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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

URNA ELETRÔNICA: Fiscalização dos programas nas eleições de 2014

Domingo, 21 de setembro de 2014
Por Pedro Antonio Dourado de Rezende
Durante a recente cerimônia de compilação, assinatura e lacração dos programas do sistema eletrônico de votação do TSE para a eleição de outubro próximo, realizada na tarde de 5 de setembro na sede do Tribunal em Brasília, seu presidente declarou à Agência Brasileira de Notícias que “a grande prova da garantia da urna eletrônica se mostra pela quantidade de partidos políticos aqui presentes”.
Apenas o PDT e o PCdoB haviam enviado representantes para participar daquela cerimônia, levando o presidente do Tribunal, ministro Dias Toffoli, a avaliar o motivo dessa pouca representatividade concluindo, na mesma declaração, que “a confiabilidade do sistema é tão grande que não há divergências a esse respeito”.
Data vênia o ministro, é preciso deixar registrado que os representantes do PDT, historicamente o partido político que mais tem se preocupado com os rumos da informatização do processo de votação no Brasil, não avalizam tal conclusão. Se não há divergências aparentes quanto ao sistema que será usado na eleição de 2014, é porque as questões levantadas por esta representação naquela mesma cerimônia, através de petição protocolada na ocasião, ainda não foram satisfatoriamente respondidas pelas autoridades eleitorais.


Direito restrito
O PDT foi a única instituição externa que exerceu, formalmente para esta eleição, o direito de fiscalização assegurado no art. 66 da Lei 9.504/97, cadastrando e enviando técnicos ao TSE para examinar o código fonte dos programas do sistema de votação. Nessa fiscalização, foram encontrados artefatos cuja ocorrência no código examinado causaram espécie a esses técnicos, que pela gravidade das potenciais consequências os relataram por meio da petição TSE nº 23.891, dirigida ao presidente do TSE, com uma cópia encaminhada ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), instituição que representa profissionalmente a advogada do PDT que assinou a petição, Dra. Maria Aparecida Cortiz.
A Dra. Cortiz faz parte da equipe de fiscalização do PDT há mais de dez anos. Foi ela quem descobriu, fiscalizando a eleição de 2012, que é possível que um programa espúrio, não oriundo de tal cerimônia – na qual todos os programas oficiais do sistema de votação devem ser compilados, digitalmente assinados e “lacrados” no TSE –, apareça em urnas oficiais usadas na eleição, tendo passado pela verificação das assinaturas digitais como programa legítimo, durante a também cerimoniosa etapa local de preparação dessas urnas. 
Provas de que isso é possível, e agora explicável como potencial consequência de artefatos encontrados e relatados como vulnerabilidades na petição TSE nº 23.891, foram obtidas de documentos oficiais de fiscalização (logs) na 157ª Zona Eleitoral do Paraná na eleição municipal de 2012, em Londrina. Essas provas foram arroladas nos autos do processo 163.24.2012.6.160157, e também analisadas – quanto a esse possível vínculo de origem – em debate no seminário “Polêmicas Contemporâneas“, da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, em 15/09/2014. 
A Dra. Cortiz esteve presente à cerimônia de compilação, assinatura e lacração dos programas, onde a OAB e o Ministério Público Federal (MPF) também estavam representados. Tanto a OAB, por meio do presidente do seu Conselho Federal, quanto o MPF, por intermédio do Procurador Geral da República, participaram ativamente na cerimônia, assinando documentos e arquivos digitais, cujo formalismo pretende avalizar a integridade dos referidos programas. Porém, sem que ninguém da instituição que representam tenha antes examinado qualquer código fonte.
O direito de examinar o sistema é restrito, pelo art. 66 da Lei 9.504/97, aos partidos políticos e a essas duas instituições – Ordem dos Advogados do Brasil e Ministério Público Federal; assim, na medida em que as autoridades eleitorais retratam a OAB e o MPF como avalistas do processo, seria saudável para a democracia que ambas tomassem esse direito como um dever republicano – mais uma vez descumprido, agora para a eleição de outubro próximo. 
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Pedro Antonio Dourado de Rezende é professor no Departamento de Ciência da Com­putação da Universidade de Brasília, Advanced to Candidacy a PhD pela Universidade da Cali­fórnia em Berkeley, membro do Conselho do Ins­tituto Brasileiro de Política e Direito de In­formática, ex-membro do Conselho da Fundação Softwa­re Livre América Latina e do Comitê Gestor da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-BR); seu site