Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 11 de junho de 2017

O Leonel Brizola que conheci

Domingo, 11 de junho de 2017


Vicente Vecci*

Diante da hecatombe da crise política e institucional que nosso país passa atualmente, oriunda da corrupção desenfreada nos últimos governos da União, tendo como vítimas nossas estatais e  o banco de fomento BNDES e por consequência o povo brasileiro,  envolvendo membros do Legislativo em conluio com ex-titulares de órgãos do Executivo  e até mesmo membros do Judiciário, numa ponte para aliança espúria com  segmentos da iniciativa privada, vale rememorar personalidades políticas  brasileiras  do século XX.

Na era Vargas por exemplo, onde fora criada  à Petrobrás e outras estatais importantes ao nosso desenvolvimento econômico, despontaram entre outros líderes políticos que primaram pela ética e transparência, o engenheiro Leonel de Moura Brizola, conhecido como baluarte da  educação, iniciada quando fora prefeito de Porto Alegre na década de 1950 passando pelo governo do Rio Grande do Sul, culminando no governo do Estado do Rio de Janeiro com os eficientes CIEPS, Centros Integrado de Educação Pública, implantados com assinatura do antropólogo, educador e criador da Universidade de Brasília ex-senador Darcy Ribeiro com arquitetura de Oscar Niemayer.

Regressando do exílio com a anistia política no final do governo militar de Ernesto Geisel e no início da  gestão  do ex-presidente João Baptista Figueireido, tendo  em vista às eleições de 1982, Leonel Brizola iniciou antes desse pleito que tratava das eleições  para os governos estaduais,  contatos na coordenação  política do governo Federal, sob tutela do Ministério da Justiça, onde se destacaram o ex-senador Petrônio Portela e  depois o ex-deputado Federal por Minas Gerais Ibrahim Abi-Ackel.
   
Na audiência de Leonel Brizola com o ex-ministro da Justiça Ibrahim Abi- Ackel, estivemos presentes para registrar o fato e  entrevistá-lo  exclusivamente  para a TV Guaíba  de Porto Alegre-RS, conveniada com a nossa empresa jornalística OBN, numa pauta tendo em vista à sucessão estadual no Rio Grande do Sul nessas primeiras eleições com a volta da redemocratização do país. Imaginava-se que Brizola seria candidato a ocupar o palácio Piratini, sede do governo gaúcho. E, após nosso câmera registrar imagens de apoio dessa audiência e toda a imprensa presente deixá-los a sós no gabinete daquela pasta ministerial, conversamos como ex-deputado Federal Alceu Colares, posteriormente eleito governador desse estado que acompanhava Brizola e ele nos disse que o  companheiro  mencionara-lhe  durante o voo até Brasília que tinha como meta candidatar-se ao governo do Estado do Rio de Janeiro. Nos disse ainda Alceu Colares que essa declaração de Brizola o surpreendeu e  que achou uma missão  impossível, rememorando que a  única base eleitoral de Brizola no Rio de Janeiro era ter  sido eleito deputado Federal pelo extinto estado da Guanabara, hoje cidade do Rio de Janeiro, no início da década de 1960 e, no seu ponto de vista  poderia ser uma aventura.

