degradação do meio ambiente é diretamente proporcional à
crueldade do capitalismo em relação aos oprimidos e explorados por este
sistema. Nossa proposta é ecossocialista pois não há defesa conseqüente do meio
ambiente sem que se aponte para a ruptura com o capital, que necessita sugar os
recursos naturais e explorar o ser humano para garantir a acumulação em
benefício de 1% da população, enquanto 99% sofre as consequências nefastas
deste modelo econômico.
1. Os mercados não mandarão mais no Brasil: auditoria e suspensão do pagamento
da dívida pública
O Brasil precisa conquistar uma verdadeira soberania, isto é, realizar a sua
própria vontade, independente dos interesses alheios. Hoje estamos subjugados
pelos interesses do capital financeiro. Demonstração clara desta submissão é a
recusa do governo federal em cumprir o acordo, já bastante insuficiente, feito
com governadores para renegociar os contratos das dívidas estaduais, devido às
“turbulências do mercado”. Isto é assim pois o atual momento da acumulação
capitalista está ancorado na financeirização da economia, que se baseia no
“Sistema da Dívida” : dívida pública que foi gerada sem contrapartida a partir
de empréstimos vinculados a compra de produtos e serviços dos países concedentes
destinados a projetos desnecessários e/ou super faturados . A partir daí
ocorreu a auto geração de endividamento pela obrigação de amortizar o capital e
pagar os juros.( Fattorelli, Maria Lúcia. Auditoria Cidadã da Dívida Pública-
Experiências e Métodos. 2013.) Somente uma auditoria independente, precedida da
suspensão do pagamento, pode desmascarar este processo. O exemplo do Equador é
eloqüente.
Nossa luta imediata será para que a economia do Brasil não siga amarrada aos
interesses do grande capital financeiro. É necessário o fim da
desregulamentação da economia e da abertura financeira e comercial
irresponsável, bem como a implementação de um rígido controle de capitais para
inibir a especulação.
Medidas concretas deverão garantir que os recursos públicos sejam utilizados
para melhorar a saúde, a educação e o transporte público e não mais para pagar
a dívida pública e sustentar o parasitismo dos bancos.
2.Combate à concentração de riqueza
No mundo, 85 fortunas mundiais acumulam a mesma riqueza que 3,5 bilhões de
pessoas. No Brasil não é diferente. As cinco mil famílias mais ricas concentram
a maior parte da riqueza produzida, e ainda recebem dinheiro do governo,
através dos juros da dívida. Este processo será estancado com o enfrentamento
do problema da dívida, mas para ser revertido é preciso avançar numa reforma
tributária radical.
Reinaldo Gonçalves em seu livro “Desenvolvimento às avessas – Verdade, má fé e
ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento” ( Editora LTC, 2013)
elenca medidas que vão ao encontro do que propus, como representante do PSOL na
Comissão Parlamentar que estudou a Reforma Tributária:
“Inúmeras medidas devem ser tomadas. A primeira é mudar a estrutura tributária,
de regressiva para progressiva; a modificação substantiva do sistema de
alíquotas é fundamental, de forma que os ricos paguem proporcionalmente mais
impostos do que a classe média e os pobres. É inadmissível que sobre os
rendimentos do trabalho da classe média incida a mesma alíquota que incide
sobre os rendimentos do trabalho dos ricos. É necessária a desoneração
tributária que incide diretamente sobre a renda dos pobres e da classe média. A
segunda consiste em eliminar boa parte das medidas de desoneração, seja da
folha de pagamento, seja a redução de IPI, principalmente de setores de bens de
consumo duráveis e dos setores em que há baixa concorrência. A terceira
consiste em fazer com que a tributação sobre os rendimentos do capital seja
maior que a tributação sobre os rendimentos do trabalho. A quarta envolve a maior
taxação do estoque de riqueza dos ricos. A quinta trata de eliminar subsídios
em financiamentos para projetos de investimento de grandes empresas e grupos
econômicos. A sexta é acabar com o financiamento, com recursos públicos para
empresas estrangeiras que operam no país. Por fim, a oitava medida requer maior
tributação do setor primário, inclusivo com impostos específicos sobre a
exportação.” ( Pags. 174, 175)
O Imposto sobre as Grandes Fortunas – uma medida que consta na Constituição
desde 1988 e até hoje não foi regulamentada, embora um projeto meu tenha sido
aprovado na Comissão de Constituição e Justiça – deve ser uma fonte de recursos
e de justiça, pois o 1% dos milionários tem que ceder aos 99% da sociedade.
