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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Tribunal de Contas suspende PPP de hospital. Conconrência foi 'roupagem jurídica criativa'

Sexta, 15 de setembro de 2017
Do site Ataque aos Cofres Públicos

Ministério Público de Contas chamou a concorrência pública de “roupagem jurídica criativa”.

Fonte: Tribunal de Contas do Estado de SP

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) suspendeu a concorrência pública 02/2017, da Prefeitura de Cubatão, que visava transferir o Hospital Municipal a uma entidade, por meio de uma espécie de Parceria Público Privada (PPP).
Houve uma reviravolta no processo, iniciado no começo de agosto, por um consultor de PPPs que questionou vários itens do edital junto ao Tribunal. No fim do mês passado, o prefeito Ademário Oliveira (PSDB) foi pessoalmente conversar com o presidente do TCE e conseguiu a liberação dos trâmites. Os envelopes com as propostas das empresas interessadas seriam abertos no dia 19, próxima terça.

No entanto, na última segunda-feira (12), tudo mudou graças a uma análise mais atenta dos procuradores do Ministério Público de Contas (MPC).Oficialmente, a modalidade contratual chama-se ‘Concessão de uso de bens públicos imóveis’. O problema é que o MPC percebeu que essa alternativa era apenas uma roupagem jurídica para escapar da Lei 8.987/95, que regulamenta os contratos de concessão de serviços públicos.

Ou seria um atalho para evitar um contrato de gestão convencional, por exemplo por meio das famigeradas Organizações Sociais, que tantos prejuízos já trouxeram para a cidade?

O fato é que o MPC analisou mais detalhadamente todos os pontos do edital e concluiu que há diversas irregularidades, requerendo, assim, a suspensão do processo.

Primeiramente, o MPC afirmou que o edital permite a transferência da totalidade dos serviços de saúde municipal, o que afastaria a característica de complementariedade, configurando portanto, uma afronta aos artigos 196 e 199, § 1º, da Constituição Federal.

Em segundo lugar, o órgão explica que a iniciativa vai contra diretrizes do Tribunal de Contas da União para contratos de gestão, por conta da ausência de definição de formas de acompanhamento e avaliação dos serviços de saúde pública.

Na sessão do TCE-SP em que o edital foi suspenso, o promotor teceu várias críticas à Prefeitura de Cubatão, frisando a referida modalidade contratual como uma “via inadequada” para colocar o Hospital em funcionamento.

Explicou que Prefeitura foi “criativa ao inventar uma roupagem jurídica” para tentar mostrar que a concorrência pública é de fato uma concessão de direito real de uso de bens e imóveis ao contrato de gestão.

Veja abaixo alguns trechos da sustentação oral do promotor:



“(…)O edital chamou a atenção do MP pelos aspectos curiosos em que foi montada a licitação pela prefeitura. O objeto é tratado como concessão onerosa de uso de bens públicos imóveis para a implantação de um complexo hospitalar. O instituto da concessão do uso é pensado para bens públicos sem finalidade específica. Existe para exploração daquele bem público por um particular. Um exemplo são os boxes de mercados municipais, em que o particular pode realizar a atividade comercial que escolher. Mas aqui já há uma finalidade pública, que é um hospital. (….)

Apesar de se declarar que é uma concessão de uso de um bem imóvel, quando lemos o edital, fala-se também em conceder os bens e equipamentos moveis, que são justamente os bens móveis para funcionamento do hospital. (…)

E nas obrigações da concessionária para concessão há itens ligados a serviços. Ou seja, ela (a concessionária) deverá fazer a gestão do hospital. Lendo nós descobrimos que a onerosidade do contrato é pelo poder concedente (a Prefeitura), e não pela concessionária (a instituição a ser escolhida), já que o município deverá repassar por mês R$ 2 milhões à entidade. Uma situação muito peculiar. O anexo 2 do edital, que fala do Plano Operativo, prevê que a metodologia, os parâmetros, os procedimentos e a peridiocidade dos serviços serão estabelecidos na contratualização. Então, se deixa totalmente em aberto quais que serão os serviços prestados pela concessionária do uso do bem.

