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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Zelotes: Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, e mais nove viram réus

Quinta, 28 de julho de 2016
Do MPF
Atuação junto ao CARF aconteceu em 2014 e teve a participação de empresários, lobistas e agentes públicos
Zelotes: MPF/DF denuncia 10 pessoas no caso envolvendo o Banco Bradesco
Em mais uma ação penal proposta no âmbito da Operação Zelotes, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça dez pessoas pela prática dos crimes de corrupção ativa e passiva. O grupo formado por empresários, advogados, servidores públicos e intermediários é acusado de atuar na defesa de interesses do Banco Bradesco junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), onde a instituição bancária tentou, em 2014, se livrar de uma cobrança de aproximadamente R$3 bilhões. Entre os denunciados estão o presidente do banco, Luiz Carlos Trabuco Cappi, e outros três diretores da empresa. Também integra a lista o auditor da Receita Federal Eduardo Cerqueira Leite, apontado como a pessoa que propôs a contratação dos “serviços” irregulares à cúpula do banco.


 A ação tem 65 páginas e foi elaborada a partir do trabalho realizado pela força-tarefa que, além do MPF tem a presença da Polícia Federal, da Receita Federal e da Corregedoria do Ministério da Fazenda. No documento encaminhado à Justiça, os procuradores da República revelaram a descoberta de provas de que a relação entre o grupo empresarial e os integrantes do esquema criminoso não se restringiu à atuação junto ao Carf. As irregularidades, afirma o MPF, também ocorreram na Delegacia Especial de Instituições Financeiras, em São Paulo (Deinf/SP). Por isso, os autores da denúncia já se manifestaram pelo declínio de competência em relação a esses casos específicos, que teriam ocorrido ao longo dos últimos 13 anos.

Na ação, os procuradores detalham a atuação de cada um dos envolvidos em relação ao recurso apresentado pelo Bradesco em 2013. Hebert Mesquita, Frederico Paiva e Marcelo Ribeiro lembram que, no ano seguinte à apresentação do Processo Administrativo Fiscal (PAF), embora contasse com a assistência “de um dos melhores escritórios de advocacia tributária do Brasil”, o banco aderiu ao esquema de corrupção. Fez isso ao firmar um contrato fictício de assessoria tributária com o escritório de Mário Pagnozzi. As investigações revelaram que Pagnozzi era - juntamente com o contador José Teruji Tamazato - o elo entre os dirigentes do Bradesco e os agentes públicos com atuação junto ao Carf.

A partir da análise de informações e documentos reunidos na fase preliminar da apuração - que incluiu a interceptação de conversas telefônicas, a troca de emails e até imagens fotográficas de reuniões realizadas entre os envolvidos – os investigadores reconstituíram o funcionamento do esquema. Integrantes da chamada “frente de Brasília”, o analista tributário Lutero Fernandes e o então conselheiro do Carf Jorge Victor eram os responsáveis por levantar dados sobre o andamento do PAF e repassá-los à “frente paulista” (o auditor aposentado Jeferson Salazar e o servidor Eduardo Cerqueira). Juntos, os quatro sistematizavam estas informações em forma de “papers” que eram enviados a Pagnozzi e Tamazato para que chegassem à direção do banco. Os procuradores destacam o fato de que o servidor Eduardo Cerqueira Leite sempre participava das reuniões com a cúpula do banco.

Na ação penal, que será analisada pela 10ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, o MPF afirma que as articulações visando à interferência indevida no julgamento do recurso pela 3ª Câmara do Carf aconteceram “pelo menos entre os meses de julho e novembro de 2014”, quando o recurso foi julgado em primeira instância. Enquanto negociavam a contratação, os integrantes do esquema tentaram o adiamento e a corrupção de conselheiros na instância inferior do Carf. Com o adiamento, que se repetiu no dia 10 de outubro, o grupo pretendia ganhar tempo para selar o negócio, o que acabou não se confirmando, segundo as investigações.

Certeza de vitória - Informações obtidas a partir de interceptações telefônicas mostraram que, após o adiamento, os integrantes da organização criminosa se reuniram de forma sistemática com o objetivo de planejar a melhor forma de “vender” ao banco os serviços, ou seja, o poder de interferência no julgamento. No entanto, em reunião realizada no mês de outubro, com a presença de toda a cúpula do banco, a contratação não se confirmou. Segundo os investigadores, o banco apontou justificativas para não fechar o negócio. A instituição acreditava que, por se tratar de um direito embasado em uma decisão judicial, eram grandes as chances de sair vitoriosa do julgamento. Além disso, estava representado por um advogado renomado, “de modo que o banco tinha convicção de que ganharia a causa sem ter de pagar percentual aos corruptos e aos intermediários”.

