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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Justiça suspende terceirização em UPAs até o fim da greve dos médicos

Quarta, 7 de setembro de 2017
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Do site Ataque aos Cofres Públicos, com informações da Gazeta do Povo e Bem Paraná

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A desembargadora do Trabalho Marlene Teresinha Fuverki Suguimatsu concedeu liminar nesta terça-feira (5), em que determina que a prefeitura de Curitiba se abstenha de “contratar quaisquer entidades interpostas para emprego de mão de obra médica nas UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e demais unidades geridas pela Feaes (Fundação Estatal de Atenção Especializada em Saúde)” nas quais estejam trabalhando médicos que aderiram à greve da categoria, iniciada no dia 27 de julho.


Os médicos contratados via Feaes atendem nas Unidades Básicas de Saúde (UPAs), no Hospital do Idoso, da Maternidade Bairro Alto, no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps).


A ação que resultou na liminar foi proposta pelo Sindicato dos Médicos do Estado do Paraná. A desembargadora determinou que os médicos não poderão ser removidos para outras localidades “sem justificativa legítima” até o término da greve, “sob pena de multa diária, no valor equivalente ao dobro do salário dia pago a cada profissional médico lotado nas respectivas unidades, na hipótese de descumprimento, sem prejuízo de eventual revisão”.


Organizações sociais

No dia 28 de agosto, sob protestos, a Câmara de Curutiba aprovou a toque de caixa o projeto que permite que organizações sociais prestem serviços de saúde e educação na rede municipal. Não houve discussão com a população e nem com especialistas sobre tal modelo de gestão, que tantos prejuízos tem trazido para outros municípios.


Vereadores se reuniram na segunda-feira (4) com o procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC-PR), Flávio de Azambuja Berti, para discutir a nova legislação. Eles pediram um parecer do órgão sobre o assunto. Nesta quarta (6), o grupo pretende se reunir com representantes do Ministério Público para tratar do mesmo tema.


O Jornal Gazeta do Povo publicou uma reportagem onde alerta que a expectativa do Governo diante de contratações via OSs não corresponde à realidade observada em muitas cidades que já usam essas entidades. Apesar de existir desde 1998, o modelo de gestão permanece em um limbo jurídico, com questionamentos na área fiscal, trabalhista e econômica. Veja trechos da reportagem, que pode ser conferida na íntegra aqui:

Em Curitiba, até antes da aprovação da nova lei municipal, a parceria nas áreas de educação e saúde era proibida. Em um projeto que tramitou por apenas dez dias, a base de apoio do prefeito Greca conseguiu aprovar a mudança.

As OSs são entidades de direito privado, que ficam de fora da obrigação de licitação e concurso público, sem fins lucrativos, mas que remuneram sua diretoria e funcionários como uma empresa qualquer.

A justificativa da prefeitura é que a contratação de pessoal via OSs permitirá colocar unidades de educação prontas e paralisadas. Alega que gasto com pessoal não pode ser elevado, sob pena de infração à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Entretanto, ainda não há jurisprudência se o gasto com pessoal via OS entra no cômputo de gasto com pessoal ou não. O assunto foi levado ao Tribunal de Contas da União (TCU), que julgou a questão no fim de setembro de 2016. No acórdão, o TCU cita que não há uma padronização e que o ideal é que o Congresso Nacional discuta isso e deixe explícito na LRF.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), apresentou na época embargos de declaração ao TCU, por considerar a decisão omissa. À imprensa, ele disse que a decisão poderia provocar uma corrida por contratos com organizações sociais, como forma de burlar a despesa com pessoal, e que isso causaria um “colapso financeiro”. O processo ainda tramita no TCU.

Risco de descontrole
O procurador do Ministério Público junto ao TCU Júlio Marcelo de Oliveira critica a demora no julgamento da questão. Ele também vê risco de uma decisão dessas abrir caminho para o descontrole fiscal dos municípios. “Há um risco, evidentemente. Ao se tirar custo com pessoal do limite da LRF, cria uma folga, que com o tempo será ocupada por categorias mais fortes, que mexem com tributos, arrecadação, segurança”, observa. Ele diz que os TCs de cada estado têm um entendimento próprio.

O Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) informou, via assessoria de imprensa, que o caso de Curitiba será analisado, ao seu tempo, dependendo do modelo de contratação. O que já ocorre no órgão do Paraná é a desaprovação das contratações de serviços de saúde e educação por organizações sociais de interesse público. Segundo o TCE-PR, “o órgão entende que se trata de uma burla à LRF, uma vez que seriam atribuições previstas na Constituição para o poder público”. O valor gasto neste caso tem sido computado pelo TCE-PR como despesa com pessoal regida pela LRF.

