Terça, 31 de março de 2015
Por Auditoria Cidadã da Dívida – artigo de agosto de 2014
1 – A dívida pública está caindo?
MENTIRA. Frequentemente, analistas ligados ao
governo dizem que a chamada “Dívida Líquida/PIB” está caindo, tendo
passado de 60% do PIB ao final de 2002 para 35% do PIB atualmente.
Porém, para calcular a “dívida líquida”, o governo pega a dívida bruta
(sobre a qual o país paga juros altíssimos) e subtrai dela diversos
ativos possuídos pelo país, mas que rendem juros irrisórios, tais como
as reservas internacionais, empréstimos ao BNDES, e até mesmo recursos
do FAT. Caso consideremos a dívida bruta, ela se encontra em mais de 80%
do PIB.
Frequentemente, a imprensa e o governo também divulgam o dado de que a
dívida federal estaria em cerca de R$ 2 trilhões, porém, este dado não
considera os títulos do Tesouro em poder do Banco Central (ou seja, a
dívida do Tesouro com o Banco Central), alegando que seria uma dívida
entre dois entes do próprio governo. O problema é que grande parte
destes títulos em poder do BC são entregues aos bancos, ou seja, isso
representa sim dívida do governo com os bancos, que recebem juros
altíssimos às custas do povo.
Caso consideremos a dívida interna federal total, ela já se encontra em mais de R$ 3 trilhões.
(Fonte: http://www.bcb.gov.br/ftp/NotaEcon/NI201407pfp.zip , quadro 36).
2 – Os gastos com juros da dívida estão caindo?
MENTIRA. Frequentemente, membros do governo dizem
que as taxas de juros estariam caindo, e que com isso os gastos com
juros da dívida estariam caindo também. Porém, conforme mostra o Banco
Central, os juros devidos pela União, Estados e Municípios em 2013 foram
de R$ 248 bilhões, valor bem maior que em 2012 (R$ 213 bilhões).
(Fonte: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/telaCvsSelecionarSeries.paint – Série código 4759)
Além do mais, estes dados do BC não consideram parcelas importantes
da dívida, e também não consideram o pagamento de amortizações
(principal) da dívida. Segundo o Tesouro Nacional, em 2013 o governo
federal gastou R$ 718 bilhões com juros e amortizações da dívida interna
e externa, o que representou 40,3% do orçamento federal, o que é
absurdo.
3 – Boa parte destes 40,3% não deveriam ser considerados, pois representam “rolagem” ou “refinanciamento” da dívida.
MENTIRA. Frequentemente, pessoas ligadas ao governo
afirmam que parte destes 40,3% seria apenas “rolagem” ou
“refinanciamento” da dívida, ou seja, o pagamento de amortizações
(principal) da dívida por meio da emissão de novos títulos (nova
dívida). Portanto, isto seria apenas uma troca de títulos velhos por
novos, não representando custo para o país.
Porém, a recente CPI da Dívida realizada na Câmara dos Deputados
revelou que grande parte desta “rolagem” ou “refinanciamento”
contabilizada pelo governo não representa pagamento de principal, mas
sim, o pagamento de juros. Portanto, a capacidade de endividamento do
país está sendo utilizada para pagar juros e encher o bolso dos bancos,
ao invés de, por exemplo, financiar a melhoria da saúde, educação,
transportes, etc.
4 – A dívida deixou de ser um problema após o pagamento ao FMI?
MENTIRA. Em 2005, durante o Governo Lula, foi
amplamente propagandeado o resgate antecipado ao FMI, no valor de US$
15,5 bilhões. Ao contrário do que se ensejou fazer crer, tal pagamento
não significou a extinção do endividamento externo, que alcançou US$ 485
bilhões em dezembro/2013. O pagamento de US$ 15,5 bilhões ao FMI em
2005 foi feito mediante a emissão de novas dívidas interna e externa com
juros muito superiores aos juros que vinham sendo pagos ao FMI, ou
seja, NÃO PAGAMOS A DÍVIDA, ela simplesmente mudou de mãos e em
condições mais onerosas. O pagamento antecipado ao FMI significou, na
prática, a troca de dívida sobre a qual incidia uma taxa de juros anual
de 4% por nova dívida interna, que na época remunerava à taxa de juros
de 19,3% ao ano, bem como de emissão acelerada de dívida externa, cuja
taxa de juros estava, à época, no patamar de 8%.
Além do mais, o Brasil continua praticando as políticas recomendadas
pelo FMI, tais como o “superávit primário” (ou seja, o corte de gastos
sociais para o pagamento da dívida), as reformas da Previdência, as
privatizações, dentre outras.
