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(Millôr Fernandes)

sábado, 24 de março de 2018

Foi um erro do TRF-4 que levou Lula a impetrar habeas corpus no STJ e no STF

Sábado, 24 de março de 2018
Da Tribuna da Internet
Jorge Béja
Este habeas corpus (preventivo) do Lula, que teve o julgamento iniciado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal nesta quinta-feira (22), foi suspenso no mesmo dia e ficou para ser concluído no próximo dia 4 de abril, está dando o que falar por várias razões. Vamos às duas principais delas:  1) a que suspendeu o julgamento e, por isso, o STF deu a Lula a garantia (salvo-conduto) de não ser preso até o dia 4 de abril; 2) a causa, a razão, o motivo que levou Lula a impetrar o HC.
TRF-4 errou ao usurpar a competência do juiz Moro
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Quanto à suspensão e a expedição de salvo-conduto foi um erro, para não dizer uma camaradagem feita a Lula. Teve leitor que aplaudiu a decisão. Argumentou que “suspensa a sessão, não há motivos para se negar a liminar requerida”. Não, não é assim. Suspensa a sessão, seja qual for o motivo, prevalece a milenar cláusula que herdamos do Direito Romano: “Rebus Sic Stantibus”. As coisas permanecem como estão. Não se modificam. Restam irretocáveis. É o princípio que preside a Teoria da Imprevisão.

NA MESMA SITUAÇÃO – E permanecendo as coisas como estavam (Rebus Sic Stantibus), Lula deveria continuar na mesma situação alegada, a de “correr iminente risco de sofrer prisão injusta”. Jamais poderia ganhar salvo-conduto “improvisado e provisório”.
Se equipe médica, quando entra no centro cirúrgico para realizar cirurgia complexa, que se sabe demorada, sujeita a intercorrências e sem hora para terminar, não deve e não pode assumir compromissos para depois do ato cirúrgico a ponto de interromper a cirurgia, também juízes que se reúnem para apreciar e decidir direito alheio estão na mesma obrigação dos médicos: devem iniciar a sessão sem a preocupação de compromissos pessoais que possam interrompê-la, até que a jurisdição seja prestada por inteiro e por completo e na mesmíssima sessão o caso seja decidido.
MOTIVOS FÚTEIS – Foi um erro grave do STF. Os motivos alegados para a suspensão e adiamento da sessão afrontam a maioria dos 220 milhões de brasileiros que vivem na miséria, sem emprego, sem teto e sem o que comer: cansaço e viagem aérea marcada para às 7 da noite com “check-in” já feito! Que chique!
Erro pior foi a solução arranjada. Bastou o reverenciado advogado de Lula — o “sempre presidente da OAB”, como foi saudado o dr. Batochio pela ministra presidente Cármen Lúcia — voltar à tribuna para pedir, e a maioria dos ministros atendeu à solicitação e concedeu o tal “salvo-conduto” provisório até o próximo 4 de abril.
Sabemos que o dr. Batochio é advogado de nomeada, de grande cultura. Advogado de peso. E de grande influência e prestigio também. Com desenvoltura elogiada pelos ministros, até falou em francês na tribuna, idioma que o ministro Fachin fez questão de considerar de “pronúncia perfeita”. São detalhes, momentos e situações sutis que retratam e contam a história daquela sessão do STF, que começou e não terminou.
ERRO DO TRF-4 – Mas o pior dos erros não partiu do STF, mas da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF-4). Erro inocente. Erro na boa-fé. Erro por excesso de zelo. Foi o seguinte: no corpo do Acórdão (decisão) que julgou o recurso de apelação de Lula, contra as 238 páginas da Sentença do juiz Sérgio Moro que condenou o ex-presidente, os desembargadores, desnecessariamente, fizeram questão de registrar que, uma vez terminado o julgamento, incluindo os Embargos de Declaração, que fosse cumprido o que determina a Súmula 122 daquele tribunal (o TRF4) que diz: “Encerrada a instrução criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial e extraordinário”.
E não foi só no bojo do Acórdão que constou o comando da referida Súmula. No item nº 45 da Ementa (extrato, resumo, síntese da decisão ou Acórdão) os desembargadores também registraram o seguinte: “45 – Em observância ao quanto decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 126292/SP, tão logo decorridos os prazos para interposição de recursos dotados de efeitos suspensivos ou julgados estes, deverá ser oficiado à origem para dar início à execução das penas”.
PRENDA-SE LULA – Em outras palavras, a 8a Turma do TRF-4 quis dizer: julgados e desprovidos todos os recursos, prenda-se Lula. Foi este registro no bojo do Acórdão e no corpo da Ementa que justificou a impetração do Habeas Corpus em favor de Lula. Caso não constasse, não haveria justa causa para a impetração. E constou superabundantemente, desnecessariamente.
Além disso, o TRF-4, ao expedir este prévio comando de prisão, subtraiu este poder que só ao juiz da execução pertence: o de mandar prender ou não.  É o que se tem noticiado por este Brasil a fora, em que juízes de primeira instância têm ordenado a imediata prisão de réus condenados pela 2ª instância e que aguardavam em liberdade o julgamento de seus recursos para o STJ e STF.
Já outros juízes não mandam prender quem se acha nesta situação. Além disso, aquela decisão do STF tomada por 6 a 5, não manda para a cadeia os que foram condenados em 2ª instância. A decisão do STF diz apenas que o cumprimento da pena após 2ª instância não compromete o princípio constitucional da inocência, da ausência de culpabilidade, que a Carta enuncia no artigo 5º, item LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória“.
Ou seja, o juiz da execução é quem decidirá, cada caso, cada réu e suas peculiaridades.
DE BOA FÉ – Foi este erro, inocente e de boa-fé, que o TRF-4 cometeu e que possibilitou a Lula impetrar Habeas Corpus (preventivo). Caso o Acórdão e a Ementa do julgamento do recurso de Lula fossem silentes a respeito, caberia, então, ao Juiz Sérgio Moro, após encerrado o julgamento pela 8a. Turma do TRF-4, expedir ou não mandado de prisão contra Lula.
E se Moro decidisse ordenar a prisão do ex-presidente, nenhuma coação ilegal Moro estaria cometendo contra Lula que justificasse a impetração de Habeas Corpus. Isto porque a possibilidade de prender réu condenado em 2a. instância vem do plenário do STF. Vem da jurisprudência da Suprema Corte, portanto. Logo, não haveria o alegado “constrangimento ilegal”, pelo menos até que o próprio STF derrube o que ficou decido no HC nº 126292/SP.
E a rigor, ainda que em sede imprópria, o registro que o TRF-4 fez constar no Acórdão e na Ementa do julgamento do recurso de Lula também não constitui mínimo “constrangimento ilegal”, a justificar Habeas-Corpus preventivo, porque os desembargadores da 8a. Turma seguiram o comando jurisprudencial do STF. O erro foi a precipitação e a usurpação de um poder que somente ao Juiz Sérgio Moro competia decidir: se prende ou se não prende, após confirmação de sua sentença condenatória pela 2a. instância.