Por todo o Brasil, o Ministério Público do Trabalho tem questionado contratos entre o poder público e organizações sociais.
No caso de a despesa com OS ficar de fora do gasto com pessoal, ela vai para a rubrica de despesas correntes, o que também gera problemas, especialmente na área de saúde, na visão do procurador. “A saúde passa a concorrer com os recursos do custeio geral. Há um estreitamento da margem de remuneração dos profissionais e consequente precarização de uma área essencial”, observa.
No geral, Oliveira critica os contratos firmados com OSs. “É um sistema que em geral perde transparência. Exemplos não faltam de casos de corrupção. E não é uma solução mágica. Não é porque mudou o modelo que automaticamente vai se ter mais dinheiro”, observa.
Ele conta que formou essa opinião com base nas fiscalizações realizadas e na observação de contratos firmados no Distrito Federal. “Temos ações de improbidade, ações penais, questionando devolução de aproximadamente R$ 100 milhões”. A maioria dos exemplos – e problemas – ocorre na área de saúde, mais complexa e sem possibilidade de planejamento de curto e médio prazo, como ocorre na área de educação.
Sem economia
Uma das situações recorrentes, diz Oliveira, é o alto custo dos contratos com OSs. “Geralmente se faz um projeto piloto, em que se coloca mais dinheiro e com isso se consegue bons indicadores, tentando mostrar que o modelo é bom. Mas, na verdade, o que está por trás é o financiamento, é o dinheiro que foi negado à rede pública”, observa.

A experiência em outros locais tem mostrado justamente isso: não há economia. O Tribunal de Contas da Paraíba, por exemplo, levantou que os valores repassados para unidades geridas por OSs superavam o que era gasto pelas unidades com gestão direta do poder público. O Hospital de Trauma de Campina Grande, com capacidade de 220 leitos, teve despesa de R$ 95,3 milhões em 2015, incluindo a folha de pagamento, adicional por produtividade, serviços de terceiros, diárias, material de consumo e despesas de custeio, como água e luz. Por outro lado, o Hospital de Trauma João Pessoa, com 148 leitos e gerido por uma OS, recebeu R$ 118,1 milhões em 2015.
Outro problema detectado foi a falta de transparência dos contratos de gestão. O material foi apresentado pelo conselheiro Antônio Nominando Diniz, no evento “Organizações Sociais na Saúde Pública: a visão dos órgãos de controle e fiscalização”, realizado em novembro de 2016 no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Justiça trabalhista
Outro imbróglio jurídico das OSs ocorre na esfera trabalhista. Por todo o Brasil, o Ministério Público do Trabalho (MPT) tem questionado contratos firmados entre o poder público e essas entidades. Segundo o procurador do Trabalho Rafael de Araújo Gomes, que atua no interior de São Paulo, o entendimento é que o poder público não pode terceirizar um serviço essencial, que não seja complementar.
“Agora, com a reforma trabalhista, há uma indefinição, porque na Justiça do Trabalho havia o preceito consolidado de não terceirizar a atividade-fim. A reforma vai sofrer algumas alterações, ainda não se sabe quais, mas imagino que no serviço público há menos chance desse tipo de permissão permanecer”, opina.
Segundo Gomes, mesmo em São Paulo, onde a atuação das OSs é consolidada, ocorrem muitas irregularidades. “Há muitos casos de corrupção, de desvio de dinheiro. Fora isso, há a questão do custo. Só vai custar menos se a entidade deixar de recolher contribuições e encargos, pois os salários são semelhantes, o material usado é o mesmo. Se não houver sonegação em massa de direitos trabalhistas, será economicamente desvantajoso ao poder público”, afirma.
Aliás, a prefeitura de Curitiba está atualmente em uma disputa trabalhista com uma entidade privada que era parceira na área de assistência social desde 1993: o Instituto Pró-Cidadania, que gerenciava os agentes comunitários de saúde do município. Uma emenda constitucional de 2006 determinou que todos os agentes sejam do quadro próprio. Só agora em 2017 isso está sendo regularizado, com a contratação de servidores aprovados em concurso. O IPCC e a prefeitura, porém, estão em disputa para ver quem é responsável pelo pagamento das verbas rescisórias.
Outro imbróglio entre a prefeitura de Curitiba e uma OS é o contrato com o Instituto Cidades Inteligentes (ICI, anteriormente chamado de Instituto Curitiba Informática), que desde 1997 administra o setor de tecnologia da informação do município. Em uma auditoria feita em 2015, o TC apontou dezenas de irregularidades no contrato assinado em 2011, e determinou que o poder público apresentasse um plano de ação para retomar a autonomia e independência tecnológica junto ao ICI. O ex-prefeito Gustavo Fruet (PDT) iniciou uma batalha judicial para tentar encerrar o contrato, mas Rafael Greca decidiu, em abril deste ano, suspender a ação judicial temporariamente.