5 – A principal beneficiária da “dívida interna” é a classe média?
MENTIRA. Muitos dizem que o principal beneficiário
da dívida interna é todo o povo brasileiro, quando investe no chamado
“Tesouro Direto”, ou quando investe em “Fundos de Investimento” de
bancos, ou quando participa de algum “Fundo de Pensão”, que por sua vez
investe em títulos da dívida interna.
Na realidade, os principais beneficiários da dívida interna são os
grandes bancos e investidores nacionais e estrangeiros, pelos seguintes
motivos:
a – O chamado “Tesouro Direto” responde por apenas 0,36% do estoque da Dívida Interna (dado de julho/2013)
b – Conforme o gráfico abaixo, os principais beneficiários da dívida
interna são os bancos (nacionais e estrangeiros) e investidores
estrangeiros, que junto com as seguradoras (que também pertencem
principalmente aos grandes bancos) detêm 62% do estoque da dívida.
Apesar de muitos alegarem que os recursos dos bancos seriam, na
realidade, dos correntistas, cabe ressalvarmos que grande parte dos
valores investidos pelos bancos em títulos da dívida pública são o
capital do próprio banco. Além do mais, os correntistas recebem ZERO de
remuneração, enquanto os bancos recebem TODO o rendimento de seus
títulos públicos.
c – Os Fundos de Investimento detêm 18% da dívida, e também beneficiam
grandes investidores. A recente CPI da Dívida na Câmara dos Deputados
requereu ao governo dados sobre a distribuição dos grandes e pequenos
aplicadores de Fundos de Investimento, sendo que o Banco Central
respondeu que não possui tais informações. Recentemente, a Auditoria
Cidadã da Dívida solicitou ao Tesouro Nacional o nome dos detentores de
títulos da dívida interna, com o valor detido por cada um. O Tesouro
Nacional se negou a responder, alegando que tais informações estariam
protegidas por “Sigilo Bancário” !!!
Portanto, considerando que, de forma oficial, o governo afirma que não
possui – ou não pode fornecer – tais informações, é inadmissível que
qualquer pessoa venha a afirmar que a dívida pública beneficie
principalmente o povo brasileiro como um todo, por meio dos “Fundos de
Investimento”. Aliás, quando alguém da classe média faz um investimento
nestes fundos, paga elevadíssimas taxas de administração para os bancos.
d – Os Fundos de Pensão detêm apenas 13% da dívida interna, razão pela qual não são os principais beneficiários da dívida.
Elaboração: Auditoria Cidadã da Dívida, tendo como base a tabela disponível em:
Nota: incluíram-se as “Operações de Mercado Aberto”, disponíveis na
tabela abaixo, e que representam dívida do Banco Central com os bancos,
conforme comprovado na recente CPI da Dívida Pública na Câmara dos
Deputados.
Quando se defende a auditoria, estamos exatamente querendo saber quem
são os credores, pois nem mesmo o governo sabe quem são. E a partir
daí, poderíamos saber quem seriam realmente os pequenos aplicadores,
para que estes possam ser preservados. Mas isto somente poderíamos saber
após fazermos a auditoria.
6 – A dívida pública não precisa ser auditada, pois o TCU e outros órgãos já fazem esta auditoria, e não existem ilegalidades.
MENTIRA. A CPI mostrou que o TCU não analisa a
dívida com um todo, mas apenas faz estudos pontuais sobre aspectos muito
específicos. A CPI identificou sérios e vários indícios de ilegalidades
do endividamento externo e interno, tais como:
- Boa parte da dívida atual decorre da obscura e questionável dívida da
ditadura (ou seja, um governo ilegítimo), com cláusulas ilegais e sem
documentação;
- Utilização de juros flutuantes, ilegais segundo o Direito
Internacional;- a aplicação de juros sobre juros (“anatocismo”, vedado
pela Súmula 121 do STF);
- O pagamento antecipado de parcelas da dívida externa com ágio de até 70%;
- A realização, pelo Banco Central, de reuniões trimestrais com
representantes de bancos e outros rentistas, para a estimar variáveis
como juros e inflação, que depois são utilizadas pelo COPOM para a
definição das taxas de juros (ou seja, é “colocar a raposa para tomar
conta do galinheiro”);
- Ausência de contratos e documentos; ausência de conciliação de cifras;
- A grande destinação dos recursos orçamentários para o pagamento da dívida viola os direitos humanos e sociais.