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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Audiência de custodia, um direito a ser respeitado.

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Sexta, 27 de fevereiro de 2015
Por Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia.

Findos os trabalhos da Comissão da Verdade, concluiu-se que a tortura não faz apenas parte de nossa história recente, mas continua sendo uma prática como método de investigação defendido à luz do dia por significativa parte de agentes da segurança. Ademais é o Brasil o terceiro país que mais encarcera no planeta, sendo uma prática corriqueira a adoção das prisões cautelares que a lei propõe como medida extrema e excepcional.
Como signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) obrigou-se a aplicar de forma imediata as normas referentes ao respeito dos direitos humanos. Essa norma do artigo 7º obriga a apresentação imediata à autoridade judiciária de todas as pessoas custodiadas, não apenas em razão de flagrante, de decreto de prisão preventiva ou de sentença condenatória.
Ora, qual a razão dessa apresentação? Não é incomum a ocorrência de abusos policiais, essa apresentação servirá para que a autoridade judiciária constate a correta identidade da pessoa presa, dar-lhe ciência dos motivos que determinaram sua segregação, a colheita de informações sobre os fatos que geraram essa medida extrema, e diante disso, ouvidos o Ministério Público e a Defesa, decidir sobre a manutenção ou não da prisão, evitando-se desse modo aprisionamentos desnecessários.
Quem pode ser contra essa medida de respeito aos direitos humanos? Certamente que os juízes não podem contrariar seu compromisso de posse de respeitar, cumprir e fazer cumprir a Constituição e as leis do país. Do mesmo modo, o Ministério Público, na condição de Fiscal da Lei, deve ter o interesse na implantação desse direito fundamental. A defesa igualmente deve se interessar na adoção desse mecanismo de proteção aos direitos do preso.
Sendo assim, quem resiste? Aqueles que têm medo de olhar para o outro e se enxergar. Aqueles que trazem dentro de si o “estado policial”, muitas vezes acobertado pela toga. Os que vivem sob o falso estado de direito, mas insistem na suspensão de direitos fundamentais e de suas garantias, e isso acaba por fazer com que no campo do controle social exercido através do sistema penal, a diferença entre democracia e estados totalitários seja quase imperceptível.
Portanto, deve-se escolher entre a coerência de garantir o Estado verdadeiramente de direito, já que nos vivemos numa república democrática, ou permaneceremos coniventes com o arbítrio, a tortura, os flagrantes forjados, fingindo que não estamos vendo.
O compromisso dos juízes é com o respeito às normas e garantias legais e não com a manutenção de um estado policialesco criado à margem das leis. É por essa razão que a Associação de Juízes para a Democracia pugna para que:
a) que seja implantada a realização da referida audiência para todos os casos de prisão, qualquer que seja a natureza e o fundamento da custódia, como determina o Pacto de San Jose da Costa Rica;
b) que se faça constar de todos os mandados de prisão que, quando do respectivo cumprimento, a pessoa presa deva ser imediatamente apresentada ao Juiz de Direito que determinou a custódia ou ao Juiz de Direito competente da Comarca para a hipótese em que o mandado for cumprido em outro espaço territorial de jurisdição.
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