Aumentando a tributação sobre a riqueza e a propriedade poderemos baixar os
impostos sobre o salário e o consumo, beneficiando os mais pobres, os
trabalhadores, os pequenos comerciantes, os profissionais liberais, enfim, os
que hoje sustentam o parasitismo de poucos.
Medidas como o Bolsa-Família precisam estar acompanhadas destas transformações
estruturais pois isoladas são meramente paliativas e insuficientes para
assegurar a vida digna que todos merecem.
3.Controle
público das áreas estratégicas, dinheiro público para servir ao povo e não às empreiteiras
Nosso programa também deve ser taxativo na defesa da soberania nacional e,
portanto, do controle público das áreas estratégicas, como a energia. Neste
tema são sábias as palavras do geólogo e ex- diretor de exploração e produção
da Petrobrás, Guilherme Estrella, que alerta que a gestão de reservas de Libra
deve ser exclusiva do Estado:
“Energia é fator crítico da soberania e do desenvolvimento de qualquer país.
Há, portanto, um potencial conflito de interesses geopolíticos absolutamente
inerente à presença de estrangeiros numa gigantesca reserva petrolífera como é
Libra.(…) Trata-se de gigantesco volume de petróleo, agora compartilhado com
sócios que representam interesses estrangeiros – de potências estrangeiras-
sobre cujo alinhamento com o posicionamento geopolítico de um país emergente da
importância do Brasil não temos a menor garantia.” (Folha de SP, 28/10/2013.
Pág. A14)
Também defendemos uma mudança na política de financiamento do BNDES. Não podem
mais ser concedidos empréstimos do BNDES para grandes empreiteiras e mega
empresas que têm capital próprio ou acesso a empréstimos internacionais. A
prioridade tem que ser estabelecida de acordo com os interesses nacionais e não
de um punhado de empresas privadas. Daremos fim às privatizações e terceirizações
abusivas, fortalecendo o Estado, qualificando e pagando bem os servidores
públicos, para prestar serviços de qualidade. Além disso, faremos uma auditoria
nas obras da Copa, pra identificar desvios de dinheiro, desperdícios e abusos.
Segundo tema:
Regime político
Estas
instituições não nos representam. Queremos democracia real
Não aceitamos a
idéia de que a conquista do poder pela classe trabalhadora é uma
impossibilidade e que, portanto, a única saída é uma limitação gradual da
exploração capitalista e a expansão do controle social. Para nós o objetivo da
luta por reformas é buscar a melhoria da situação material dos trabalhadores,
porém, ela deve estar encadeada com a preparação da classe trabalhadora como
fator subjetivo da transformação socialista. Não defendemos reformas
simplesmente para limitar a exploração, e sabemos que elas não possibilitam
remover ou atenuar o caráter capitalista da sociedade. Por isso, ao defender e
lutar por reformas, buscamos apontar também a necessidade do povo tomar a
política, e o país, em suas próprias mãos.
Neste sentido temos que questionar a própria institucionalidade, que é burguesa
pois as instituições estão à serviço da manutenção do status quo, isto é, da
burguesia como classe dominante. Nosso programa tem que partir da definição de
que as instituições da democracia burguesa não respondem aos interesses da
maioria do povo e nem aos interesses do Brasil enquanto uma Nação soberana. São
instituições capturadas pelo poder econômico, corroídas pela corrupção e pela
impunidade e distanciadas de uma representação legítima da população. Os
processos eleitorais, instrumento de legitimação dos governantes, constituem-se
em grandes espetáculos de marketing, de enganação e falsas promessas. O poder
econômico é determinante, o qual deixa apenas pequenas brechas por onde
eventualmente a genuína vontade popular consegue passar.
1.Combate à
corrupção
A corrupção, mecanismo perverso de transferência dos recursos públicos para
mãos privadas, é um instrumento fundamental através do qual as elites
econômicas e políticas colocam o Estado a serviço dos seus interesses. Isto
ocorre a partir de vários mecanismos. Pela via mais rebaixada não faltam
exemplos. Verdadeiras quadrilhas assaltam os cofres públicos. Temos o exemplo
da quadrilha petista do mensalão, assim como a versão original, do PSDB. Neste
contexto, a corrupção aparece como uma das formas mais eloquentes da falta de
controle social do Estado.
