Quarta, 20 de julho de 2016
Da Tribuna da Imprensa Sindical
Por Igor Mendes
Soou
como escárnio o anúncio feito pelo governo federal, há cerca de um mês
atrás, de que doaria 2,9 bilhões de reais ao Estado do Rio para investir
na “segurança pública”. O que temos visto nos últimos meses, realmente,
é uma escalada sem precedentes do Estado policial, com mortes diárias
de pessoas em supostos confrontos ou vitimadas por “balas perdidas”. O
que não deixa dúvidas de que, embora o terrorismo seja a justificativa
oficial para a operação de guerra olímpica, o inimigo número 1 dos
órgãos repressivos é a população, principalmente os mais pobres e os
movimentos e categorias em luta.
Mais de 8 mil pessoas assassinadas pela polícia na última década
Foi
amplamente noticiado o relatório divulgado pela ONG Humans Right Watch,
intitulado “O bom policial tem medo: os custos da violência policial no
Rio de Janeiro”, que sistematiza dados chocantes sobre homicídios
perpetrados por policiais. Na última década, oito mil pessoas foram
assassinadas nessas circunstâncias. Só entre 2013 e 2015 constatou-se
que a polícia matou cinco vezes mais do que feriu. No ano passado 645
pessoas foram mortas por PM’s em serviço, e neste ano – de janeiro a
maio – já foram registrados 322 casos.
Desnecessário
dizer que este número tende a estar fortemente subestimado. Tanto pelas
ameaças contra as famílias das vítimas e manobras dos próprios
delegados a fim de acobertar o crime, como porque mortes por “balas
perdidas”, resultantes de incursões policiais, não estão computadas.
Trata-se, na verdade, de um termo nefasto: não existem balas perdidas,
de fato, mas uma sistemática política de Estado de criminalização e
extermínio da pobreza. 77% dos homicídios cometidos por policiais
vitimaram jovens negros, em regiões bem delimitadas da cidade
(principalmente os grandes conjuntos de favelas da zona norte), e se
compararmos esse perfil com os das vítimas de “balas perdidas” veremos
que são idênticos.
Os
assassinatos que se sucederam ao resgate espetacular de Fat Family
devem ser colocados já na conta do megaevento. Como no Pan de 2007, em
que ocorreu a chacina do Complexo do Alemão, é um recado escrito com
sangue pelas forças policiais para que ninguém ouse perturbar o
“espírito olímpico”.
Repressão política
Sabemos
que se chamava “Doutrina de Segurança Nacional” o sistema de conceitos e
diretrizes político-militares que embasou o golpe de 1964. Aquela
doutrina, introduzida nos países latino-americanos pelo exército
norte-americano, no contexto da “Guerra Fria”, tinha como fundamentos o
anticomunismo, o estabelecimento de “fronteiras ideológicas” em
detrimento das fronteiras geográficas e a necessidade de equipar as
forças militares do Terceiro Mundo principalmente para combater o
inimigo interno – no caso, os movimentos nacionalistas e
revolucionários.
Temos
visto esse discurso reeditar-se nos dias atuais, com a roupagem de
“guerra ao terror”. Em nome de combater os “inimigos da humanidade” os
serviços secretos das potências interferem nos assuntos internos de
todos os países, ditam normas e regras de conduta, espionam e tramam
novos golpes militares. No Brasil, com o pretexto das Olimpíadas, as
Forças Armadas também se assanham, e velhos quadros da época do regime
militar saem de seus sarcófagos para ditar medidas repressivas contra
todos aqueles que contestam a calamitosa situação vivida pelo País.
O
exemplo claro disso é a atuação do Gabinete de Segurança Institucional
(GSI), recriado por Michel Temer, responsável dentre outras coisas por
gerir a Agência Brasileira de Informações (ABIN). O diretor do GSI,
general Sérgio Etchegoyen, notório defensor do golpe de 64, não demorou a
dizer a que veio. Segundo o jornalista Carlos Amorim, “caberá a ele
[GSI] o monitoramento dos movimentos sociais, especialmente no campo, e
de grupos radicais nas cidades. Entre os alvos na zona rural estão o
MST, a Liga dos Camponeses Pobres (atua na região amazônica), a Via
Campesina e outros grupos menores, todos de esquerda. Nas cidades, a
preocupação é com o MTST, o MEPR (Movimento Estudantil Popular
Revolucionário), os black blocs, anarquistas e tendências jovens
dispostas a recorrer à violência durante protestos”. Recentemente a ABIN
divulgou cartaz com o protótipo do que seria um “terrorista”, na
verdade, parecido com qualquer manifestante ou mesmo jovem das grandes
cidades.
O
inimigo dessa gente, realmente, é o povo brasileiro, que elevando cada
vez mais sua consciência, ameaça essa ordem reacionária que o pisoteia.
Não vai ter tocha!
Apesar do clima de terrorismo de Estado
têm ocorrido quase semanalmente manifestações massivas no Rio, puxadas
pelos profissionais da educação em greve. Por todo o Brasil a população
tem organizado campanhas para apagar a tocha, inclusive, fazendo
vaquinhas para arcar com as fianças de quem seja detido tentando
realizar o feito. Provavelmente ocorrerá um grande ato na abertura do
evento, no próximo dia 5.
Mostraremos,
como na Copa, que nosso povo não está representado pelas “autoridades”
corruptas e subservientes que participarão das cerimônias oficiais. Mas,
sim, por milhões e milhões de pessoas que não aceitam mais seguir
vivendo como antes. Não é medalha o que queremos, mas pão, terra,
feijão, independência nacional e uma Nova Democracia. À Luta!