quarta-feira, 2 de março de 2011

Wikyleaks alimenta briga

Quarta, 2 de março de 2011
 Por Ivan de Carvalho
O indiscreto site Wikyleaks, que está assombrando a diplomacia internacional, líderes políticos, o sistema bancário mundial e até Estados, isso por enquanto, está entre as 241 indicações ao Prêmio Nobel da Paz.
As revelações do Wikyleaks estão provocando tantas reações dos que querem abafá-las que o fenômeno dá mais força à constatação de que “toda civilização é uma conspiração”, uma das teses mais interessantes entre as que podem ser encontradas no livro de fundação do chamado “realismo fantástico”, O Despertar dos Mágicos.
A inclusão do site Wikyleaks entre as indicações para o Nobel da Paz não significa que vá ser o premiado. Até pelo contrário, haverá uma torcida contrária tão grande entre os poderosos, além de uma concorrência forte entre as outras 240 indicações, que é muito improvável a escolha do Wikyleaks.
Aliás, não deixa de ser curioso, embora triste e preocupante, o fato de que, apesar de tantas indicações ao Nobel da Paz – às 241 deste ano, o recorde, precederam as mais de 230 do ano passado, que haviam estabelecido o recorde agora batido – a paz deste mundo esteja aparentemente cada vez mais difícil.
            Também é interessante que exatamente quando a comissão responsável pelos prêmios Nobel deixa vazar a informação de que o Wikyleaks está entre as indicações, surjam informações capturadas e divulgadas pelo “polêmico” site sobre ataques feitos em 2006 pelo então presidente nacional do PMDB e hoje vice-presidente da República, Michel Temer, ao então presidente Lula.
            Ao cônsul-geral dos Estados Unidos em São Paulo, Christopher McMullen, em 9 de janeiro de 2006, Temer disse que o desempenho do presidente Lula, principal liderança do PT, era decepcionante. Telegrama do cônsul McMullen, obtido pelo Wikyleaks, relatava partes da conversa, inclusive a avaliação do atual vice-presidente da República eleito na chapa da presidente Dilma Rousseff, de que Lula tinha uma “visão estreita”, com “excessivo foco nos programas de seguridade social que não promovem o crescimento ou desenvolvimento econômico”.
            Temer, na conversa, teria manifestado, segundo McMullen, a desilusão popular causada pelo “roubo de dinheiro público” – provavelmente uma referência ao escândalo do Mensalão – e avaliado que isso abria a perspectiva de o PMDB ter candidato próprio a presidente da República em 2006. Dependeria das pesquisas eleitorais. Citou Anthony Garotinho, Germano Rigotto e Nelson Jobim como possíveis candidatos do PMDB. Temer avaliou também que o dinheiro público supostamente surrupiado não tinha o propósito de resultar em ganho pessoal de petistas, mas de aumentar o poder político do partido.
            Mas o PMDB não teve candidato nenhum, não se definiu formalmente, dividiu-se – uma parte apoiou Lula, o “PMDB do Senado”, outra apoiou Geraldo Alckmin, o “PMDB da Câmara”. Só para o segundo turno o PMDB formalizou seu apoio à reeleição de Lula.
            Bem, cinco anos após aquela conversa de Temer com o cônsul-geral dos Estados Unidos em São Paulo, o Wikyleaks alimenta a chama e acrescenta vários graus ao clima de fornalha que já existe entre o PT e seu governo e o PMDB.
            Talvez isso não seja a melhor maneira de promover a paz, razão da indicação para o Nobel. Mas talvez seja. Afinal, a conspiração do silêncio sofreu mais um golpe.
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Ester artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.