Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 21 de agosto de 2016

Falar merda ou mentir

Domingo, 21 de agosto de 2016

Falar merda ou mentir.
Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro da Associação Juízes para a democracia.
O momento é oportuno para uma boa reflexão sobre esse tema. Encerramos as atividades olímpicas com a suspeita de que atletas olímpicos agredindo o espírito olímpico tenham procurado macular a imagem, já tão danificada, de nossa Cidade Maravilhosa criando um fato mentiroso envolvendo um falso crime de roubo. Entramos logo em seguida na fase das mentiras eleitorais praticadas regularmente sem quaisquer consequências punitivas salvo para o povo enganado que acredita em falsas promessas e depois tem que amargar mais quatro anos de desgovernos e irresponsabilidades.
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O livro de Harry G. Frankfurt “Sobre falar Merda”, primeiro lugar na lista dos mais vendidos do New York Times, faz uma bela leitura de como em tempos de comunicação global e massiva somos vítimas de mentirosos e faladores de merda. O autor elege os profissionais da propaganda e das relações públicas, muito ligadas à produção da imagem de candidatos a cargos eletivos como paradigmas inquestionáveis e exemplos consumados da arte de falar merda. Veremos nos próximos dois meses a utilização de técnicas avançadas para atender com base nas pesquisas de mercado e pesquisas de opinião pública para a construção de um “candidato perfeito”.

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Harry faz uma distinção interessante entre o falador de merda e o mentiroso contumaz. Enquanto o primeiro não se importa com o valor da verdade do que diz não se preocupando com o valor de um fato verdadeiro, mas esta camuflando as coisas, enquanto o mentiroso conhece a verdade e a ela se contrapõe. Uma pessoa que mente está reagindo à verdade e tem, até certo ponto, respeito por ela. Quando um homem honesto fala, diz apenas o que acredita ser a verdade; enquanto, para o mentiroso, é indispensável que ele considere suas afirmações falsas.
Isso talvez explique porque uma parte de nossa mídia, para atingir seus objetivos editoriais e interesses políticos e econômicos se utilize tanto desse expediente para influenciar a opinião pública. Por um lado o falar merda deturpa, essencialmente, não é o estado de coisas ao qual se refere que a mentira deturpa por ser falso, nem as crenças do falante em relação a esse estado de coisas. Uma vez que falar merda não envolve falsidade, difere das mentiras em seu intento deturpador. O falador de merda pode não nos enganar, ou nem ao menos querer fazê-lo, sobre os fatos ou sua interpretação deles. E sobre sua intenção que ele tenta necessariamente nos enganar. Sua única característica distintiva é que, de certa forma, ele deturpa seu objetivo.
É muito comum lermos comentários desconexos em relação a fatos que envolvem profissionais de certas áreas especializadas como são a polícia, o Ministério Público e o Judiciário. Noticiais são divulgadas confundindo a opinião pública sobre as atividades de cada instituição e muitas vezes induzindo o leitor a silogismos equivocados. A ideia que se passa em algumas manchetes de um julgamento antecipado das pessoas envolvidas em atos que exigem a ação dessas instituições conduzem a julgamentos precipitados ao invés de se limitarem a divulgar os fatos apenas e não seus prováveis resultados.
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Precavemo-nos porque nossa próxima atração será recheada de aventuras pelo mundo da mentira e da arte de falar merda. Temos que estar atentos para que sejamos capazes de fazer nosso próprio juízo de valor e não nos deixar embarrigar pelas opiniões publicadas que visa macular nossa melhor visão da realidade a ser democraticamente eleita.