Sexta, 17 de abril de 2015
Ações judiciais em andamento questionam demora da Anvisa para concluir avaliação toxicológica do agrotóxico usado em larga escala nas lavouras do país
Do MPF
Em um documento enviado à Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), o Ministério Público Federal no DF (MPF/DF)
recomenda que seja concluída com urgência a reavaliação toxicológica do
glifosato e que a agência determine o banimento do herbicida no mercado
nacional. Atualmente, o produto é o mais usado nas lavouras do Brasil,
principalmente nas que adotam o modelo de monocultura. A medida é defendida
pelo MPF como forma de precaução e se baseia em estudos como o desenvolvido
pela International Agency for Research on Câncer (IARC), ligada à Organização
Mundial de Saúde (OMS), segundo a qual o ingrediente pode ser cancerígeno.
Além da recomendação, o procurador da República
Anselmo Henrique Cordeiro Lopes apresentou uma petição à Justiça Federal em que
reforça o pedido de liminar para proibir a concessão de novos registros de
agrotóxicos que contenham oito ingredientes ativos – entre eles o glifosato -
condenados por organismos internacionais e pela própria Anvisa. A necessidade
de providências em relação ao controle e proibição de venda dos agrotóxicos é
objeto de três ações judiciais propostas em abril de 2014 pelo MPF/DF.
As novas providências do MPF em relação ao assunto
são decorrentes de fatos recentes que, na avaliação do MPF, reforçam os perigos
tanto do glifosato quanto dos demais ingredientes questionados nas ações
judiciais. Na petição enviada à 7ª Vara Federal, o procurador explica que, em
dezembro de 2014, após o oferecimento das ações, a própria Anvisa determinou o
banimento de dois ingredientes ativos que são objeto das ações judiciais : o
forato e a parationa metílica.
Em relação aos outros seis, cinco deles (lactofem,
carbofurano, abamectina, tiram e paraquate) já têm parecer técnico da agência
no mesmo sentido, ou seja, a avaliação é que eles também tenham a
comercialização proibida no país. As informações constam de notas técnicas
enviadas pela Agência ao MPF. “Em relação a todos eles, os documentos técnicos
da Anvisa apontam para a necessidade do banimento de todos esses ingredientes
ativos, em razão de suas potenciais características carcinogênicas,
mutagênicas, teratogênica e/ou disrupturas endócrinas”, detalha o documento.
A petição também faz referência ao fato de a OMS
ter reconhecido, em março de 2015, estudos consolidados por 17 especialistas de
11 países, que avaliaram a característica carcinogênica de alguns ingredientes,
entre os quais o glifosato. No documento, o MPF frisa que, entre outras
conclusões, os especialistas “afirmaram, com segurança, que o glifosato produz,
muito provavelmente, efeitos carcinogênicos em seres humanos”. O estudo
chancelado pela IARC serviu de base para um alerta divulgado no mês seguinte
pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca). O documento oficial chama atenção
para os riscos que a exposição ao glifosato representa para a saúde dos
brasileiros.
Mortes comprovadas - A confirmação da
existência de óbitos provocados pelos componentes dos produtos usados na
agricultura brasileira também é mencionada na petição enviada à Justiça. O
procurador cita documentos dos Centros de Informações e Assistência
Toxicológica do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul que atestam o registro
de 11, 41 e 36 mortes, respectivamente, entre os anos de 2009 e 2013. Em todos
os casos, os centros informam que os óbitos decorreram “da exposição aguda aos
ingredientes dos agrotóxicos”.
O documento do MPF alerta que o número de vítimas
é, certamente, bem maior do que o registrado pelos órgãos públicos, pela
própria caracteristica da contaminação. “Os danos gerados pelas características
carcinogênicas, mutagênicas, teratogênicas e/ou endócrinas dos agrotóxicos são,
em geral, crônicos e derivados, não necessariamente agudos, não sendo possível,
portanto, avaliá-los facilmente num exame post mortem”, afirma o MPF. Em outro
trecho da petição, o procurador lembra que tanto a OMS quanto o Inca estimam
que nos próximos cinco anos o câncer será a principal causa de mortes no
Brasil, fato que se deve, em grande parte, ao aumento no uso de agrotóxicos.
Pedidos de informação - Além de reforçar o pedido
de concessão de liminar, o procurador Anselmo Lopes determinou a adoção de
novas providências referentes ao caso, como o envio de pedidos de informações a
órgãos públicos. Um deles é endereçado ao Ministério da Agricultura de Pecuária
(Mapa). O órgão tem 15 dias para informar os procedimentos adotados no sentido
de cancelar os registros de agrotóxicos de apresentam os ingredientes ativos
forato e parationa metílica, banidos pela Anvisa no fim de 2014.
Outro pedido é para que as secretarias estaduais de
meio ambiente e de saúde, incluindo do Distrito Federal, e os departamentos de
água e esgoto de todas as capitais e do município de Ribeirão Preto (SP)
enviem, no prazo máximo de 90 dias, relatórios de análise de contaminação da
água por agrotóxicos.
Também consta da lista de providências que estão
sendo adotadas pelo MPF, a apresentação de um novo pedido aos 34 Centros de
Informações e Assistência Toxicológica espalhados pelo país. Os órgãos deverão
informar eventuais registros de intoxicações ocorridas no ano de 2014,
resultantes da exposição a agrotóxicos que contenham os ingredientes ativos
mencionados nas ações judiciais. Neste caso, o procurador solicita, ainda, que
sejam mencionados os casos de óbitos, inclusive, separando – caso seja possível
– os que foram decorrentes da exposição aguda dos que decorreram da exposição
crônica ao produto.
Novo inquérito - Outra providência adotada
pelo MPF em relação ao possível banimento do glifosato do mercado brasileiro
foi a instauração de um novo inquérito civil. Neste caso, o objetivo das
apurações será verificar se há necessidade de cancelamento de liberações para venda
de sementes transgênicas. Os chamados organismos geneticamente modificados
(OGMs) têm autorizações da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio)
e parte deles é tolerante ao herbicida glifosato. Como forma de viabilizar a
investigação, o MPF deve solicitar, nos próximos dias, à CTNBio cópias de todos
os procedimentos de liberação comercial de OGMs que sejam tolerantes ao
herbicida glifosato.
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