Segunda, 5 de junho de 2017
Flávia Villela - da Agência Brasil
Uma em cada três mulheres grávidas em presídios do país foi
obrigada a usar algemas na internação para o parto, e mais da metade
teve menos consultas de pré-natal do que o recomendado. Os dados fazem
parte de um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sobre o perfil da
população feminina encarcerada que vive com os filhos em unidades
prisionais femininas no país.
O acesso à assistência pré-natal
foi inadequado para 36% das mães. Durante o período de hospitalização,
15% afirmaram ter sofrido algum tipo de violência, seja verbal,
psicológica ou física. Ainda segundo a pesquisa, 32% das grávidas presas
não fizeram teste de sífilis e 4,6% das crianças nasceram com a forma
congênita da doença.
De acordo com uma das coordenadoras da
pesquisa e integrante da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz,
Maria do Carmo Leal, as condições da atenção à gestação e ao parto para a
mães encarceradas no Sistema Único de Saúde são piores que as dadas às
mães que não estão presas. “O estudo mostrou também que havia diferença
na avaliação da atenção recebida durante a internação para o parto
segundo a condição social delas. Foi menor a satisfação para as pobres e
as de cor de pele preta ou parda.”
A pesquisa deu origem ao documentário Nascer nas Prisões,
dirigido por Bia Fioretti, que ainda será lançado pela Fiocruz. No
filme, mães encarceradas contam que seu maior medo é que os bebês sejam
mandados para um abrigo, já que na maioria dos presídio,s a criança só
pode permanecer até completar 1 ano.
Na maioria dos estados
brasileiros, a mulher grávida é transferida, no terceiro trimestre de
gestação, da prisão de origem para unidades prisionais que abriguem mães
com filhos, geralmente localizadas nas capitais e regiões
metropolitanas. O parto é feito em hospital público, e elas voltam para a
unidade prisional com o recém-nascido. Após o sexto mês, geralmente as
crianças são entregues aos familiares. Na ausência destes, vão para
abrigos, e a mãe retorna à prisão de origem.
Foram ouvidas 241 mães, sendo que 45% delas têm menos de 25 anos, 57% são de cor parda e 53% têm menos de oito anos de estudo.
Mães encarceradas
A
pesquisa revela que 83% das presas têm pelo menos um filho e 31% delas
são chefes de família. A população carcerária feminina cresceu 118%
entre 2005 e 2014 no Brasil, segundo dados do Ministério da Justiça.
No
Brasil, os principais motivos que levam as mulheres à prisão são crimes
relacionados ao tráfico de drogas (68%) e contra o patrimônio (9%),
como estelionato e roubo. Somente 7% das presas haviam cometido
homicídio ou latrocínio.
Impactos sociais
A advogada Luciana Dimas avalia que os impactos do afastamento dos
filhos em relação à mãe encarcerada são nocivos não apenas para as
crianças, mas também para a sociedade como um todo. “É extremamente
injusta essa consequência produzida para os filhos dessas mulheres, não
apenas os que estão na prisão, como também os que estão fora da prisão,
que são excluídos, estão em processo de extrema vulnerabilidade social.”
Uma
das soluções para resolver esse problema seria soltar as presas
provisórias com filhos, já que a maior parte delas cometeu crimes
considerados de baixa periculosidade. É o que defende a assistente
social Marilene da Silva João, que trabalha com esse público. “A maioria
delas são presas provisórias e muitas vezes acabam indo embora. Então,
por que não soltá-las? O Estado sai ganhando, a sociedade sai ganhando”,
afirmou.
Ainda que não sejam soltas, é necessário que a
sociedade repense o que fazer com as mães presas, de modo a humanizar as
relações, ressalta a dentista Aline Cabral, que integra o Núcleo de
Saúde da Secretaria da Justiça e Cidadania do Ceará. “A população, em
geral, prefere que o preso morra, fique apodrecendo na cadeia, mas
esquece que o preso só está passando um tempo ali. Daqui a pouco, vai
estar em liberdade, e resta a nós escolher se queremos que ele volte
melhor ou pior”, afirmou Aline.