Sábado, 6 de maio de 2017
Paulo Victor Chagas - Repórter da Agência Brasil
O ex-diretor da Petrobras, Renato Duque, disse que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva o procurou para saber se havia
alguma conta na Suíça em que tivesse recebido propinas pelo esquema de
corrupção investigado na Operação Lava Jato. De acordo com ele, devido
ao nível de informações sobre as operações negociadas entre a estatal e
outras empresas, ficou “claro” que Lula “tinha pleno conhecimento” e
“detinha o comando de tudo”.
Em
depoimento prestado nesta sexta-feira (5) ao juiz federal Sérgio Moro,
Duque contou que se reuniu três vezes com Lula após deixar a Diretoria
de Serviços da empresa, em 2012, e que durante as conversas o
ex-presidente o questionou sobre o andamento dos contratos da Petrobras
com estaleiros para a construção de navios-sonda. A preocupação de Lula,
segundo ele, era com os pagamentos feitos ao PT e com o possível rastro
financeiro em contas fora do país que poderia ser detectado pelas
investigações.
Réu em um dos processos da Lava Jato em Curitiba,
Renato Duque foi reinterrogado hoje após permanecer em silêncio na
audiência do dia 17 de abril. Ele próprio pediu para ser ouvido
novamente. Além de Duque, os ex-ministros Antonio Palocci, o
ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e o marqueteiro João
Santana são réus na mesma ação penal.
“No último encontro, em
2014, já com a Lava Jato em andamento, ele [Lula] me chama em São Paulo,
no hangar da TAM do Aeroporto de Congonhas, e me pergunta se eu tinha
uma conta na Suíça com recebimentos da SBM [empresa holandesa acusada de
pagar propina a funcionários da Petrobras] dizendo que a então
presidente Dilma [Rousseff] tinha recebido informação de que um
ex-diretor da Petrobras teria recebido dinheiro em uma conta na Suíça.
Eu falei: 'Não tenho, nunca recebi dinheiro da SBM'. Aí ele vira pra mim
e fala: 'E das sondas, tem alguma coisa?' E eu tinha, né? Mas eu falei:
'Não, também não tem'. Ele falou: 'Olha, presta atenção no que eu vou
te dizer. Se tiver alguma coisa, não pode ter, entendeu? Não pode ter
nada no teu nome, entendeu?' Eu entendi, mas o que eu ia fazer? Não
tinha mais o que fazer”, disse.
As informações referentes aos
encontros com Lula foram detalhadas em resposta à própria defesa de
Duque, depois que Sérgio Moro fez seus questionamentos. Segundo o
ex-diretor, a primeira das três reuniões ocorreu a pedido dele próprio,
para “agradecer pelo período” que passou na Petrobras. No depoimento,
Renato Duque conta que, embora funcionário de carreira, chegou à
Diretoria de Serviços da estatal, em janeiro de 2003, após negociações
que envolveram o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, que também
foi condenado em processos da Lava Jato.
Institucionalizado
Segundo
o ex-diretor, o esquema de corrupção era “institucionalizado” e vinha
de gestões anteriores. Devido a isso, explicou, os partidos faziam
solicitações às empresas que fechavam contratos com a Petrobras e elas
repassavam os valores já como uma “consequência”. “Isso não era uma
obrigação”, disse.
Em diferentes trechos do depoimento, ele diz
que deseja esclarecer o que estiver a seu alcance e que quer pagar pelo
que fez. Renato Duque, que está em preso há mais de dois anos após
mandados expedidos por Sérgio Moro, relatou também ter três contas no
exterior cujo dinheiro, segundo ele, poderia ser repatriado pelos
investigadores para retornar a “quem de direito”. De acordo com ele,
pelo menos 20 milhões de euros (cerca de R$ 69,84 milhões) ainda estão
em sua posse no exterior.
Na Petrobras, Duque era o responsável
por repassar as vantagens indevidas ao PT. A partir de 2007, as
negociações passaram a ser feitas com João Vaccari Neto, ex-tesoureiro
do partido, segundo o ex-diretor, cumprindo determinação do próprio
Lula. “Fui chamado a Brasília pelo então ministro Paulo Bernardo, essa
pessoa falou: 'Você vai conhecer uma pessoa indicada pelo... e fazia um
movimento [com as mãos, na barba e no queixo]. O Lula era chamado como
Chefe, Grande Chefe, Nine ou esse movimento com a mão. A pessoa que está
sendo indicada, ela que vai ser agora quem vai atuar junto a empresas
que trabalham com a Petrobras. Foi quando conheci o Vaccari em 2007”,
disse.
Durante o depoimento, que durou mais de uma hora, o
ex-diretor de Serviços da Estatal detalha que, no caso específico dos
contratos envolvendo a Sete Brasil, foi acordado o repasse de 0,9% de
propina dos valores pagos pelos cinco estaleiros contratados para
construir os navios-sonda. A vantagem ilegal seria dividida igualmente
entre o PT e os funcionários da Petrobras. A Sete Brasil foi criada pela
estatal para explorar o petróleo na camada pré-sal.
Outro lado
Em
nota à imprensa, a assessoria de Luiz Inácio Lula da Silva acusa os
procuradores da Lava Jato de fabricar “depoimentos mentirosos” na
tentativa de produzir provas para as “denúncias levianas” contra ele,
após “dois anos de investigações. De acordo com a defesa do
ex-presidente, veículos da imprensa já “vinham antecipando estranhamente
o suposto teor” do depoimento, “sempre com o sentido de comprometer
Lula”.
“O desespero dos procuradores aumentou com a aproximação
da audiência em que Lula vai, finalmente, apresentar ao juízo a verdade
dos fatos. A audiência de Lula foi adiada em uma semana sob o falso
pretexto de garantir a segurança pública. Na verdade, como vinha
alertando a defesa de Lula, o adiamento serviu unicamente para encaixar
nos autos depoimentos fabricados de ex-diretores da OAS [Leo Pinheiro e
Agenor Medeiros] e, agora, o de Renato Duque”, diz a defesa do
ex-presidente.
Ainda no comunicado, a assessoria diz que os
depoentes são condenados a mais de 20 anos de prisão, nunca haviam
mencionado o ex-presidente ao longo do processo e teriam sido “coagidas a
negociar benefícios penais”. “O que assistimos nos últimos dias foi
mais uma etapa dessa desesperada gincana, nos tribunais e na mídia, em
busca de uma prova contra Lula, prova que não existe na realidade e
muito menos nos autos”, diz a defesa.