Quinta, 28 de abril de 2011
Da Radioagência NP
A delegada Daniela Kades, responsável pelo
inquérito policial que investiga o caso de tortura nas Lojas Americanas,
em Campo Grande (MS), declarou que ainda é cedo para apontar o autor
das agressões. Acusado de furtar um ovo de chocolate comprado em outro
estabelecimento, o vigilante Márcio Antonio de Souza foi atacado por um
agente de segurança, no último sábado (23). Os familiares da vítima
consideram que as evidências são suficientes para incriminar o agressor
Décio Garcia de Souza.
Somente depois de três dias Décio registrou um Boletim de Ocorrência
no qual relata um furto ocorrido na loja onde presta serviços. Porém, a
Nota Fiscal em poder da família da vítima comprova que ovo não era
furtado. Gilson Fernandes, irmão de Márcio, garante que o funcionário da
rede varejista teria confiscado o produto depois de encerrar o
espancamento.
“Ele teve todo o sábado (23 de abril) para acionar a autoridade
policial. Ou ainda quando meu irmão estava no interior da loja. Ele não o
fez. Ele poderia, logo em seguida, ter feito o Boletim de Ocorrência e
não o fez. Poderia ter ido ao IML, como nós fomos, e não o fez também. E
já na segunda-feira (25), depois de ver as reportagens, esse moço diz
que foi agredido e que vai então fazer o exame de corpo de delito. Ou
seja, três dias depois. Eu acho cômodo demais. Isso revolta a minha
família.”
A delegada solicitará as imagens gravadas pelas câmeras de segurança
da loja. Nesta terça-feira, Márcio Antonio prestou depoimento,
revelando detalhes que confirmam as acusações feitas pelo irmão. Gilson
diz ter convicção de que as agressões tiveram motivações racistas.
“O segurança dizia que ele era bandido, tinha cara de bandido e tinha
que apanhar porque era vagabundo. Quando começaram as agressões, ele
chegou a dizer: ‘você vai apanhar agora negão’. Eu tenho certeza que a
principal motivação foi por causa da cor do meu irmão. Infelizmente,
neste país, se você é preto, você automaticamente é suspeito.”
Racismo e tortura
No início do ano, a Polícia de São Paulo indiciou seis seguranças da
rede de supermercados Carrefour pelo crime de tortura motivada por
preconceito racial. Eles agrediram o vigilante Januário Alves de
Santana, em agosto de 2009, apontado como suspeito de roubar o próprio
carro no estacionamento de uma das lojas, na cidade de Osasco (SP). O
advogado Dojival Vieira, que atuou no caso, vê muitas semelhanças com o
ocorrido nas Lojas Americanas e pede o acompanhamento do Ministério
Público para evitar um desvio no foco das investigações.
“Essas situações violam garantias constitucionais asseguradas, além
do Código de Defesa do Consumidor, obviamente. Está evidente a violação
da Lei 9455/97, que é a Lei da Tortura, considerada um crime hediondo,
com penas que chegam a até oito anos de reclusão. Então, não se pode
tratar um caso desses como algo menor, como por exemplo, agressão ou
lesão corporal dolosa.”
A referida Lei caracteriza como tortura o ato de “constranger alguém
com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico
ou mental”. Entre as motivações, está o objetivo de “obter informação,
declaração ou confissão da vítima” ou “em razão de discriminação racial
ou religiosa”. Acusado de furto e sem direito à defesa, Márcio Antonio
sofreu fraturas no nariz, ferimentos no olho, além de lesões nos lábios e
no maxilar, conforme laudo do Instituto Médico Legal (IML).
No mês de janeiro, um garoto de dez anos foi vítima de violência e
maus tratos em uma loja do supermercado Extra, na cidade de São Paulo. O
garoto era suspeito de furtar os biscoitos e doces que comprou. Além de
receber ofensas raciais, foi ameaçado de agressão por um dos
seguranças. Segundo depoimento do menor, outros dois adolescentes
passaram pela mesma humilhação em uma salinha nos fundos da loja.
De São Paulo, da Radioagência NP, Jorge Américo.
28/04/11