Por isso defendemos a implementação de mecanismos democráticos que possibilitem
à população um rígido controle sobre os agentes públicos. Um Estado forte no
sentido de oferecer serviços públicos e controlar as áreas estratégicas, mas ao
mesmo tempo fraco no sentido de estar submetido ao controle popular e não
dominado por uma burocracia alheia ao povo.
A luta contra a corrupção também serve de ligação entre os diversos setores
sociais que defendem suas bandeiras específicas, mas que podem encontrar-se em
uma luta comum contra a impunidade e o assalto aos cofres públicos. Cabe à nós
demonstrar a ligação dos escândalos, que diariamente enojam a população, com o
sistema político capitalista, sua essência antidemocrática, injusta e
excludente.
Cabe também ao PSOL lutar para credenciar-se diante do povo como o partido que
não faz parte do “esquema”, que denuncia e persegue implacavelmente os
corruptos, que não aceita a impunidade e a banalização da corrupção. Não
podemos aceitar a lógica do “são todos iguais” e para que a população consiga
nos distinguir neste mar de lama que a mantém descrente de uma saída, é preciso
que sejamos sempre os primeiros e os mais implacáveis nesta luta.
2.Governabilidade
construída com o povo mobilizado
Há também a corrupção legalizada que ocorre todos os dias aos olhos de todos. Vamos acabar com o balcão de negócios no Congresso. Quando não se quer atender aos anseios do povo, se governa com as elites, por meio do eterno “toma lá dá cá”, e é por isso que o Governo Lula/Dilma sempre defendeu os Presidentes do Senado Renan Calheiros e José Sarney. Tudo para garantir a “governabilidade”, ou seja, para que os projetos nocivos ao povo possam continuar sendo aprovados sistematicamente no Congresso Nacional, a exemplo da Reforma da Previdência, comprada com o “Mensalão”.
Há também a corrupção legalizada que ocorre todos os dias aos olhos de todos. Vamos acabar com o balcão de negócios no Congresso. Quando não se quer atender aos anseios do povo, se governa com as elites, por meio do eterno “toma lá dá cá”, e é por isso que o Governo Lula/Dilma sempre defendeu os Presidentes do Senado Renan Calheiros e José Sarney. Tudo para garantir a “governabilidade”, ou seja, para que os projetos nocivos ao povo possam continuar sendo aprovados sistematicamente no Congresso Nacional, a exemplo da Reforma da Previdência, comprada com o “Mensalão”.
Nosso modelo de governabilidade é outro, ancorado na mobilização do povo para
garantir as mudanças e o enfrentamento aos interesses das elites econômicas.
Por isso não entramos no jogo das alianças espúrias, jamais apontaremos os
inimigos do povo como aliados, como faz o PT, sustentando as oligarquias mais podres,
como a família Sarney no Maranhão.
3.Reorganizar o
Brasil
Se a mudança na lógica econômica que coloca o país de joelhos perante o mercado
financeiro e o grande capital é fundamental para a construção de uma democracia
real, não menos importantes são as mudanças na estrutura política. É preciso
reorganizar o país através de uma Assembléia Popular Constituinte, exclusiva,
com plenos poderes, com deputados que possam ser eleitos inclusive sem partido,
em uma eleição sem interferência do poder econômico. Nesta Assembléia Popular
Constituinte vamos lutar por medidas radicais, que enfrentem os problemas do
Brasil pela raiz.
A tarefa será colocar abaixo as instituições apodrecidas e vazias de
representatividade construindo novas, que possam de verdade ser permeáveis à
vontade popular. Criar mecanismos de democracia direta, que permitam ao povo
tomar a política e a economia em suas próprias mãos, para colocá-las a serviço
dos interesses da maioria. A revogabilidade dos mandatos dos políticos, a
exemplo do referendo revogatório existente na Venezuela, é um instrumento
fundamental na construção de uma viva e participativa democracia.
Uma reforma política real tem que interferir no cerne do que tem feito da
política uma carreira e um grande negócio. Alguns exemplos: salários dos
políticos decididos pelos povo e não pelos próprios políticos; diminuição dos
cargos de confiança e valorização dos funcionários concursados; nada de
privilégios como carros oficiais ou aposentadorias especiais; igualdade no
tempo de propaganda política e o fim da venda do tempo de TV através das
coligações; fim do financiamento das campanhas pelas empresas privadas; fim da
compra de votos através da contratação de cabos eleitorais pagos, dentre outras
medidas que democratizem a política.