Após esse encontro político, entrevistamos Brizola e ele afirmou que faria articulações políticas para recuperar a sigla do Partido Trabalhista Brasileiro-PTB, berço da era Vargas e se não o conseguisse, fundaria um novo partido dentro dos princípios do trabalhismo, e essa nova sigla partidária teria candidatos aos governos estaduais com seu apoio, principalmente no seu estado natal. Daí então fundou o PDT-Partido Democrático Trabalhista em detrimento ao PTB que fora lhe usurpado  por Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio Vargas, numa manobra  maquiavélica do  general Golbery do Couto e Silva, então  titular da Casa  Civil do Palácio do Planalto, um dos idealizadores do golpe militar de 1964. Foi numa forma de  atrapalhar Leonel Brizola  nas suas  metas  políticas de tendências socialistas. Mas não deu certo. Brizola candidatou-se ao governo do Estado do Rio de Janeiro e a contragosto de seus opositores e de um poderoso dono de uma emissora de TV, fundada durante o auge do regime militar, fora eleito numa eleição que tentaram lhe fraudar. Só não aconteceu por uma questão de  ética  de um  profissional de pesquisa eleitoral nesse pleito, contratado exclusivamente e internamente  por esse empresário das comunicações, e que percebeu na apuração,  os votos de Brizola praticamente não   apareciam  ao contrário de sua pesquisa que dava Brizola como eleito. Indignado  esse pesquisador  levou sua informação até  a  esse candidato e sugeriu-lhe botar a  boca no  trombone, reafirmando que iriam lhe roubar a sua eleição. Nesse ínterim os seus eleitores revoltados, começaram a apedrejar os veículos de transportes  dessa emissora  que estava facciosa  para outras candidaturas e seus votos não apareciam na apuração.

Brizola imediatamente convocou uma entrevista coletiva com  a  imprensa estrangeira  e denunciou a fraude de que estava sendo vítima. Daí então seus votos emergiram  como deviam. Foi o escândalo eleitoral da empresa Proconsult, contratada para apuração dos votos nessa eleição de 1982 no Rio de Janeiro.  E, para acalmar os ânimos dos eleitores de Brizola, convidaram-no a participar ao vivo do  programa dessa emissora  sobre esse pleito, intitulado na  época de Show das Eleições.

Já no governo desse estado, Leonel Brizola com excelente equipe livrou primeiramente o erário de um gasto excepcional  anualmente que era armar o circo  para o famoso espetáculo  do carnaval do Rio de Janeiro. Construiu o Sambódromo que fora no período carnavalesco era o CIEPS, conjugando escola, alimentação e lazer para crianças de famílias de baixa renda. E concedeu exclusividade na transmissão nacional desse evento à TV Manchete e rede de suas afiliadas.

Governou esse estado por duas administrações e deixou importantes obras. Tentou eleger-se presidente da República, mas foi tolhido por candidatos de partidos corporativistas e distantes de seu nacionalismo e da sua ética.

Historicamente sua memória é respeitada pela resistência a regime ditatoriais e opressores, a começar pela firmeza de garantir democraticamente numa rede de emissoras de  rádios à posse de João Goulart na Presidência da República quando na renúncia de Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, denominada  Rede da Legalidade. Jango era vice-presidente da República e na data da renúncia de Jânio, encontrava-se na China. Uma corrente de militares das forças armadas não queria sua posse. Esse movimento popular implementado por Brizola, garantiu-lhe assumir à chefia do país.

Nascido num distrito de Carazinho-RS, filho de camponeses, Brizola estudou e formou-se em engenharia civil por conta própria tendo trabalhado como engraxate e Office-boy para custear seus estudos. Daí sua prioridade na educação quando ocupou cargos governamentais.

Posteriormente a essa primeira entrevista exclusiva que fizemos com Brizola,  o encontramos diversas vezes aqui em Brasília, principalmente em manifestações populares na Esplanada dos Ministérios.

Deixou inúmeras estruturas de serviços públicos também no Rio Grande do Sul quando governou esse estado onde foi pioneiro na estatização de multinacionais que atuavam nesse setor, a começar pela companhia norte-americana de telecomunicações ITT.

Participou ativamente da campanha para as eleições diretas, junto com a safra de governadores eleitos em 1982, entre eles Tancredo Neves, Miguel Arraes e Íris Rezende. No dia 21 de junho próximo completa 13 anos de seu falecimento. O  partido o qual fundou, pelo que tudo indica, desvirtuou de seus princípios  elementares.

*Vicente Vecci edita há 33 anos em  Brasília, DF, o Jornal do Síndico:
www.jornaldosindicobsb.com.br
e-mail: sindico@jornaldosindicobsb.com.br