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(Millôr Fernandes)

domingo, 14 de janeiro de 2018

PSOL dá um salto de gigante

Domingo, 14 de janeiro de 2018
Por Fernando Tolentino
A melhor notícia dos últimos dias na política veio do PSOL. Embora anunciando que terão a sua própria candidatura à Presidência da República, defendem o direito de Lula a que também concorra ao cargo pelo PT.

A decisão põe o PSOL na mesma linha de combate do PCdoB e do PDT, que não conseguiu ainda atrair para ela o seu provável candidato a presidente Ciro Gomes.

Isso tem um significado muito especial. O PSOL faz também a leitura correta da realidade e rompe o que parecia uma vocação para uma política de gueto, vislumbrando na injustiça contra Lula a possibilidade de levar alguma vantagem eleitoral.

É perfeitamente compreensível que o PSOL lance o seu próprio nome na disputa para presidente da República. Vive a circunstância que levou o PCdoB a fazê-lo, empurrado pelas alterações recentes na legislação eleitoral. Mas há que se entender a lógica do PSOL de ter a campanha eleitoral como o momento mais oportuno para levar à opinião pública, em sua candidatura, as propostas que o fazem se propor como partido político. A nota da direção do PSOL deixa claro o que ela pensa disso: “Uma candidatura radical, popular e que aponte a necessidade de uma alternativa independente dos trabalhadores e trabalhadoras, sem-teto, sem-terra, da juventude e dos estudantes, das mulheres, negros e negras, da população LGBT e todos os oprimidos, sem se furtar ao debate sobre as diferenças de projeto que existem no campo das esquerdas.”

Enfim, acredita que há, nisso, um diferencial com relação ao Partido dos Trabalhadores e outros partidos de esquerda e quer se aproveitar da campanha para tentar provar isso. É um direito insofismável do Partido. E nisso reside parte da justificativa para que se lance na defesa de que Lula esteja na disputa. Se o PT não tiver um candidato forte, qual o contraditório para a sua proposta? Como tentar provar que é diferente?

Há mais do que isso. O PSOL evidencia a percepção de que a tentativa de retirar-se Lula da disputa não é um fato isolado.

Se é possível condenar alguém sem que haja provas, pode-se condenar qualquer um. Basta ser alguém que incomode, que ponha em risco o projeto de classe que está no poder. Com os números apresentados pelos principais institutos de pesquisa, Lula representa hoje a principal evidência desse risco. Vem daí a “necessidade” de eliminá-lo. 

Faltando somente alguns meses para que a campanha eleitoral chegue efetivamente às ruas, os setores que chegaram ao poder com o afastamento arbitrário e injustificável de Dilma Rousseff não conseguem apresentar um só nome que desperte qualquer interesse na opinião pública. A ponto de parte desse segmento considerar a possiblidade de assumir uma candidatura de alto risco, de extrema direita e que, para efeito eleitoral, vomita um discurso de rejeição à política como um todo. Enfim, uma reedição do Fernando Collor de 1989, que foi condenado por seus próprios padrinhos ao longo do mandato que lhe concederam. 

Não tendo quem lançar na disputa, os beneficiários do golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2015 tratam de fazer derreter o nome da extrema direita, que chegou a alcançar certa notoriedade, e eliminar o nome de Lula. Alcançaria o sonho de ir às urnas sem uma concorrência real, fazendo um arremedo de eleição, em que só nomes do seu grupo teriam condições concretas de vencer.

Não há dúvidas para o PSOL. Há uma verdadeira ansiedade para condenar Lula, ainda que não haja como justificar isso. Veja que JUSTIFICAR inclui o radical JUS, de justiça. Tudo indica que se pretende confirmar, no dia 24 de janeiro, uma condenação pela propriedade por Lula de um imóvel, mesmo não havendo um só documento que a comprove. Mais grave, com a existência de documentos que demonstram o contrário: o imóvel integra o patrimônio da OAS e foi, por ela, colocado como garantia em negociação com a Caixa Econômica Federal. Às vésperas do julgamento, mais um obstáculo que seria logicamente intransponível para quem quer a condenação. Órgão do próprio Judiciário (2ª. Vara de Execuções e Títulos no Distrito Federal) reconhece formalmente que o imóvel não é de Lula, mas da OAS, ao incluí-lo entre os imóveis da empresa a serem penhorados.

O PSOL abriu os olhos e percebeu que Lula é apenas o nome da vez. O obstáculo do momento. Surja outro e será submetido ao mesmo tratamento.

Percebe finalmente que, embora seja fundamental, a tentativa de afastar Lula da disputa é só uma parte do problema.

Está em jogo o próprio Estado de Direito, a democracia. E são virtuais vítimas da sua destruição todos os que fazem o jogo democrático da luta pela manutenção dos seus direitos e pela conquista de outros tantos. Entre esses, estão organizações populares, assim como militantes do PT, mas também do PSOL e de outros partidos de esquerda.
 
Os golpistas já deixaram claro que não estão dispostos a aceitar limites para alterar a ordem constitucional e o direito de a sociedade se impor diante do poder econômico. A luta deles é para impor uma derrota que veem como definitiva para os setores populares e não querem respeitar o que se lhes coloque na frente como obstáculo ou dificuldade.


Fernando Tolentino