Nesta reorganização do Brasil precisamos promover mudanças legais que permitam
maior controle social sobre as instituições e os agentes políticos, como o fim
dos sigilos, fim da permissão aos agentes políticos de fazerem negócios na
esfera privada, parlamento unicameral, fim da impunidade aos criminosos do
colarinho branco ( os presos do mensalão são a exceção que confirma a regra),
enquanto os presídios estão abarrotados de pobres.
Neste contexto a luta contra a corrupção se reveste de um conteúdo radical, pois
vivemos em uma sociedade em que a política é abertamente um balcão de negócios,
e as bandeiras democráticas, como a luta contra a corrupção e a impunidade,
ficaram nas mãos dos socialistas, pois nenhum outro setor é consequente na sua
defesa.
4- A política de repressão às drogas e a criminalização da pobreza.
O Brasil é o quarto país do mundo em população carcerária, atrás apenas dos
EUA, Rússia e China. Levantamento feito pelo Instituto Avante Brasil, com dados
do InfoPen, do Ministério da Justiça, apontou um crescimento de 508,8% na
população carcerária brasileira no período de 1990 a 2012, registrando 548.003
presos em 2012, uma taxa de 287,31 para cada 100 mil habitantes, em uma
população de 190.732.694 habitantes, de acordo com o IBGE.
Esse crescimento foi muito maior, por exemplo, que a taxa de crescimento da
população nacional, que não passou de 30%. Ou seja, enquanto a população
cresceu 1/3, a população carcerária mais que sextuplicou. O déficit é de mais
de 100 mil vagas.
E quem são estes presos? No ano de 2012 os pardos e negros eram ampla maioria.
43,7% de presença dos pardos e 17% de negros. Também era maioria os que tem o
Ensino Fundamental Incompleto, 50,5%. Dos demais, 14% eram apenas alfabetizados
e 6,1% analfabetos. Os jovens também eram maioria: Quase 30% tinha entre 18 e
24 anos e 25,3% entre 25 e 29 anos. A maioria cometeu crimes contra o
patrimônio e/ou tráfico de drogas. Podemos sintetizar o perfil do preso assim:
homem pardo ou negro, com idade entre 18 e 29 anos, com ensino fundamental
incompleto , preso por roubo ou tráfico.
Para exemplificar o ritmo de agravamento desta realidade podemos apontar que há
um crescimento significativo de mulheres presas por envolvimento no tráfico de
drogas. Entre 2007 e 2012 o Estado do Rio Grande do Sul registrou aumento de
66% da população carcerária feminina. No Brasil, no mesmo período, o
crescimento foi de 36% . Em São Paulo, 40% dos jovens internados estão
envolvidos com o tráfico de drogas, segundo dados da Fundação Casa .O Rio
Grande do Sul também responde perante a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos devido à situação de super lotação e precariedade do Presídio Central.
Neste contexto o comércio ilícito de entorpecentes aparece em segundo lugar de
incidência ( atrás dos crimes patrimoniais) atingindo 24,43% da população
carcerária em geral, e no que diz respeito à população carcerária feminina, é a
principal causa de encarceramento, atingido 49,65% das presas .
Conforme Loic Wacquant, o sistema penal hipertrofiado tem “um lugar central no
aparato emergente para a gestão da pobreza” (Wacquant, Loic. As prisões da
Miséria. Rio de janeiro: Zahar, 2011. Pág. 22 ). Nossa campanha presidencial
não pode calar sobre este grave problema prisional, que é também de direitos
humanos e de segurança pública. É preciso apresentar um conjunto de propostas
que comece apontando para o fim da chamada “ guerra às drogas”. O mandato do
vereador Renato Cinco, do Rio de Janeiro, tem um acumulo importante neste
terreno que deve ser apropriado pela nossa campanha.
Em uma palestra recente, Noam Chomsky chamou a atenção para o fato de que a
guerra às drogas é uma herança do racismo. Os avanços conquistados nos EUA nos
anos 50/60 em relação aos direitos civis dos negros sofreram um revés nos anos
70, justamente devido ao discurso da guerra às drogas que permitiram uma contra
ofensiva racista de ataque aos direitos dos negros e pobres.
