Domingo, 21 de maio de 2017
Da OAB
domingo, 21 de maio de 2017 às 00h49
Brasília - O Conselho Pleno da OAB votou pela abertura de
processo de impeachment contra o presidente da República, Michel Temer,
por crime de responsabilidade.
Os conselheiros acolheram voto
proposto por comissão especial que analisou as provas do inquérito.
Foram 25 votos a favor e apenas uma divergência e uma ausência. O pedido
deve ser protocolado na Câmara dos Deputados nos próximos dias.
O
presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, registrou que este era um
momento de tristeza para a OAB. “Estamos a pedir o impeachment de mais
um presidente da República, o segundo em uma gestão de 1 ano e 4 meses.
Tenho honra e orgulho de estar nessa entidade e ver a OAB cumprindo seu
papel, mesmo que com tristeza, porque atuamos em defesa do cidadão, pelo
cidadão e em respeito ao cidadão. Esta é a OAB que tem sua história
confundida com a democracia brasileira e mais uma vez cumprimos nosso
papel”, afirmou.
Lamachia, então, elencou uma série de medidas
tomadas pela OAB no combate à corrupção, como o fim do investimento
privado em eleições, fim de doações ocultas, transparência no BNDES,
criminalização do caixa 2, Súmula Vinculante contra o nepotismo, fim da
imunidade parlamentar contra crimes comuns, fim do voto secreto em
cassações de mandato, pagamento de contas públicas em ordem cronológica,
contra a compra de votos.
“Este é o trabalho de todos os
advogados brasileiros. Agradeço aos conselheiros e diretores, assim como
à Comissão que, em dois dias, foram chamados a participar de forma
direta desse processo. Estamos com o sentimento correto de que agimos
com responsabilidade, mas acima de tudo olhando para o Brasil, porque
queremos um país melhor para nossos filhos, banindo de nossa sociedade a
corrupção. O nosso partido é o Brasil e nossa ideologia, a
Constituição”, finalizou.
De acordo com a comissão especial,
convocada pela diretoria da OAB Nacional, Michel Temer teria falhado ao
não informar às autoridades competentes a admissão de crime por Joesley
Batista e faltado com o decoro exigido do cargo ao se encontrar com o
empresário sem registro da agenda e prometido agir em favor de
interesses particulares. O parecer da comissão foi lido pelo relator da
comissão, Flávio Pansieri, que teve como colegas de colegiado Ary
Raghiant Neto, Delosmar Domingos de Mendonça Júnior, Márcia Melaré e
Daniel Jacob.
Lamachia classificou a atual crise brasileira
como sem precedentes sob todos os aspectos. “A velocidade e a seriedade
dos fatos impõe que façamos o que sempre prezou esta gestão: colher
posição do Conselho Federal da Ordem. Quero registrar que a confiança e o
apoio de todos os conselheiros têm sido fundamentais para que possamos
vencer os desafios que temos. A responsabilidade que OAB e advocacia tem
é muito grande”, afirmou.
O presidente da OAB explicou ainda
que somente convocou a reunião extraordinária após ter acesso aos autos
do processo que investiga o presidente da República, Michel Temer, no
Supremo Tribunal Federal. “Assim como fizemos ao analisar o impeachment
da ex-presidente Dilma Rousseff, afirmei que não convocaria sessão
baseado apenas em notícias de jornais e fiz o mesmo desta vez: só o
faria com dados formais e oficiais do processo”, afirmou, lembrando que,
como da outra vez, o presidente da República pôde se defender no
Plenário. “Uma demonstração de que priorizamos a democracia e a
independência, não criando situações díspares.”
Os
conselheiros federais se revezaram ao microfone para denunciar a atitude
do presidente da República, Michel Temer. Foi execrado o encontro do
mandatário da República com um empresário investigado em mais de 5
operações da Polícia Federal e o conteúdo dos diálogos travados. Os
advogados concluíram que, ao não denunciar Joesley após ele admitir ter
corrompido dois juízes e um procurador, Temer faltou com o decoro e
feriu a Lei do Servidor Público. Também teria agido em favor dos
interesses pessoais de Joesley em detrimento do interesse público.
