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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

PGR pede inconstitucionalidade de norma que reduz orçamento federal mínimo para a saúde

Quinta, 29 de setembro de 2016
Do MPF
Para Janot, dispositivo fere o direito fundamental à vida, além de acentuar quadro crônico de subfinanciamento da saúde pública no país
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou ação no Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido de liminar, em que pede a inconstitucionalidade de norma que reduz o financiamento federal para ações e serviços públicos de saúde. Para o PGR, os dispositivos ferem cláusula pétrea da Constituição – o direito à saúde e à vida –, além de acarretar graves consequências ao pleno funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS), prejudicando a população, sobretudo, no atual momento de crise econômica e elevação do desemprego.


A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5595 questiona os artigos 2o e 3º da Emenda Constitucional 86/2015, que estabeleceu um piso anual progressivo para o custeio, pela União, dos serviços públicos de saúde. Além disso, retirou o caráter de fonte adicional da parcela dos recursos da saúde oriunda da participação no resultado ou compensação financeira por exploração de petróleo ou gás natural. “Tais mudanças são intensamente prejudiciais ao financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS), por implicarem redução drástica no orçamento para ações e serviços públicos em saúde, o qual já é historicamente insuficiente”, afirma Janot na inicial da ação.


Segundo o PGR, na EC 86/2015, “o que aparenta ser crescimento do financiamento federal mascara grave redução do custeio do sistema de saúde pública da nação”. A emenda foi aprovada em sentido oposto ao pretendido pelo Projeto de Lei Complementar 321/2013, fruto de iniciativa popular, que busca fortalecer o SUS mediante aplicação mínima de 10% da receita corrente bruta da União, em contraponto aos percentuais vigentes, que incidem sobre a receita corrente líquida. 


A EC 86 estabeleceu novo regime de gasto mínimo federal para ações de saúde correspondente a 15% da receita corrente líquida da União, mas de forma progressiva até 2020. A medida substituiu o cálculo vigente desde 2000 (EC 29) que se baseava na variação do Produto Interno Bruto (PIB). 


Perdas - O Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo (MPC/SP), em representação dirigida à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, estima uma perda de R$ 10 bilhões no exercício de 2016 para o custeio da saúde pública dos brasileiros, com as novas regras. Isso porque, com as regras anteriormente vigentes, a aplicação mínima na saúde em 2015 correspondeu a 14,8% da receita corrente líquida da União, e, ao longo de 2016 será de 13,2%, conforme a progressão estabelecida pela EC 86.


Segundo o MPC/SP, o dispositivo inserido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que pretendia cobrir tal diferença negativa entre os pisos de custeio para o SUS acabou vetado. Dessa maneira, o novo cálculo contraria também a Lei Comlementar 141/2012, que impede retrocessos no montante anual de recursos investidos no SUS, considerando a essencialidade dos serviços da saúde, mesmo em cenário econômico negativo. A estimativa do Conselho Nacional de Secretários de Saúde é de que, entre 2015 e 2017, as perdas possam chegar a R$ 20 bilhões numa área que já padece de subfinanciamento crônico.


Retrocesso social - Outro retrocesso trazido pela norma é a retirada do caráter adicional dos recursos oriundos da exploração do petróleo e gás natural – incluídos os decorrentes do pré-sal. Para o PGR, a EC 86/2015 contraria os princípios constitucionais de vedação de retrocesso social e da proporcionalidade, no sentido que proíbe a proteção deficiente. Além disso, a medida implica no descumprimento do compromisso de progressividade na concretização dos direitos sociais, assumido pelo Brasil no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e no Protocolo de São Salvador.


“O tratamento que o constituinte originário conferiu ao SUS foi de imunizá-lo de vicissitudes políticas. O financiamento público, como dito, é um dos pilares do sistema e pressupõe progressividade, ao menos até que se cumpra a meta do artigo 196 da Constituição (acesso universal e igualitário)”, destaca Janot. Para ele, os impactos da redução promovida pela norma questionada são ainda mais graves por atingirem principalmente as parcelas mais vulneráveis da população.


Liminar – O PGR requer ao STF concessão de liminar para suspender os efeitos da norma, por considerar que a demora processual pode agravar a insuficiência de recursos para o SUS, prejudicando seus usuários com potencialidade de impacto cada vez maior ao passar do tempo. Ele lembra que a taxa de desemprego tem aumentado nos últimos meses, o que impacta diretamente no aumento do número de pessoas que passam a depender do SUS.


“A EC 86/2015 exacerba o quadro crônico de subfinanciamento da saúde pública no País, que causa número formidável de mortes e agravos evitáveis à saúde dos cidadãos brasileiros, com enorme sofrimento individual e impactos na economia e no desenvolvimento”, conclui.