No Brasil também a guerra às drogas é hoje o mais poderoso instrumento de
criminalização da pobreza e de instigação ao racismo. Este fato pode ser
percebido claramente no recente episódio da repressão ao tráfico na
cracolândia, em São Paulo, onde os dependentes foram brutalmente atacados pela
polícia de Alckmin, em nome da repressão ao tráfico. A morte de Amarildo,
dentre tantos outros, também é resultado da guerra às drogas. Ela legitima a
violência e as violações aos direitos humanos cometidas pelo próprio Estado
contra os pobres, normalizando as mortes dos traficantes, ou dos supostos
traficantes.
E nos presídios, lugar reservado aos descartáveis, reina a barbárie, como vimos
de forma mais aguda no Maranhão, Estado governado há décadas pela família
Sarney, à qual o PT deu fôlego ao chegar no poder. A sociedade se chocou com a
violência em Pedrinhas, mas é hora de refletir por que se chegou a este
extremo. É hora de parar o clamor por encarceramento e aumentar o clamor por
direitos.
Esta “guerra às drogas” também joga os pobres contra os pobres, pois os jovens
sem perspectivas são seduzidos pelo tráfico, tornando-se soldados numa guerra
contra a polícia ( que também é composta por pobres) e contra outros jovens da
favela ao lado, na disputa pelos pontos de tráfico. É o roto contra o
esfarrapado.
Está cada vez mais evidente que os efeitos negativos agregados da
criminalização e do proibicionismo são muito superiores às consequências do uso
ou do abuso das drogas ilícitas. Dos 50 mil homicídios dolosos anuais, grande
parte relaciona-se ao tráfico de drogas, seja fruto das disputas entre os
traficantes, seja do enfrentamento da polícia com os mesmos. E há, ainda, os
mortos “por engano”. Sabe-se também que a corrupção policial é alimentada pelas
oportunidades de negócios ilícitos que o comércio clandestino propicia. E ainda
há que somar os custos financeiros e humanos impostos pelo sistema penitenciário,
assim como os gastos com as instituições de segurança e de justiça criminal,
cujas energias são em boa parte consumidas com essa vasta problemática.
Salo de Carvalho explica ainda que existe uma falsa imagem de que o direito
penal e o processo criminalizador podem ser instrumentos eficazes no controle
ou erradicação do consumo de drogas e que esta falsa imagem deriva de uma visão
equivocada do fenômeno das drogas. Nesta ótica haveria um vínculo indissolúvel
entre consumo e dependência, uma irreversibilidade desta dependência , uma
necessária subcultura criminal formada pelos usuários e ainda a convicção de
que o usuário não tem condições de ter uma vida produtiva. Os estudos
criminológicos, entretanto, tem desconstituído esta imagem, sobretudo demonstrando
ser falsa conexão entre usuários e toxicômanos e ainda entre usuários e
subculturas criminais. (Carvalho, Salo de. A Política Criminal de drogas no
Brasil. São Paulo: Saraiva, 2013. Pág.237-238)
Luís Eduardo Soares argumenta ainda que está evidenciado que não há eficácia
prática na proibição. O acesso de consumidores potenciais às drogas continua
sendo uma realidade inabalável, ao longo das últimas décadas, apesar das
políticas repressivas, independentemente do volume de dinheiro investido (ou
perdido) nessa guerra e da qualidade das polícias mobilizadas. O acesso não é
afetado pela proibição. Por isso, flexibilizações legais não importam em
expressiva mudança na demanda.