A Prefeitura de Cubatão criou recentemente a lei 3.852, de julho, que autorizaria essa modalidade, seguindo um modelo de contrato anexo à lei. Quando lemos essa minuta de contrato percebemos que é justamente uma concessão de um serviço do bem público. Um exemplo que tem lá é que a extinção da concessão vai ser pela caducidade, quando não prestar os serviços que se exige. Ou seja, a administração fala que é concessão de uso de bem, mas na verdade está querendo licitar um serviço. Então deveria ser licitado pela lei 8.987/96 ou por um contrato de gestão. A administração tenta criar uma roupagem jurídica falando que o principal seria o serviço e o anexo, o imóvel. Muito difícil de entender a criatividade do gestor. E isso vai durar por 15 anos”.



Nem PPP, nem concessão, nem OSs! Saúde é dever do poder público

Quem lembra de uma ação civil pública em que o Ministério Público Estadual pleiteou a intervenção estadual na gestão do Hospital Municipal de Cubatão?

Pois bem! Na época (agosto de 2016), os promotores argumentavam que essa intervenção seria necessária para evitar o “fechamento de portas e resguardar a continuidade na prestação do serviço de saúde”. O MP denunciou o caos instalado no equipamento após anos de terceirização milionária e desmando das Organizações Sociais (OSs).

A ação foi julgada procedente em primeira instância, mas o Estado lavou as mãos e recorreu no Tribunal de Justiça. O que aconteceu? O hospital sucumbiu. A população ficou desassistida e até hoje os trabalhadores terceirizados lutam para receber os pagamentos que a entidade deve.

O tucano Ademário Oliveira conquistou a Prefeitura porque disse em campanha que iria colocar o hospital em pleno funcionamento. O que ele fez pouco tempo depois de assumir? Fechou as portas de vez. Agora, vem com uma solução capenga, que acaba de ser desqualificada pelo Tribunal de Contas: a tal PPP, nome fantasia que a Prefeitura usa para designar ‘Concessão de uso de bens públicos imóveis’, modalidade contratual incompatível com a área da saúde.

Há algum tempo estamos denunciando que essa alternativa é boa somente para a empresa que conquistar o contrato.

Afinal, o que está em jogo com a PPP? Basta pensar um pouco para entender que esse tipo de privatização terá um custo alto demais para os cofres municipais e um retorno social insuficiente aos cubatenses.

A administração municipal estava sendo quase uma mãe para a futura gestora do equipamento. Tanto é assim que seis instituições se interessaram em entrar no hospital para obter ganho econômico tido como certo.

A equação, boa apenas para a empresa, funcionava assim: 40% dos leitos hospitalares ficariam nas mãos da futura administradora para que ela lucre com atendimentos via convênios particulares. A empresa também poderia lucrar com os serviços de estacionamento, lanchonete e outros. Isso por 15 anos! Para isso, deveria fazer um aporte de R$ 6 milhões para adequações sanitárias e instalação de mobiliários no Hospital e mais R$ 1,5 milhão para adaptar o prédio de um antigo teatro como anexo do hospital.

Por sua vez, a Prefeitura investiria R$ 48 milhões ao longo de dois anos para manter aos munícipes o acesso público de apenas a 60% dos leitos. Para administrar o hospital, a empresa contemplada com a PPP também contará com recursos do Ministério da Saúde no custeio desses mesmos 60% de leitos destinados aos atendimentos pelo SUS.

Ou seja, a conta é simples: a empresa entraria com R$ 7,5 milhões e ficaria com 40% dos leitos (100), mais estacionamento, mais lanchonete e outros espaços para explorar economicamente. Enquanto isso, a Prefeitura bancaria R$ 2 milhões por mês (R$ 48 milhões no total), fora a quantia que o Ministério da Saúde já vai mandar para que a tal empresa administre os 60% de leitos (150) destinados às pessoas sem plano de saúde.

A maior parte da conta seria paga pela população, que banca o SUS por meio dos impostos que paga, e receberia um hospital pela metade.