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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Não existe, no Brasil e no mundo, qualquer comprovação científica da “cura gay”

Quarta, 20 de setembro de 2017
Da Tribuna da Internet
Ednei Freitas*
Não podem a Psicologia, a Psiquiatria e até certo ponto a própria Medicina tratarem de uma suposta doença cuja causa se desconhece inteiramente. É o caso da Homossexualidade, fato existente desde que a Humanidade se fundou. No caso da Medicina, eu disse que “até certo ponto”, porque hoje se dispõe, por exemplo, da cirurgia, que pode extirpar tumores cuja causa é desconhecida. Mas nas doenças ou não-doenças psiquiátricas, com comando da Psiquê, não há isso. Tratar o que não se sabe o fator causal, em Psicologia, Psiquiatria ou Psicanálise, é coisa de aventureiros inescrupulosos, que fatalmente trarão o mal ao psiquismo humano e sofrimento para o “paciente” que se pretende tratar, piorando tudo.

Já recebi em meu consultório homens e mulheres homossexuais, fiz até “terapia em casal” de parceiros homossexuais, todavia os problemas psíquicos apresentados são os mesmos de que se queixam os pacientes heterossexuais. Jamais fui procurado por homossexuais que desejassem se “converter” para a heterossexualidade, embora isto seja possível, mas não o foco de um tratamento especializado.

ESPECULAÇÃO – Apesar de quase um século de especulação psicanalítica e psicológica, não há nenhuma evidência substantiva para apoiar a sugestão de que a natureza da criação dos filhos ou que as primeiras experiências da infância desempenham qualquer papel na formação da orientação fundamental de uma pessoa heterossexual ou homossexual. Parece que a orientação sexual é de natureza biológica, determinada por uma complexa interação de fatores genéticos e do ambiente uterino precoce. A orientação sexual não é, portanto, uma escolha.

Atualmente, há um grande número de evidências que afirmam que ser homossexual ou bissexual é compatível com uma saúde mental e um ajustamento social completamente normais e saudáveis.

ASSUMIR O GÊNERO – Por isso, as principais organizações de saúde mental profissionais não incentivam as pessoas a tentar mudar a sua orientação sexual de homossexual para heterossexual. De fato, essas intervenções são eticamente suspeitas, porque elas podem ser prejudiciais para o bem-estar psicológico daqueles que passam por elas; observações clínicas e relatos pessoais indicam que muitas pessoas que tentam mudar a sua orientação sexual experimentam um considerável sofrimento psicológico.

Por estas razões, nenhuma organização profissional de saúde mental apóia esforços para mudar a orientação sexual e praticamente todas elas adotaram declarações de política da profissão e alertas ao público sobre os tratamentos que se propõem a mudar a orientação sexual.

PRECONCEITO – O Royal College of Psychiatrists expressou, ao lado da Associação Americana de Psiquiatria e da Associação Americana de Psicologia, que as posições defendidas por organizações como a National Association for Research & Therapy of Homosexuality (NARTH), dos Estados Unidos, não são apoiadas pela ciência e criam um ambiente no qual o preconceito e a discriminação podem florescer.
Atualmente, não há consenso científico sobre os fatores específicos que levam um indivíduo a tornar-se heterossexual, homossexual ou bissexual, incluindo possíveis efeitos biológicos, psicológicos ou sociais da orientação sexual dos pais. No entanto, as evidências disponíveis indicam que a grande maioria das lésbicas e adultos homossexuais foram criados por pais heterossexuais e que a grande maioria das crianças criadas por pais gays e lésbicas crescem como heterossexuais.

PADRÃO ÉTICO – A Associação Americana de Psiquiatria condena este tipo de terapia e afirma que “profissionais éticos evitam tentativas de mudar a orientação sexual dos indivíduos”.  O psicólogo Douglas Haldeman escreveu que esse tipo de procedimento se dá por meio de técnicas que incluem tratamentos aversivos, como “a aplicação de choques elétricos nas mãos e/ou genitais” e “medicamentos indutores de náuseas, administrados simultaneamente com a apresentação de estímulos homoeróticos”, assim como recondicionamento masturbatório, visualização, treinamento de habilidades sociais, terapia psicanalítica e intervenções espirituais, tais como “oração e grupo de apoio e pressão”.

A Associação Americana de Psicologia “incentiva os profissionais de saúde mental para evitar desvirtuar a eficácia dos esforços de mudança de orientação sexual promovendo ou prometendo mudar a orientação sexual ao prestarem assistência aos indivíduos angustiados por conta própria ou por outras pessoas quanto a sua orientação sexual e conclui que os benefícios relatados pelos participantes nos esforços de mudança de orientação sexual podem ser obtidos através de abordagens que não tentam mudar a orientação sexual”.

É PROIBIDO – No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) proibiu esse tipo de terapia em 22 de março de 1999, declarando em sua Resolução N° 001/99:
 
“Art. 2º – Os psicólogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas homoeróticas;

Art. 3º – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados;

Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.”

POSSIBILIDADE? – Em 2001, Robert Spitzer apresentou um trabalho controverso na reunião anual de 2001 da Associação Americana de Psiquiatria (AAP), em que argumentava ser possível que alguns indivíduos altamente motivados conseguissem mudar a sua orientação sexual de homossexual para heterossexual. Um artigo de 2001 do Washington Post indicou que Spitzer tinha 45 minutos de entrevistas telefônicas com 200 pessoas que afirmavam que as suas respectivas orientações sexuais mudaram de homossexual para heterossexual.

Spitzer afirmou que a sua pesquisa “mostrou que algumas pessoas podem mudar de homossexual para heterossexual e nós devemos reconhecer isso.” Considerando o quão difícil foi encontrar os 100 participantes, e que esses eram considerados os melhores casos de terapia de conversão, Spitzer concluiu que embora a mudança pudesse ocorrer, ela é provavelmente muito rara.

SEM COMPROVAÇÃO – A AAP emitiu um comunicado oficial desmentindo a pesquisa de Spitzer, salientando que o trabalho não havia sido revisado e afirmando que “não há nenhuma evidência científica publicada em apoio a eficácia da terapia reparativa como um tratamento para mudar de orientação sexual.” A pesquisa de Spitzer foi criticada por seus métodos de amostragem e os critérios usados para definir o sucesso da terapia.[55]

Em 2012, no entanto, Spitzer se retratou publicamente pela conclusão de sua pesquisa e afirmou: “Eu acredito que devo desculpas à comunidade gay por meu estudo trazer alegações não comprovadas da eficácia da terapia reparadora.”

*Ednei Freitas é médico, psiquiatra, psicanalista.