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(Millôr Fernandes)

domingo, 1 de maio de 2016

Renan não pode pedir que Lewandowski comande o impeachment

Domingo, 1º de abril de 2016
Tribuna da Internet
Jorge Béja

A anunciada transferência de Renan a Lewandowski, para que o presidente do STF presida e conduza no Senado o processo de impeachment, é uma improvisação. É verdade que nem toda improvisação dá errado. Mas essa não dará certo. Renan não poderá entregar a presidência do Senado ao presidente do Supremo e nem este poderá aceitá-la antes da hora certa. E a hora certa é a última e derradeira sessão do processo de Impeachment no Senado, quando 2/3 dos senadores, em sessão plenária – esta sim, presidida por Lewandowski – responderão “sim” ou “não” à pergunta feita pelo presidente do STF, sobre se Dilma Rousseff cometeu crime de responsabilidade.

O que está na Constituição, na lei e no Regimento Interno do Senado é matéria de ordem pública, que não admite contorno, acomodamento, ajuste e nem “pedalada”, para usar o substantivo tão em voga. Vamos aos motivos:

Embora a Constituição Federal determine que o Presidente do Supremo Tribunal Federal funcione como Presidente do Senado no processamento e julgamento do Presidente e do Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade (CF, artigo 52, parágrafo único), essa atribuição fica restrita à última e derradeira etapa do processo de Impeachment no Senado, que é o dia da sessão de julgamento. Até lá, a presidência do Senado não se transfere ao presidente do STF.

LEI DO IMPEACHMENT
No mesmo sentido dispõem o artigo 59 da Lei nº 1079/50 (“…com o libelo e a contrariedade ou sem eles, serão os autos remetidos ao presidente do STF, comunicando-se o dia designado para o julgamento e convidando-o para presidir a sessão“) e o artigo 380, III, do Regimento Interno do Senado Federal (“a comissão encerrará seu trabalho com o fornecimento do libelo acusatório, que será anexado ao processo e entregue ao Presidente do Senado Federal, para remessa ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, com a comunicação do dia designado para o julgamento“).
  Foi noticiado que Renan e Lewandowski teriam acertado a transferência bem antes da última e derradeira sessão. Transferência prematura, ilegítima e ilegal, portanto. Isso deixa entender que a presença do ministro-presidente do STF, a presidir e comandar o processo no Senado serviria para evitar a interposição de recurso(s) ao STF, uma vez que suas decisões, no tocante às questões de ordem levantadas por senadores, ao longo das muitas sessões anteriores à sessão final da votação, teriam peso, aparência e força de decisão judicial do próprio STF. É errado pensar assim.

SEM PODERES 
Ao assumir a presidência do Senado – e isso somente poderá ocorrer na sessão de votação, que é a sessão final – o presidente do STF não estará investido no poder judicante que detém e exerce apenas no STF. O que Lewandowski decidir na sessão, nem será decisão judicial, nem será decisão do STF, mesmo porque ele sozinho e na condição de presidente da Suprema Corte apenas a representa e nada decide e muito menos julga em nome e por delegação de seus dez outros colegas. Suas decisões não constituirão decisões do Supremo Tribunal Federal.
 
Chega-se à conclusão que o legislador quis apenas dar ao Presidente do STF uma posição honorífica, com o sentido de imparcialidade, para presidir o Senado na última sessão de votação do Impeachment. Posição e função honorífica e tida como neutra e imparcial, mas com poder de decisão apenas política, quanto às questões de ordem que vierem a ser levantadas e que serão muitas e muitas.
  IMPOR RESPEITO

Também se extrai dessa noticiada precipitação de substituição de presidência o sentido de impor respeito e um certo “medo, receio e reverência” aos senadores, porque terão eles que se dirigir ao presidente do STF, excepcionalmente presidindo uma sessão plenária do Senado Federal. Um espécie de “estranho no ninho”, no bom e legal sentido, é claro, a quem todos devem aceitar e não reclamar a respeito do que vier a ser decidido na mesma sessão.
Não sei não. Se Lewandovski presidir apenas a última sessão, que é a de votação, vai haver tumulto e balbúrdia. E se presidir as muitas sessões anteriores, conforme noticiado, aí mesmo é que o tumulto será maior. Isto porque o Senado não é o Supremo, os senadores não são os ministros do STF e nem as sessões do STF e do Senado são minimamente parecidas. Pelo contrário, no STF há urbanidade. Cada um fala na sua vez. Os debates são de alto nível e o notável saber jurídico e a ilibada conduta estão mesmo é no STF.
 
TUDO DIFERENTE 
No parlamento é tudo diferente. Os parlamentares chegam até às vias de fato. Brigam. Se atracam. Se não ofendem uns aos outros, chegam perto disso. O tumulto é generalizado. É a marca das duas Casas. Eles gritam. Se levantam, levam cartazes, bocejam, dormem, falam ao celular… Será que vão se comportar diferente só porque o presidente do STF é quem estará presidindo a sessão, ou as sessões?
 
E Levandowski? Saberá ele compreender esse ambiente, ao qual nunca na vida frequentou e dele participou? Como juiz-presidente da Suprema Corte o que decidir lá no STF está decidido. Roma Locuta Causa Finita.
 
Será que o presidente do STF saberá lidar com essa situação? Tomara que tudo transcorra na mais perfeita normalidade. Caso contrário, haverá nulidade e o processo de Impeachment será invalidado e deverá voltar a ter curso a partir do momento em que ocorreu a primeira nulidade. A resposta a tudo isso só o futuro próximo dirá.