Sábado, 25 de julho de 2015
Do Observatório da Imprensa
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Por Alberto Dines em 24/07/2015 na edição 860
Uma das primeiras apostas de Hollywood para levar mais gente
aos cinemas foi um truque psicológico extremamente simples: pavor. Há mais de
um século, tal como antes na literatura, as pessoas eram atraídas pelo que
deveriam abominar e graças a esta contradição, surgiram os Frankenstein, os
Drácula, médicos loucos, fantasmas, almas do outro mundo, lobisomens, monstros
importados do passado, do fundo do mar, do espaço, do futuro.
No Brasil, talvez por força da infantilização das grandes
audiências — para as quais medo não tem charme — um filme de horror chamou a
atenção de um dos mais importantes jornais do mundo , no entanto, provocar
grande frisson, aqui no Brasil, apesar de nosso protagonismo na película.
“Recessão e suborno: a crescente podridão no Brasil” foi o
título do editorial desta quinta-feira no secular “Financial Times”, o jornal
cor-de-salmão que raramente pisa em falso quando dá opinião (sobre música,
vinho, política, ou macroeconomia), e, por isso adquirido no mesmo dia por mais
de quatro bilhões de reais pelos japoneses da Nikkei.
“Incompetência, arrogância e corrupção tiraram do Brasil seu
encanto mágico…Não é de admirar que o país hoje seja comparado a um infindável
filme de horror”, afirma o FT.
Que o governo não reagisse ou reagisse no estilo inglês –
glacialmente – era o esperado. Designado para responder, Jacques Wagner,
ministro da Defesa, contestou com o argumento de veterano cinéfilo: “ não é
filme de horror mas de superação”. A surpresa veio da repercussão – quase
nenhuma. Por solidariedade e/ou despeito, nossa mídia enfiou a viola no saco e
saiu de fininho. Para não ser denunciada como alarmista ou golpista, talvez por
sentir-se absolutamente desamparada diante de uma crise tão disseminada e
ameaçadora, a verdade é que a retórica e o racionalismo anglo-saxônico se
impuseram aos floreios da prosa neolatina.
Incompetência e arrogância
Ao associar de forma direta, impiedosa, o fenômeno
macroeconômico da recessão à esfera criminal onde se encaixa o suborno, o
jornal escancara a natureza da nossa desgraça. Para não deixar dúvidas quanto a
gravidade do que está sendo investigado, adiciona dois penosos ingredientes
raramente utilizados nas avaliações sobre o que aconteceu na Petrobrás:
incompetência e arrogância.
Para coroar, o diagnóstico, o arrasador substantivo –
podridão – que nos remete a Shakespeare e ao inconformado Hamlet, ao reconhecer
que “há algo de podre no reino da Dinamarca”. Na injusta metáfora, o Bardo não
se referia apenas ao casal regicida (mãe e padrasto de Hamlet), mas à sociedade
desmoralizada, corrompida, desprovida de senso moral que permitiu a consumação
e a ocultação do crime.
Entende-se porque o editorial não foi transcrito e traduzido
na íntegra em nossa imprensa: por pudor e autoestima. No “Valor”, de
sexta-feira (24/7), nenhuma referência foi feita ao atroz editorial do FT, no
texto de uma página inteira sobre a aquisição do jornal britânico pelo grupo
nipônico. Passou despercebido? Claro que não: “Folha”, dona de 50% do “Valor”
também não publicou uma única linha.
Em compensação, o Grupo Globo”, dono dos restantes 50%,
publicou uma chamada na capa e um razoável comentário na pagina 3. Será que os
acionistas conseguirão entender-se e permitir que o jornal não brigue com o
noticiário ?
Verdadeira bomba arrasa-quarteirão espalha estilhaços, fere
a todos que, mesmo de longe, percebem o enredo. O interminável filme de horror
do qual somos personagens e espectadores, ao contrário do que apregoam os
mestres no gênero, parece condenado ao insucesso. Ninguém faz questão de vê-lo,
o desfecho ainda demora. Nossas plateias são impacientes, se resignam às longas
e artificiosas telenovelas, mas quando se trata de crises exigem soluções
imediatas, no atual mandato.