Quinta, 7 de julho de 2016
Andreia Verdélio – Repórter da Agência Brasil
A procuradora da República Jerusa Burmann Viecili
disse hoje (7) que há uma “terceirização” e uma “dupla camada” de
lavagem de dinheiro obtido por atos de corrupção no Brasil. A Operação
Caça-Fantasma, 32ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada nesta
quinta-feira pela Polícia Federal (PF), investiga a atuação do banco
panamenho FPB Bank, que atuava no Brasil e mantinha “uma parceria” com a
empresa panamenha Mossack Fonseca, responsável pela abertura de
empresas offshore [empresas abertas em paraísos fiscais] de pessoas
investigadas por desvios de dinheiro na Petrobras.
“O destaque da
fase de hoje é essa sofisticação do método utilizado para ocultação de
recursos ilícitos nas contas desse banco. A utilização das offshores [de
operadores pessoa física] já é por si só a colocação de uma máscara, de
uma sombra no dinheiro, porque são empresas que conseguem manter o
beneficiário do dinheiro de maneira anônima. Com esse outro nível de
sofisticação, com a utilização de um banco clandestino, tem-se essa
dupla camada de lavagem, uma nova modalidade de ocultação e dissimulação
das titularidades das contas”, disse a procuradora.
O FPB Bank,
segundo a investigação, funciona de maneira oficial no Panamá, mas
atuava no Brasil sem autorização do Banco Central. Os funcionários da
instituição captavam clientes, realizavam serviços bancários e atendiam
essas pessoas em suas residências ou em escritórios clandestinos do
banco. “Era um pacote completo. A instituição registrava a offshore,
cuidava da parte gerencial e da estruturação da conta lá fora para
possibilitar o fluxo de dinheiro. Não é razoável que uma pessoa busque
uma instituição clandestina se não para fins ao menos duvidosos”, disse o
delegado da PF, Rodrigo Sanfurgo.
Celular criptografado
A
parceria entre o FPB Bank e a Mossack Fonseca foi descoberta durante a
22ª fase da Lava Jato, quando foi encontrado um celular criptografado
utilizado para comunicação entre os representantes das duas empresas. “A
força tarefa investiga uma rede que se vale de uma estrutura complexa
para proporcionar o fluxo de dinheiro para fora do país”, disse
Sanfurgo.
Segundo o Ministério Público Federal, foram
identificadas 44 offshores constituídas pela Mossack Fonseca por
solicitação dos funcionários do banco, mas ainda não foram identificados
todos os clientes da instituição financeira. A investigação apontou que
quatro pessoas já investigadas na Lava Jato movimentaram dinheiro com
quase 20 empresas offshores ligadas à Mossack, Pedro Barusco e Renato
Duque, ex-gerentes da Petrobras, o empresário Mario Goes e Roberto
Trombeta. Mas ele não necessariamente têm conta no PFB Bank.
Mas,
segundo a Polícia FederalF, a estrutura para a lavagem de dinheiro não
era exclusiva para atender investigados na Lava jato, e estava
disponível para qualquer pessoa. Ainda não se sabe há quanto tempo a
instituição financeira panamenha atuava no Brasil, mas “os
representantes no Brasil possuem uma relação de alguns com o banco. Não é
algo recente”, explicou Sanfurgo.
Mandados
Foram
cumpridos hoje sete mandados de condução coercitiva para representantes
do banco que atuavam no Brasil, todos brasileiros, segundo o delegado.
Onze mandados de busca e apreensão foram cumpridos na casa desses
investigados e nos locais onde há indícios que funcionavam os
escritórios do banco em Santos, São Bernardo do Campo e São Paulo.
Um
dos alvos de condução coercitiva é Edson Paulo Fanton, que consta como
representante do banco panamenho no Brasil. Ele é sobrinho do delegado
da PF Mário Renato Fanton, mas, segundo De Paula, não há nenhuma relação
do delegado com o FPB Bank.
Para o delegado da PF Igor de Paula,
essa complexa rede surge diante da fartura de dinheiro sujo que existe
no país. "Dinheiro que precisa ser lavado. É nesse espaço que crescem
situações como essa", disse, explicando que não é ilegal ter empresa
offshore ou recursos no exterior. “Mas a Mossack tinha uma forma de
atuação que deixava bem claro que os clientes não queriam ser conhecidos
e a documentação era manuseada de forma que não pudesse ser acessada. E
esse banco, atuando de forma clandestina, leva a crer que a maioria dos
clientes movimenta recursos de origem ilícita”, completou.
De
Paula explicou que não há como precisar o montante de dinheiro
movimentado pelo banco e que o segundo momento da investigação será
mapear quem e porquê utilizou os serviços da instituição. “[O Panamá] de
fato não é dos lugares mais fáceis para conseguir cooperação”, disse o
delegado, citando o caso Panamá Papers.
A panamenha Mossack
Fonseca também está no centro do escândalo mundial, chamado de Panamá
Papers, um esquema de ocultação de recursos usado por centenas de
autoridades e celebridades de dezenas de países, revelado este ano por
um consórcio internacional de jornalistas.
Segundo o delegado De
Paula, os recursos extraídos de forma ilícita da Petrobras são
“gigantes” e, pelo que se observa no esquema Panamá Papers, a Mossack
atendia todo o tipo de cliente, o que deve se repetir no modelo
brasileiro. Daí a atuação do FPB Bank no contexto da corrupção da
Petrobras. Nesta fase da Lava Jato, a PF apura crimes contra o sistema
financeiro nacional, a lavagem de ativos e a formação de organização
criminosa internacional.
Triplo X
A 22ª
fase da Lava Jato, Operação Triplo X, foi realizada no dia 27 de janeiro
deste ano e tinha como alvo apartamentos da empreiteira OAS que,
segundo investigações, podem ter sido usados para repasse de propina do
esquema de corrupção da Petrobras.
Segundo a Polícia Federal, a
empresa Mossack Fonseca é responsável pela offshore Murray, que adquiriu
um condomínio imobiliário no Guarujá, litoral paulista, inicialmente
construído pela Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop),
presidida entre 2005 e 2010 pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto,
preso em abril do ano passado, numa das fases da Lava Jato. O
empreendimento foi repassado para a empreiteira OAS em 2009, em função
de uma crise financeira da cooperativa.
Offshore, que significa
"afastado da costa" em inglês, é um termo utilizado para se referir a
contas bancárias ou empresas abertas no exterior, geralmente em paraísos
fiscais, onde os titulares buscam melhores condições em relação ao seu
país de origem, como isenção de impostos e sigilo fiscal. A abertura de
uma empresa offshore e a manutenção de recursos no exterior são
permitidas pela legislação brasileira, desde que declaradas à Receita
Federal e ao Banco Central.