Mais
cedo, os conselheiros federais, após exaustiva deliberação, decidiram
que não era procedente o pedido dos advogados de Michel Temer para mais
tempo para análise dos fatos antes de apresentar sua defesa. Para a OAB,
como o pedido de abertura de processo de impeachment não é um
julgamento em si, a defesa deverá ser feita no Congresso Nacional. De
qualquer forma, os advogados falaram por cerca de 20 minutos e foram
convidados a se manifestar novamente durante a análise do mérito da
questão.
Os advogados Gustavo Mendes e Carlos Marun, que
também é deputado federal, falaram no Plenário e pediram mais prazo para
que a defesa do presidente possa apreciar o voto proferido pelo
conselheiro federal, Flávio Pansieri. No ano passado, o mesmo aconteceu
na sessão que debateu o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Na
ocasião, falou em defesa da presidente o então advogado-geral da União,
José Eduardo Cardozo. Marun insistiu no pedido de prazo para a defesa do
presidente Temer para que os advogados tenham contato efetivo com voto
do relator e assim possam apresentar as razões para que não haja um
encaminhamento pelo impeachment do presidente pelo Conselho Pleno da
Ordem.
Parecer
Para a Comissão, o presidente da
República infringiu a Constituição da República (art. 85) e a Lei do
Servidor Público (Lei 8.112/1990) ao não informar à autoridade
competente o cometimento de ilícitos. Joesley Batista informou ao
presidente que teria corrompido três funcionários públicos: um juiz, um
juiz substituto e um procurador da República. Michel Temer, então,
ocorreu em omissão de seu dever legal de agir a partir do conhecimento
de prática delituosa, no caso, o crime de peculato (Código Penal, art.
312).
“Se comprovadas as condutas, houve delito funcional em
seu mais elevado patamar político-institucional. Há dever legal de agir
em função do cargo. Basta a abstenção. São crimes de mera conduta,
independentemente de resultado”, afirmou Pansieri. “O que fizemos hoje
foi tentar romper com o que a percepção do ‘assim é que sempre foi’ e
elaboramos esse parecer. OAB e a história da entidade está acima de
nossas histórias pessoais. Viemos aqui para fazer a coisa certa, em prol
de um país diferente.”
A Lei do Servidor Público prevê em
seu art. 116 é dever levar as irregularidades de que tiver ciência em
razão do cargo ao conhecimento da autoridade superior ou, quando houver
suspeita de envolvimento desta, ao conhecimento de outra autoridade
competente para apuração.
O presidente da República também
teria procedido de maneira incompatível com o decoro exigido do cargo,
condição previstas tanto na Constituição da República quanto na Lei do
Impeachment (Lei 1.079/1950), por ter se encontrado com diretor de uma
empresa investigada em 5 inquéritos. O encontro ocorreu em horário pouco
estranho, às 22h45, fora de protocolo habitual, tanto pelo horário
quanto pela forma, pois não há registros formais do encontro na agenda
do presidente.
Na conversa entre Temer e Joesley se verifica
esforço aparente em se buscar nome favorável aos interesses da companhia
para atuar como presidente do Cade e por favorecimento junto ao
ministro da Fazenda. Isso também seria falta de decoro por interceder em
interesses de particulares, os favorecendo em detrimento do interesse
público.
O relator Flávio Pansieri traçou um histórico do
instituto do impeachment na ordem jurídica brasileira e lembrou que a
OAB foi instada a atuar em outros momentos da história, como com os
ex-presidentes Fernando Collor e Luiz Inácio Lula da Silva. Também
explicou que as crises vivenciadas no sistema presidencialista, como o
brasileiro, são mais graves e aguda e é assim que se encontra o Brasil.