O desfecho do julgamento realizado em 12 de novembro frustrou a expectativa do banco e, segundo os investigadores, abriu espaço para a corrupção ativa do banco: a atuação do grupo criminoso junto à Câmara Superior do Carf. O Bradesco perdeu por 6 a 0 na Câmara inferior, resultado que era esperado e até pretendido pelos envolvidos. “Diante da indefinição do banco, a organização criminosa demonstra irritação e já considera que o cenário ideal seja mesmo a derrota (..) para que isso motive a contratação para os atos subsequentes do PAF”, afirmam os procuradores em um dos trechos da denúncia. Eles completam o raciocínio citando um diálogo entre Jorge Victor e Jeferson Zalazar. Na conversa, dão a entender que o então conselheiro poderia até trabalhar por essa derrota.

Segundo as investigações, consumada a derrota na câmara inferior, o banco procurou Mário Pagnozzi e Eduardo Cerqueira Leite, interlocutores da instituição junto ao grupo criminoso, para ajustar a atuação na instância superior. E foi com o conhecimento e o aval do presidente da instituição, Luiz Carlos Trabuco Cappi, que eles apresentaram dois recursos: o primeiro, em 16/12/14 (embargos de declaração) e o segundo, em 18/03/15 (recurso especial). Nos dois casos, reiteram os investigadores, o banco agiu conforme estratégias e orientações dos intermediários e servidores públicos.

O efetivo pagamento da propina não foi confirmado pelos investigadores em decorrência de dois fatos. Em 14 de novembro de 2014, a interceptação telefônica dos envolvidos foi encerrada por determinação judicial. Além disso, oito dias após a apresentação do recurso especial (em 26/03/15) foi deflagrada a Operação Zelotes, fato que, na avaliação dos investigadores, foi decisivo para que o banco mudasse de estratégia. “Diante da publicidade da investigação e pressentindo que seriam alcançados por ela (…) apressaram-se para fazer o banco pagar o que devia no PAF e, assim, encerrar a discussão administrativa, fabricando a estratégia de que não aderiram às investidas da organização criminosa”, resumem os autores da denúncia.

Relação antiga -  Em vários trechos da denúncia, os procuradores da República apresentam evidências de que a relação entre a cúpula do banco e os investigados pela atuação criminosa junto ao Carf é antiga. Em um dos diálogos mencionados, aparece a afirmação de que Pagnozzi foi um dos responsáveis, em 2009, pela indicação de Trabuco para a presidência do banco. Também foram incluídos dois recibos, segundos os quais o Bradesco pagou ao escritório de Paznozzi por “serviços” realizados na Deinf/SP, local de trabalho de Eduardo Cerqueira Leite, que foi um dos que ficaram com parte do valor transferido pelo banco. Nestes casos, os pagamentos feitos em 2007, foram de R$ 247 mil e R$ 260 mil.

Também chamou a atenção dos investigadores a descoberta de que – durante as reuniões ocorridas no segundo semestre de 2014 – o grupo negociou a contratação de pelo menos outros dois produtos. Por um deles, a recuperação de créditos decorrentes de PIS e Cofins sobre juros de capital, o Bradesco pretendia receber da Receita Federal R$ 1,5 bilhão. No outro, a promessa era pagar R$ 30 milhões a Pagnozzi, Tamazato e Eduardo, caso o grupo conseguisse a homologação de créditos tributários na esfera administrativa. Em função da descoberta dos indícios de crimes alheios ao Carf (objeto da Operação Zelotes), os procuradores da República, requerem, na cota da denúncia, o declínio de competência para que as práticas irregulares possam ser investigadas e punidas na esfera competente do MPF e da Justiça Federal.

Relação de denunciados e respectivos crimes em cada caso 

Processo Administrativo Fiscal n° 16327.000190/2011-83

Jorge Victor Rodrigues praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 Jeferson Salazar praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 Mário Pagnozzi Júnior praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 José Teruji Tamazato praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 Eduardo Cerqueira Leite praticou o crime do art. 317, § 1° do Código Penal;
 Lutero Fernandes do Nascimento praticou o crime do art. 317, § 1° do Código Penal;
 Luiz Carlos Angelotti praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Domingos Figueiredo de Abreu praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Luiz Carlos Trabucco Cappi praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Mário Teixeira Júnior praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;

Pedido de Compensação de Créditos decorrente de Pis e Cofins incidentes sobre juros de capital próprio

Mário Pagnozzi Júnior praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 José Teruji Tamazato praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 Eduardo Cerqueira Leite praticou o crime do art. 317, § 1° do Código Penal;
 Luiz Carlos Angelotti praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Domingos Figueiredo de Abreu praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Luiz Carlos Trabuco Cappi praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;

Pedido de revisão tributária relativa aos últimos cinco anos

Mário Pagnozzi Júnior praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 José Teruji Tamazato praticou o crime do art. 317, § 1° c/c art. 29 do Código Penal;
 Eduardo Cerqueira Leite praticou o crime do art. 317, § 1° do Código Penal;
 Luiz Carlos Angelotti praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Domingos Figueiredo de Abreu praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;
 Luiz Carlos Trabuco Cappi praticou o crime do art. 333, parágrafo único do Código Penal;

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