Sexta, 5 de maio de 2017
Considerações sobre o extermínio da juventude negra
Daqui a 23 minutos um jovem negro
será assassinado no Brasil. É isso que consta no relatório da CPI do Senado
sobre o assassinato de jovens apresentado em 2016. No decorrer do ano, serão
mortos mais de 23 mil jovens negros, entre 15 e 29 anos, pois essa é a média
anual do extermínio em nosso país. Esse número é quatro vezes maior do que a
taxa entre jovens brancos e reflete um padrão: 53% das vítimas são jovens;
destes, 77%, negros, e 93% do sexo masculino.
Esse genocídio não é novo. O Mapa
da Violência, que analisou dados entre 2002 e 2012, caracteriza que há uma
“crescente seletividade social” em relação aos assassinatos: enquanto o número
de mortes entre os brancos diminuiu, passando de 19.846, em 2002, para 14.928,
em 2012, as vítimas negras aumentaram de 29.656 para 41.127 no mesmo período.
Para negros e negras, sequer é
possível ser jovem
Poderíamos citar milhares de dados
e recortes de raça, classe, gênero, orientação sexual que só comprovariam o
extermínio da juventude negra e pobre. Dados, inclusive, disponibilizados, sem
nenhuma vergonha na cara, pelo próprio Ministério da Justiça dos governos do
PSDB e do PT.
Isso não causa espanto para quem
vive nas periferias do Brasil, onde, cotidianamente, os jovens estão sendo
vitimados pela completa ausência de políticas públicas de educação, saúde,
lazer, cultura e trabalho. O que nos leva à conclusão de que, no Brasil, nem
todo jovem goza dos direitos e vantagens associados à juventude. A grande
maioria não tem sequer o direito de ser jovem.
Algumas características do que é
ser jovem foram construídas ao longo da história burguesa em torno das ideias
de se ter a proteção familiar, estar incluído numa instituição educacional e,
portanto, afastado do mundo do trabalho.
Para negros e negras, contudo, a
história sempre foi diferente. Vivemos num país que tem uma política de
extermínio da juventude negra cujas raízes estão na escravidão e há muito,
principalmente desde da implementação da República, no final dos anos 1800, se
apoia em teorias escravistas e capitalistas, como o discurso raciológico, que
tipifica as pessoas a partir de sua raça, e eugenista, que estabelece a
branquitude como padrão superior e civilizatório.
É diante de um histórico como este
que devemos nos perguntar: a maior parte dos jovens negros tem a proteção
familiar sem os problemas de desagregação social que vitima essas famílias? Tem
inserção e permanência nas escolas? Não tem necessidade de trabalhar? Qual é
o(a) jovem negro(a), filho(a) da classe trabalhadora com o privilégio quase exclusivo
de se dedicar à cultura, ao lazer e ao estudo?
O PSTU entende que a juventude
filha da classe trabalhadora, presente nas fileiras do movimento estudantil e
moradora dos bairros periféricos e favelas – muitos ausentes da escola, mas
presentes no mercado de trabalho precarizado e em movimentos de contracultura
como o hip hop e os saraus – deve estar lado a lado na defesa de outro modelo
de sociedade, ou seja, na construção do socialismo como garantia de uma nova
concepção de juventude para si, adquirindo consciência de classe e identidade
étnico-racial.
É preciso que se rompa com o
“reino da necessidade”, transformando o mundo para ter garantido o direito de
ser juventude. Para que negros e negras possam realmente ter sua juventude
conquistada e, assim, não morram muito antes de chegarem à vida adulta,
constituírem suas próprias famílias e terem os seus direitos sociais
garantidos.
SAÍDA: Um programa mínimo para a
Juventude
• Redução da jornada dos
trabalhadores jovens para que possam conciliar trabalho e estudo.
• Legalização e descriminalização
das drogas, o que garantiria regulamentação, prescrição terapêutica e pesquisa
científica para controle e diminuição dos malefícios sociais associados à
dependência química.
• Libertação da arte e da cultura
dos aparatos capitalistas por meio do acesso irrestrito.
• Sistema de cotas e ações
afirmativas para a juventude negra nas universidades como luta inseparável do
fim do vestibular e acesso irrestrito para entrar no ensino superior e, também,
no mundo do trabalho.
• Transparência de dados sobre
segurança pública e violência dos órgãos públicos; fim dos autos de resistência
(termo utilizado por policiais que alegam estar se defendendo ao matar um
suspeito) e fim da Polícia Militar.
• Defesa intransigente da escola
pública, laica e gratuita, onde se discuta e seja eliminada a marginalização da
juventude negra.
Por Rosenverck Estrela Santos
Graduado em História e mestre em
Educação (2007) pela Universidade Federal do Maranhão, onde leciona no curso de
Licenciatura Interdisciplinar em Estudos Africanos e Afrobrasileiros. Verck é
autor, dentre outros, de Juventude e periferia em tempos neoliberais: cultura,
revolução e hip hop e HIP HOP Brasil: história e intervenções político-culturais.