Contudo, mesmo que as mudanças fossem significativas, esse fato não justificaria a intervenção do Estado no domínio da liberdade individual ou das escolhas privadas, desde que elas não violem direitos alheios. (Resumo dos argumentos apresentados por Luís Eduardo Soares em palestra na abertura da conferência que celebrou os 58 anos da FIOCRUZ, em 10 de setembro de 2012, intitulada “Contra a drogafobia e o proibicionismo: dissipação, diferença e o curto-circuito da experiência”. )
Contudo, mesmo que as mudanças fossem significativas, esse fato não justificaria a intervenção do Estado no domínio da liberdade individual ou das escolhas privadas, desde que elas não violem direitos alheios. (Resumo dos argumentos apresentados por Luís Eduardo Soares em palestra na abertura da conferência que celebrou os 58 anos da FIOCRUZ, em 10 de setembro de 2012, intitulada “Contra a drogafobia e o proibicionismo: dissipação, diferença e o curto-circuito da experiência”. )
Muito embora insuficiente do ponto de vista da desestruturação do tráfico e de
todas as suas consequências, a descriminalização da maconha é um inegável passo
adiante. Marcelo Niel, médico psiquiatra e psicoterapeuta especializado no
tratamento de dependentes químicos e professor do Departamento de Psiquiatria
da Santa Casa de São Paulo pontua que a discussão sobre a descriminalização
gira em torno principalmente da maconha pois ela é considerada pelos organismos
internacionais de saúde, como uma droga “leve”, pois os prejuízos para quem a
consome são muito menores quando comparados a outras drogas. Ele relata ainda
que a maconha pode ser utilizada de forma bastante eficiente no controle da
dependência do crack. Um estudo realizado pelo Programa de Orientação e
Atendimento a Dependentes (Proad) da Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp) demonstrou que 68% dos dependentes de crack avaliados conseguiram
atingir a abstinência fumando apenas maconha. Evidentemente que o uso da
maconha não é isento de risco pois é uma substância que pode causar dependência
e trazer prejuízos, assim como outras substâncias lícitas, como o álcool, o
café e o cigarro, que causam dependência e danos à saúde. ( http://revistavisaojuridica. uol.com.br/advogados-leis- jurisprudencia/86/ descriminalizacao-das-drogas- do-debate-a-guerra-293295-1. asp)
O Uruguai é o primeiro país da América Latina a legalizar o uso, plantio e venda da maconha. O consumo já não era mais crime há muitos anos e a principal preocupação do governo foi impedir o narcotráfico de seguir dominando o mercado. O Artigo 4º da lei aprovada e promulgada pelo presidente Pepe Mujica estabelece o objetivo da legalização:
O Uruguai é o primeiro país da América Latina a legalizar o uso, plantio e venda da maconha. O consumo já não era mais crime há muitos anos e a principal preocupação do governo foi impedir o narcotráfico de seguir dominando o mercado. O Artigo 4º da lei aprovada e promulgada pelo presidente Pepe Mujica estabelece o objetivo da legalização:
“A presente lei tem por objeto proteger aos habitantes do país dos riscos que
implica o vínculo com o comércio ilegal e o narcotráfico buscando, mediante a
intervenção do Estado atacar as devastadoras conseqüências sanitárias, sociais
e econômicas do uso problemático de substâncias psicoativas, assim como reduzir
a incidência do narcotráfico e o crime organizado”.
Nossa proposta deve ser que o Brasil siga a trilha aberta pelo Uruguai, tomando
o modelo da nova legislação dos nossos hermanos para construir a sua própria
regulamentação em relação ao comércio, plantio e uso da Cannabis Sativa.
Conclusão:
Estes devem ser, em minha opinião, os eixos políticos da nossa campanha, junto
com outras questões fundamentais como a reforma agrária, reforma urbana, fim do
fator previdenciário, aumento do salário mínimo e das aposentadorias, defesa
dos direitos dos homossexuais, dos indígenas, das mulheres, contra o racismo e
todas as formas de discriminação. Não vou aqui desenvolver todas estas
questões, pois creio que temos pessoas altamente credenciadas para contribuir
em cada um destes temas, que não são secundários. Para desenvolver a questão
LGBT, por exemplo, temos a valiosa contribuição do Mandato do Deputado Jean
Wyllys, que é a ponta de lança do PSOL nesta luta. Sobre os problemas
enfrentados pelas mulheres e negros, também caros ao nosso partido, temos
setoriais muito ativas que darão a sua contribuição.
Sabemos que construir as mudanças que propomos não é uma tarefa fácil. Elas
serão resultado de grandes lutas sociais, ou não acontecerão. Por isso não
buscamos atalhos através de alianças oportunistas. Ao mesmo tempo em que não
nos negamos a unidades pontuais em lutas concretas, não semeamos ilusões de que
os políticos de sempre podem ser aliados para governar a favor do povo. Para
que nosso programa possa se realizar é preciso outros Junhos como o de 2013,
junhos com uma direção combativa credenciada e reconhecida perante o povo. Foi
o que faltou desta vez para que uma vitória significativa fosse possível. Mas
se o pessimismo da razão é inevitável, o otimismo da vontade se impõe, pois a
negação é o primeiro passo para a construção do novo. Como escreveu Daniel
Bensaid, vivemos tempos de transição entre o não mais e o ainda não, em que o
antigo não acabou de morrer enquanto o novo pena para nascer.
Nossa tarefa nesta eleição é ser parte deste novo e ajudá-lo a nascer.